terça-feira, 20 de outubro de 2015

II Samuel 1 a 24

II Samuel 1

A Notícia da Morte de Saul

Nós vemos no primeiro capitulo de 2 Samuel, que Davi havia retornado da batalha que empreendera contra os amalequitas para recuperar as esposas, filhos e bens, dele e dos seiscentos homens que o acompanhavam, e no terceiro dia em que se encontrava em Ziclague, veio ao seu encontro um jovem amalequita trazendo notícias da morte de Saul e de Jônatas.
No relato de I Sm 31.3-6 no relato sobre a morte de Saul, o escritor dá como fato exato e certo que ele havia sido ferido gravemente por flechas, que lhe foram lançadas, e que diante da morte iminente nas mãos dos filisteus, se lançou sobre a sua espada, e que o seu escudeiro fez o mesmo, mas depois de ter se certificado que Saul já havia morrido.
Assim, tudo indica que era falso o relato que o amalequita fizera sobre os detalhes da forma como Saul fora morto por ele, pois disse a Davi que Saul estava apoiado sobre a sua lança (v. 6), e que lhe pedira que se lançasse sobre ele, porque a penetração da lança não foi capaz de produzir um golpe mortal (v.9).
É até possível que o escudeiro de Saul tivesse feito uma avaliação incorreta sobre o momento exato da sua morte, e que tenha também se suicidado enquanto Saul ainda estivesse com vida e solicitado ao amalequita que o matasse.
É também possível, que na hora de relatar o fato a Davi, que tenha se equivocado ou alterado propositalmente com qual instrumento Saul estava atravessado, pois em vez de dizer espada hereb, ele disse lança, hanit.
Ao que tudo indica o amalequita estivera de fato com Saul nos primeiros momentos da sua morte, pois pegou sua coroa e bracelete e os trouxe à presença de Davi, como prova de que estava lhe dizendo a verdade.
Em todo caso, se o relato do amalequita era falso ou verdadeiro, não é relevante, pois o que há de importante para se aprender neste capítulo é o modo como Davi recebeu as notícias, e como agiu em seguida, e que nem sempre o oportunismo interesseiro será bem sucedido, mesmo neste mundo.
O amalequita pensava que seria regiamente recompensado com a notícia da morte de Saul, e mais ainda, pelo fato de ter dito que havia contribuído para que fosse morto, pois sabia o quanto ele vinha perseguindo Davi, a ponto deste ter que se refugiar numa terra estranha.
No seu modo de julgar as coisas, segundo o seu padrão de valores, as notícias relativas à ruína dos inimigos é um motivo de grande alegria, e especialmente no caso de Davi, isto significava liberdade, cessação de ser perseguido, e caminho livre para assumir o trono de Israel.
Considerando tudo isto, o amalequita pensou ser alvo do seu favor e ganhar um lugar de destaque no seu reino, e escapar, além de tudo, do juízo de extermínio total do seu povo, que havia sido ordenado por Deus, o qual fora desobedecido frontalmente pelo próprio Saul, que não por ironia do destino, mas por obra da providência, caso seja fidedigno o relato do amalequita, veio a ser morto pelas mãos de um daqueles que ele deixara viver, em desobediência à ordem divina.
Aqueles que se alegram com a queda de um inimigo costumam medir os outros por si mesmos, pensando que terão a mesma alegria deles. E foi este o erro do amalequita que veio ter com Davi, porque em vez de se alegrar, ele se abateu profundamente com aquela notícia, não somente por Jônatas, como pelo próprio Saul, e por todos os israelitas que haviam caído no campo de batalha.
Aquela não era uma notícia para ser festejada, mas para ser lamentada, e foi por causa disto que Davi e todos os israelitas, que estavam com ele rasgaram as suas vestes, em sinal de luto e tristeza, diante de Deus.
Os filisteus deviam estar festejando aquele feito de modo muito ofensivo ao Deus de Israel, pois certamente estavam tributando toda a glória da vitória obtida sobre os israelitas, ao deus deles, Dagom; e como Davi poderia ficar alegre com a notícia da morte de Saul e da derrota do exército israelita?
A queda do povo de Deus nunca será um motivo de alegria para um verdadeiro cristão.
 E tal foi a consternação produzida pela notícia da morte de Saul e Jônatas, e da derrota do exército de Israel, que nós lemos o seguinte nos versos 11 e 12:
“11 Então pegou Davi nas suas vestes e as rasgou; e assim fizeram também todos os homens que estavam com ele;
12 e prantearam, e choraram, e jejuaram até a tarde por Saul, e por Jônatas, seu filho, e pelo povo do Senhor, e pela casa de Israel, porque tinham caído à espada.”.
Houve não somente o ato de rasgar as vestes, como pranto e jejum por parte de Davi e seus homens.
Quem tem o temor de Deus não se alegra sequer pela ruína dos seus inimigos, quanto mais por aqueles que fazem parte do seu próprio povo.
Davi sabia muito bem separar os problemas pessoais que tinha que viver por causa das perseguições injustas de Saul, da honra que lhe devia na condição de ser o seu rei, escolhido pelo próprio Deus para reinar em Israel.
Antes de começarem as perseguições de Saul, ele já havia sido ungido para ser o futuro rei de Israel, mas enquanto Saul vivesse,  sabia que era a ele que o reino pertencia de fato, apesar de ter sido rejeitado por Deus, não somente para ser removido do reino, no momento que Ele determinasse, como também para não mais operar sobre ele, com a boa direção do Espírito Santo.
Davi havia colocado a sua vida nas mãos do Senhor, e não teve por usurpação o fato de ter sido ungido para ser rei tal como fora Saul.
Ele não estava portanto, torcendo para que Deus desse logo cabo da vida de Saul, para que pudesse tomar o seu lugar.
Ele não se conduzia desta forma, porque tinha o temor do Senhor e era guiado pelo Espírito Santo, de forma que esperava tão somente no Senhor e na Sua vontade.
Ele aguardava a hora do Senhor. Os seus olhos estavam continuamente no Seu Deus e não em Saul. E assim, a par de todo o mal que Saul lhe fizera, jamais veria na sua morte um motivo de alegria, senão de tristeza, porque fora ungido pelo Senhor, para estar à testa do Seu povo.
Foi por este motivo que Davi ordenou a morte do amalequita, pois dissera que havia matado Saul, e demonstrava em sua presença que tivera regozijo no ato de fazê-lo, como se tivesse feito um grande favor a Davi, que deveria agora dar-lhe a justa recompensa.
E ele foi recompensado de fato de modo justo, com a morte, porque assim como ele não temeu matar a Saul na condição de rei e ungido de Deus, também não teria o menor temor em matar o próprio Davi, se achasse oportunidade para fazê-lo.        
Quando o amalequita viu a reação de Davi e seus homens com o ato de rasgarem suas vestes, prantearem e jejuarem até à tarde, ele deve ter temido muito por sua vida, pois viu que aquela tristeza era sincera e não falsa, ou com motivações políticas, para ganhar a simpatia do povo.
Entretanto, pelo que conhecemos do caráter de Davi, sabemos que não fora por este tipo de motivação que ele foi movido quando manifestou o seu pesar, e quando compôs o cântico em memória de Saul e Jônatas, e que mandou ser ensinado em Judá, para ser cantado em honra deles.  
A elegia que Davi compôs foi registrada no chamado livro de Jasar, da palavra hebraica  iasar, que significa justo, e por isso temos em algumas versões livro dos Justos em vez de Jasar.
Este livro é o mesmo citado em Josué 10.13.
Esta palavra hebraica iasar é usada em inúmeras passagens do Velho Testamento, como por exemplo em Êx 15.26; Nm 23.10; Dt 6.18; Jos 9.25; Jz 17.6; I Sm 12.23; Sl 7.10; 11.7, 19.8, dentre outras, onde é traduzida por reto, bom, justo.  
O cântico de Davi não cita uma única nota de lamento sobre quaisquer dos muitos erros que Saul havia cometido ao longo de todo o seu reinado.
Com isto nós aprendemos que não devemos falar mal daqueles em quem não podemos achar o bem.
É naquilo que é louvável que devemos concentrar a nossa atenção, seguindo a norma bíblica:
“Quanto ao mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai.” (Fp 4.8).
Davi celebra a Saul como o homem de guerra que havia sido e que tinha dado a Israel muitas vitórias sobre as nações inimigas, e nisto a sua morte era algo para se lamentar.
Mas sobre Jônatas havia muito mais do que isto para ser cantado em sua honra, pois dele Davi disse o que lemos no verso 26: “Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; muito querido me eras! Maravilhoso me era o teu amor, ultrapassando o amor de mulheres.”.
A morte de todos os guerreiros de Israel, que haviam tombado na batalha contra os filisteus é lamentada especialmente no último verso (27): “Como caíram os valorosos, e pereceram as armas de guerra!”.
O sentimento de Davi pode ser muito bem definido pelas palavras do apóstolo:
“De maneira que, se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele.” (I Cor 12.26).
O Israel de Deus é um só corpo, apesar de ter muitos membros.
E todo aquele que faz parte do corpo de Cristo há de se sentir como Davi se sentiu quando vir qualquer parte deste corpo sendo vencida pelo Inimigo, em algumas das muitas batalhas que deve empreender contra os poderes das trevas.
A perda de um só membro é sentida por todo o corpo e jamais será motivo de alegria, senão de tristeza e algo para se lamentar, tal como fizera Davi.


”1 Depois da morte de Saul, tendo Davi voltado da derrota dos amalequitas e estando há dois dias em Ziclague,
2 ao terceiro dia veio um homem do arraial de Saul, com as vestes rasgadas e a cabeça coberta de terra; e, chegando ele a Davi, prostrou-se em terra e lhe fez reverência.
3 Perguntou-lhe Davi: Donde vens? Ele lhe respondeu: Escapei do arraial de Israel.
4 Davi ainda lhe indagou: Como foi lá isso? Dize-mo. Ao que ele lhe respondeu: O povo fugiu da batalha, e muitos do povo caíram, e morreram; também Saul e Jônatas, seu filho, foram mortos.
5 Perguntou Davi ao mancebo que lhe trazia as novas: Como sabes que Saul e Jônatas, seu filho, são mortos?
6 Então disse o mancebo que lhe dava a notícia: Achava-me por acaso no monte Gilboa, e eis que Saul se encostava sobre a sua lança; os carros e os cavaleiros apertavam com ele.
7 Nisso, olhando ele para trás, viu-me e me chamou; e eu disse: Eis-me aqui.
8 Ao que ele me perguntou: Quem és tu? E eu lhe respondi: Sou amalequita.
9 Então ele me disse: Chega-te a mim, e mata-me, porque uma vertigem se apoderou de mim, e toda a minha vida está ainda em mim.
10 Cheguei-me, pois, a ele, e o matei, porque bem sabia eu que ele não viveria depois de ter caído; e tomei a coroa que ele tinha na cabeça, e o bracelete que trazia no braço, e os trouxe aqui a meu senhor.
11 Então pegou Davi nas suas vestes e as rasgou; e assim fizeram também todos os homens que estavam com ele;
12 e prantearam, e choraram, e jejuaram até a tarde por Saul, e por Jônatas, seu filho, e pelo povo do Senhor, e pela casa de Israel, porque tinham caída à espada.
13 Perguntou então Davi ao mancebo que lhe trouxera a nova: Donde és tu? Respondeu ele: Sou filho de um peregrino amalequita.
14 Davi ainda lhe perguntou: Como não temeste estender a mão para matares o ungido do Senhor?
15 Então Davi, chamando um dos mancebos, disse-lhe: chega-te, e lança-te sobre ele. E o mancebo o feriu, de sorte que morreu.
16 Pois Davi lhe dissera: O teu sangue seja sobre a tua cabeça, porque a tua própria boca testificou contra ti, dizendo: Eu matei o ungido do Senhor.
17 Lamentou Davi a Saul e a Jônatas, seu filho, com esta lamentação,
18 mandando que fosse ensinada aos filhos de Judá; eis que está escrita no livro de Jasar:
19 Tua glória, ó Israel, foi morta sobre os teus altos! Como caíram os valorosos!
20 Não o noticieis em Gate, nem o publiqueis nas ruas de Asquelom; para que não se alegrem as filhas dos filisteus, para que não exultem as filhas dos incircuncisos.
21 Vós, montes de Gilboa, nem orvalho, nem chuva caia sobre vós, ó campos de morte; pois ali desprezivelmente foi arrojado o escudo dos valorosos, o escudo de Saul, ungido com óleo.
22 Do sangue dos feridos, da gordura dos valorosos, nunca recuou o arco de Jônatas, nem voltou vazia a espada de Saul.
23 Saul e Jônatas, tão queridos e amáveis na sua vida, também na sua morte não se separaram; eram mais ligeiros do que as águias, mais fortes do que os leões.
24 Vós, filhas de Israel, chorai por Saul, que vos vestia deliciosamente de escarlata, que vos punha sobre os vestidos adornos de ouro.
25 Como caíram os valorosos no meio da peleja!
26 Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; muito querido me eras! Maravilhoso me era o teu amor, ultrapassando o amor de mulheres.
27 Como caíram os valorosos, e pereceram as armas de guerra!” (II Sm 1.1-27).



II Samuel 2

Um Reino que É Tomado por Esforço

Nós vemos no segundo capítulo de 2 Samuel, que tendo Saul morrido, Davi perguntou ao Senhor se deveria retornar de Ziclague para alguma das cidades de Judá. E o Senhor respondeu afirmativamente.
No entanto, Davi não se aventurou, por tudo que havia aprendido, a escolher a cidade para a qual deveria retornar por sua própria conta, e nem entregaria esta decisão à deliberação dos anciãos das diversas cidades de Judá.
Melhor do que qualquer pessoa somente o Senhor sabia qual seria a cidade que lhe seria mais propícia ao seu retorno, e por isso voltou a consultar ao Senhor pedindo-lhe que dissesse para qual cidade ele deveria ir. E como resposta o Senhor lhe apontou a cidade de Hebrom, que era uma cidade de refúgio e sacerdotal, e como todas as cidades de refúgio, ficava localizada numa região montanhosa.
Quando foi para Hebrom, Davi levou consigo suas duas esposas, Ainoã e Abigail (v.2), e na ocasião não tinha filhos.
No período de sete anos e seis meses, que permaneceu em Hebrom, tomaria mais quatro mulheres por esposas, e com estas e com Ainoã e Abigail gerou seis filhos, sendo um de cada uma  destas seis mulheres, cujos nomes, e dos respectivos filhos, são citados no início do capítulo seguinte.
Quando chegou a Hebrom os homens de Judá ungiram Davi rei sobre toda a casa de Judá, enquanto as demais tribos permaneceram seguindo a casa de Saul, porque Abner, seu tio, e general do seu exército, agiu rapidamente para constituir Is-Bosete, filho de Saul, como rei sobre Israel, inclusive sobre as tribos de Rúben, Gade e Manassés, na Transjordânia.
Davi havia se congratulado com os gileaditas, quando soube o bem que eles haviam feito à honra de Saul e Jônatas, resgatando os seus corpos do território dos filisteus, para serem sepultados em Gileade.
E antes que tomassem qualquer iniciativa no sentido de se aliarem a Davi, Abner se apressou em lhes apresentar Is-Bosete, que escapara da morte, por não ter subido à guerra contra os filisteus, e  certamente sob a alegação de que era o legítimo herdeiro do trono, por ser filho de Saul, e por isso se diz que Abner fez passar Is-Bosete por Maanaim, uma das principais regiões da Transjordânia, constituindo-o rei sobre Gileade.
Foi também para Maanaim que Davi se dirigiu, quando fugiu de Absalão, e onde permaneceu um longo período, até que a rebelião de seu filho fosse completamente dissolvida.
Maanaim ficava ao Sul do rio Jaboque, e na fronteira das tribos de Gade e Manassés, e pertencia à tribo de Gade.
Judá havia se acostumado a agir separadamente, e nós vemos esta tribo sendo numerada à parte para a guerra, desde os dias de Saul (I Sm 15.4).
A divisão de Israel em Reino do Norte, e do Sul, depois de Salomão, já vinha deitando raízes desde há muito, e era pela Providência divina que ela não se consumara antes da época determinada.
Mas esta divisão de reinos prevaleceu nos sete anos e meio que Davi reinou sobre Judá em Hebrom, período em que houve guerra entre Judá e as demais tribos de Israel, que estavam debaixo do governo de Is-Bosete, e mais propriamente do general Abner, que era o homem forte do reino, pois este Is-Bosete era fraco, conforme o demonstra o relato bíblico, e não é de se estranhar portanto, que não tivesse subido à guerra contra os filisteus com seu pai e seus dois irmãos, que haviam morrido em batalha.
Abner se opôs ao reinado de Davi, provavelmente em seu zelo pela sucessão linear em que a coroa tem que passar de pai para filho, e também por motivo de afeto à sua própria família, porque era tio avô de Is-Bosete, e ainda, porque ele sabia que dificilmente seria nomeado por Davi general de todo o seu exército, honra que até aquele momento fora dada aos sobrinhos de Davi, Joabe, Abisai e Asael, filhos de Zeruia, que era irmã de Davi (I Crôn 2.15,16).
Os quais eram homens poderosos e influentes em Judá.
Não podemos esquecer que a família de Jessé era descendente do primeiro príncipe e general do exército de Judá, nos dias de Moisés, chamado Naassom (I Crôn 2.10-12), e assim a família de Jessé desfrutava de um grande prestígio na tribo de Judá.
Provavelmente, Is-Bosete jamais protestaria qualquer direito à coroa, fraco que era,  caso o orgulho de Abner não lhe  tivesse levado a agir para a consecução dos seus próprios objetivos.
Todavia, Deus permitiu tudo isto para que a fé de Davi fosse provada na paciência e luta que teria que travar para que a promessa de que seria rei sobre todo Israel fosse cumprida.
Nisto há um grande exemplo para a Igreja de Cristo, porque ainda que seja fiel a promessa de que reinaremos com Ele, entretanto esta promessa é alcançada mediante o nosso esforço e fé, sofrendo com Ele neste mundo, para que sejamos achados dignos de também reinar com Ele quando todas as coisas Lhe estiverem sujeitas.
Foi através de graus que o reino de Davi se estabeleceu, e nisto, vem a ser tipo do reino do próprio Cristo, que está sendo também estabelecido em graus, pois ainda não se veem ainda todas as coisas a Ele sujeitas (Hb 2.8).
Mas é garantido e certo que Ele reinará sobre todos bem como todos os que estiverem com Ele, tal como se deu com Davi, que apesar de ter sido ungido por Deus para ser o sucessor de Saul, teve que lutar contra todos os poderes que se levantaram contra ele, até que se cumprisse cabalmente a promessa do Senhor, que de nenhum modo poderia falhar, pois tudo o que a boca do Senhor tem dito, cumprir-se-á.
E o primeiro confronto entre os homens de Davi e os de Abner se deu junto ao açude de Gibeão, estando as tropas separadas pelas margens opostas do referido açude.
E Abner desafiou as forças de Judá, propondo a Joabe que os valentes de ambos os lados se enfrentassem, para que através daquele jogo militar ficasse demonstrado quem de fato estava melhor preparado para a guerra.
Sendo escolhidos doze homens valorosos de ambos os lados, lutou cada um com o seu oponente, e o resultado foi que se mataram simultaneamente, não saindo vencedor nenhum dos lados. É bem provável que isto foi permitido por Deus, para que Abner soubesse que aquela guerra civil deveria ser evitada e deveria reconhecer que Davi fora ungido para ser o rei de todo Israel.
Contudo, a luta prosseguiu e os homens de Abner foram derrotados, tendo morrido vinte da parte de Davi (v. 30), e trezentos e sessenta da parte de Abner (v. 31).
Não poderia haver um recado mais claro da parte de Deus para as tribos de Israel de que Ele era com Davi e não com Is-Bosete, e seu tio Abner.
Nesta batalha foi morto o sobrinho de Davi, Asael, irmão de Joabe e de Abisai, que obstinadamente se colocou em perseguição a Abner com o intuito de pôr logo um fim àquela guerra.
De fato, se lograsse atingir o seu objetivo, matando Abner, Is-Bosete não teria força suficiente para reter os israelitas, e estes teriam seguido a Davi. Mas, como isto se deu logo no início do reinado de Davi em Hebrom, sete anos estavam determinados para que Davi viesse finalmente triunfar, e importava que Abner permanecesse em vida neste período, para que Israel aprendesse que é inútil lutar contra aquilo que foi determinado por Deus, mesmo quando se tem ao nosso lado um general experiente e valoroso como Abner e uma superioridade numérica, como tinham as demais tribos de Israel, em relação a Judá.
Tal era a supremacia das forças de Davi sobre as de Abner, que a destruição teria sido muito maior caso o próprio Abner não tivesse rogado a Joabe por uma trégua, para que não houvesse um grande enfraquecimento das forças de Israel pela espada dos seus próprios irmãos (v. 26,27).
  Depois desta batalha Abner retornou a Maanaim onde Is-Bosete fora entronizado, e Joabe e seus homens voltaram a Hebrom.



“1 Sucedeu depois disto que Davi consultou ao Senhor, dizendo: Subirei a alguma das cidades de Judá? Respondeu-lhe o Senhor: Sobe. Ainda perguntou Davi: Para onde subirei? Respondeu o Senhor: Para Hebrom.
2 Subiu, pois, Davi para lá, e também as suas duas mulheres, Ainoã, a jizreelita, e Abigail, que fora mulher de Nabal, e carmelita.
3 Davi fez subir também os homens que estavam com ele, cada um com sua família; e habitaram nas cidades de Hebrom.
4 Então vieram os homens de Judá, e ali ungiram Davi rei sobre a casa de Judá. Depois informaram a Davi, dizendo: Foram os homens de Jabes-Gileade que sepultaram a Saul.
5 Pelo que Davi enviou mensageiros aos homens de Jabes-Gileade, a dizer-lhes: Benditos do Senhor sejais vós, que fizestes tal benevolência, sepultando a Saul, vosso senhor!
6 Agora, pois, o Senhor use convosco de benevolência e fidelidade; e eu também vos retribuirei esse bem que fizestes.
7 Esforcem-se, pois, agora as vossas mãos, e sede homens valorosos; porque Saul, vosso senhor, é morto, e a casa de Judá me ungiu por seu rei.
8 Ora, Abner, filho de Ner, chefe do exército de Saul, tomou a Is-Bosete, filho de Saul, e o fez passar a Maanaim,
9 e o constituiu rei sobre Gileade, sobre os asuritas, sobre Jizreel, sobre Efraim, sobre Benjamim e sobre todo o Israel.
10 Quarenta anos tinha Is-Bosete, filho de Saul, quando começou a reinar sobre Israel, e reinou dois anos, A casa de Judá, porém, seguia a Davi.
11 E foi o tempo que Davi reinou em Hebrom, sobre a casa de Judá, sete anos e seis meses.
12 Depois Abner, filho de Ner, com os servos de Is-Bosete, filho de Saul, saiu de Maanaim para Gibeão.
13 Saíram também Joabe, filho de Zeruia, e os servos de Davi, e se encontraram com eles perto do tanque de Gibeão; e pararam uns de um lado do tanque, e os outros do outro lado.
14 Então disse Abner a Joabe: Levantem-se os mancebos, e se batam diante de nós. Respondeu Joabe: Levantem-se.
15 Levantaram-se, pois, e passaram, em número de doze por Benjamim e por Is-Bosete, filho de Saul, e doze dos servos de Davi.
16 E cada um lançou mão da cabeça de seu contendor, e meteu-lhe a espada pela ilharga; assim caíram juntos; pelo que se chamou àquele lugar, que está junto a Gibeão, Helcate-Hazurim.
17 Seguiu-se naquele dia uma crua peleja; e Abner e os homens de Israel foram derrotados diante dos servos de Davi.
18 Ora, estavam ali os três filhos de Zeruia: Joabe, Abisai, e Asael; e Asael era ligeiro de pés, como as gazelas do campo.
19 Perseguiu, pois, Asael a Abner, seguindo-o sem se desviar nem para a direita nem para a esquerda.
20 Nisso Abner, olhando para trás, perguntou: És tu Asael? Respondeu ele: Sou eu.
21 Ao que lhe disse Abner: Desvia-te para a direita, ou para a esquerda, e lança mão de um dos mancebos, e toma os seus despojos. Asael, porém, não quis desviar-se de seguí-lo.
22 Então Abner tornou a dizer a Asael: Desvia-te de detrás de mim; porque hei de ferir-te e dar contigo em terra? e como levantaria eu o meu rosto diante de Joabe, teu irmão?
23 Todavia ele recusou desviar-se; pelo que Abner o feriu com o conto da lança pelo ventre, de modo que a lança lhe saiu por detrás; e ele caiu ali, e morreu naquele mesmo lugar. E sucedeu que, todos os que chegavam ao lugar onde Asael caíra morto, paravam.
24 Mas Joabe e Abisai perseguiram a Abner; e pôs-se o sol ao chegarem eles ao outeiro de Amá, que está diante de Giá, junto ao caminho do deserto de Gibeão.
25 E os filhos de Benjamim se ajuntaram atrás de Abner e, formando-se num batalhão, puseram-se no cume dum outeiro.
26 Então Abner gritou a Joabe, e disse: Devorará a espada para sempre? não sabes que por fim haverá amargura? até quando te demorarás em ordenar ao povo que deixe de perseguir a seus irmãos?
27 Respondeu Joabe: Vive Deus, que, se não tivesses falado, só amanhã cedo teria o povo cessado, cada um, de perseguir a seu irmão.
28 Então Joabe tocou a buzina, e todo o povo parou; e não perseguiram mais a Israel, e tampouco pelejaram mais.
29 E caminharam Abner e os seus homens toda aquela noite pela Arabá; e, passando o Jordão, caminharam por todo o Bitrom, e vieram a Maanaim.
30 Voltou, pois, Joabe de seguir a Abner; e quando ajuntou todo o povo, faltavam dos servos de Davi dezenove homens, e Asael.
31 Mas os servos de Davi tinham ferido dentre os de Benjamim, e dentre os homens de Abner, a trezentos e sessenta homens, de tal maneira que morreram.
32 E levantaram a Asael, e o sepultaram no sepulcro de seu pai, que estava em Belém. E Joabe e seus homens caminharam toda aquela noite, e amanheceu-lhes o dia em Hebrom.” (II Sm 2.1-32).




II Samuel 3

Deus Abaterá os Que Lhe Resistem

É afirmado no início do terceiro capítulo de 2 Samuel, que durou muito tempo a guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi, mas havia uma diferença, pois se diz também que a casa de Davi ia se fortalecendo, mas a de Saul se enfraquecendo (v.1).
Nisto aprendemos que por mais tempo que dure a nossa luta contra a carne, o mundo e Satanás, se temos Deus por nós e ao nosso lado, a graça ficará mais forte e os nossos inimigos cada vez mais fracos.
A competição entre a graça e o pecado nos corações dos cristãos é muito longa, mas pode ser comparada ao que é dito aqui, porque a vitória final será da graça e não da corrupção, ainda que dure muito tempo a guerra entre a casa da graça e a casa do pecado.  
Nos versos 2 a 5 nós temos um relato do aumento da própria casa de Davi com os seis filhos que ele teve em Hebrom, sendo o primogênito Amnom, que era o sucessor natural à coroa, mas que viria a ser morto por Absalão, por ter abusado de Tamar, sua irmã.
O segundo foi Quileabe, que tivera de Abigail (v.2). Este nome Quileabe, no hebraico significa o retrato do seu pai, isto é, a cara do seu pai. E é possível que sendo filho da viúva de Nabal, podem ter feito mofa em Judá com o seu nome, referindo-se a Nabal, e talvez por isto tenham lhe dado o apelido de Daniel, como aparece em I Crôn 3.1, que significa Deus é meu Juiz.
O terceiro filho a nascer a Davi foi Absalão, que era neto de um rei pagão chamado Talmai (de Gesur), pois sua mãe, Maaca, era filha deste rei (v.3).
O quarto filho de Davi chamava-se Adonias, o qual foi morto por Salomão, e o quinto Sefatias (v.4), e o sexto e último que lhe nascera em Hebrom chamava-se Itreão (v.5).
Tendo multiplicado mulheres para si, contrariamente ao que era ordenado na lei (Dt 17.17) Davi deixou um mau exemplo para os seus sucessores, e causou muitas dores a si mesmo, como veremos adiante, especialmente com três destes filhos que foram abomináveis: Amnom, Absalão e Adonias.
Nos versos 6 a 21 nós lemos sobre o abandono de Is-Bosete por Abner, e da aliança proposta por este a Davi.
E o motivo disto foi certamente o ato de Is-Bosete ter-se enchido de inveja de Abner, seu tio, que era a pessoa que de fato governava, como se pode inferir das palavras do verso 6: “Enquanto havia guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi, Abner ia se tornando poderoso na casa de Saul.”.
Não se diz que Abner se tornava poderoso em Israel, mas na casa de Saul, isto é, ele era o homem forte do reino e não Is-Bosete.
Este tentou enfraquecer Abner sob a acusação de traição à memória de Saul, por ter se deitado com Rispa, uma concubina de Saul (v. 7).
Se a acusação era fundada não podemos saber, mas há razão para se suspeitar que  tenha sido, porque Abner não a negou expressamente. Ele somente se ressentiu da exposição pública a que foi submetido por Is-Bosete, como se fosse um animal desprezível e sem valor (v.8), e protestou contra a falta de gratidão pelos serviços que havia prestado à casa de Saul.
Nós aprendemos desta reação de Abner que os homens orgulhosos não suportam serem repreendidos, especialmente por aqueles que pensam que lhes são devedores de favores.
E se isto acontece, a saber, se são repreendidos, se julgam no direito de se vingarem, tal como fizera Abner em relação a Is-Bosete, declarando-lhe que o abandonaria e se aliaria a Davi (v. 9, 10).
Ele sabia que o reino fora prometido por Deus a Davi e assim mesmo se opôs a isto, apoiando a casa de Saul, por causa da sua ambição, e agora ele se sujeita à ordenança de Deus, não por obediência voluntária, mas por vingança e indignação.
Is-Bosete não respondeu palavra à arrogância e insolência de  Abner (v.11), não por ter entendido que ele estava com a razão, mas por causa da sua própria fraqueza, e por temer que se era ruim ser a sombra de Abner no trono, seria muito pior ficar sem ele, que era o seu sustentáculo.
Abner enviou mensageiro a Davi em Hebrom dizendo-lhe que estava disposto a torná-lo rei sobre todo Israel, e Davi o aceitou sob a condição de que lhe devolvesse Mical, sua esposa, filha de Saul, ao mesmo tempo que enviou mensageiros a Is-Bosete, para que lha entregasse.
Foi sob a permissão de Is-Bosete que ela foi retirada por Abner de Paltiel, a quem Saul lha havia dado por esposa, em represália a Davi (v.12-16).
Mical foi a primeira esposa de Davi e era filha de um rei de Israel, e seria certamente a primeira rainha, e a sua presença no trono seria uma forma de agradar politicamente os partidários de Saul.
Depois disto, Abner foi ter com os anciãos de Israel, para convencê-los a fazer de Davi o seu rei (v. 17). E as palavras que ele dirigiu a eles “de há muito procuráveis que Davi reinasse sobre vós”, denunciavam claramente que sabia que a sua luta contra Davi não prosperaria, porque os corações dos príncipes de Israel se inclinavam de há muito para ele, mas eram forçados a lutar contra ele, por causa da força opressiva que era mantida pelo próprio Abner.
 Ele usou como argumento a promessa de Deus relativa a Davi como sendo o rei por cujas mãos ele livraria Israel da mão dos filisteus e de todos os seus inimigos (v.18).
Certamente não fizera isto por um verdadeiro temor e obediência à vontade de Deus, que era bem conhecida dele de há muito, senão por ter visto que estava sendo enfraquecido mais e mais, enquanto o oposto se dava em relação a Davi.
A acusação de Is-Bosete contra ele, produziria de certa forma um clima de suspeita contra ele, que fatalmente o enfraqueceria no conceito do povo, e então estava procurando na verdade se poupar de uma derrota certa, e por este motivo estava se apressando em fazer uma aliança com Davi.
Como Saul e toda a sua casa eram benjamitas, ele apresentou separadamente aos líderes de Benjamim argumentos para convencê-los em favor de Davi (v.19).
Assim, Abner estava agindo politicamente, traçando os meios necessários para pôr um fim nos conflitos entre Israel e Judá, e não traiçoeiramente, conforme Joabe o acusou perante Davi, quando soube que Abner viera ter com ele em Hebrom, com uma comitiva de vinte homens, aos quais Davi havia oferecido um banquete, em sinal de celebração da aliança que havia feito com eles (v.20).    
Joabe, movido pelo simples desejo de vingar a morte de Asael, seu irmão (v. 30),  viria a agir de modo traiçoeiro, pois sem que Davi o soubesse, enviou mensageiros a Abner pedindo que retornasse a Hebrom, provavelmente, fazendo-o falsamente em nome do rei, e mal este entrara à porta daquela cidade fortificada, Joabe veio ter com ele e o feriu mortalmente no abdômen.
Quem poderá aplacar o desejo de vingança caso aquele que abriga tal desejo não permita ser tratado por Deus?
Joabe se fez culpado aos olhos de Deus pelo crime covarde que cometera, mas ao mesmo tempo o próprio Abner foi submetido a um juízo que lhe sobreveio por ter resistido à ordenança de Deus e não ter agido, como fizera agora, em relação a Davi.
Ele cometeu a loucura de se opor à vontade de Deus, e agora estava pagando por tê-lo feito.
É interessante observar que Abner procurou uma aliança com Davi como que o sucesso deste dependesse das suas ações para conduzi-lo a reinar sobre todo Israel.
Os homens orgulhosos são iludidos em pensarem que estão de pé e que tudo e todos dependem deles, mesmo quando percebem que estão caindo. E isto se infere do que Abner disse a Davi no verso 21.
Asael, irmão de Joabe havia sido morto por Abner, por causa da sua própria obstinação, porque Abner lhe alertou para que se desviasse dele, quando o perseguia no primeiro combate empreendido entre as forças de Davi e de Is-Bosete, pois não pretendia matá-lo, por ser irmão de Joabe, e serem muito estimados a Davi.
Ele disse a Asael que caso o matasse isto o deixaria mal com seu irmão Joabe (2.22), mas Asael não lhe deu ouvido e acabou sendo morto por ele, em legítima defesa.
Não havia então nenhum sangue a ser vingado neste caso, porque não houve nenhum assassinato doloso ou crime de guerra, senão legítima defesa. Mas Joabe e seu irmão Abisai chamaram a si o dever de serem os vingadores do sangue de seu irmão Asael.
Na verdade se fingiram vingadores do sangue, porque, como vimos antes, não havia nenhuma vingança amparada pela lei, neste caso.
E o próprio Joabe e seu irmão, matando traiçoeira e friamente a Abner, se fizeram culpados de sangue, e golpearam não apenas Abner, mas o próprio Davi e o seu reino, pois havia feito uma aliança com Abner, e esta deveria ser respeitada, porque sem que se pese as verdadeiras intenções e interesses de Abner, ele havia se colocado de fato debaixo da autoridade de Davi, e não somente isto, reconheceu que era seu dever conduzir todos os líderes de Israel a estarem debaixo da autoridade que havia sido conferida a Davi pelo próprio Deus.
Por isso, em seu funeral, Davi o pranteou (v. 32) e declarou que havia caído em Israel um príncipe e um grande homem (v. 38).
Somente pelos serviços que ele havia prestado a Israel sob Saul, já lhe caberia tal elogio.
Ainda que não se pudesse dizer dele que era um santo e um bom homem, o que ele não era na verdade, entretanto, como político em Israel ele fora um príncipe e um grande homem, porque lutava bravamente como um patriota, em  Israel, contra os inimigos da nação.
Assim, Davi lamentou não poder justiçar os assassinos porque o seu reinado havia sido inaugurado recentemente e um pequeno tremor poderia abalar profundamente o reino, com a morte de Joabe e Abisai, que eram os principais no reino depois do próprio Davi.
Assim ele transferiu o julgamento de ambos ao cuidado de Deus para que a justiça fosse feita.
Joabe tinha grande força e influência em Judá, e Davi teve que suportá-lo como auxiliar, mas não inteiramente leal e submisso a ele.
Ele não podia confiar-se inteiramente a Joabe. E isto sucede a todos que são líderes na casa de Deus. Terão que aprender a trabalhar com muitas pessoas com as quais não possam confiarem a si mesmos. E não é propósito de Deus livrar os seus servos fiéis de pessoas do mesmo caráter de um Joabe, para que possam aprender a confiar inteiramente nEle, e a serem exercitados em disciplina, justiça e paciência, como em tantas outras coisas que de outro modo não poderiam aprender, caso não tivessem que suportar aqueles que lhes são necessários e úteis, mas não sem lhes causarem muitas aflições, por conta do caráter que possuem.
Não apoiando o ato insano de Joabe, e demonstrando a sua tristeza pela morte de Abner, Davi subiu no conceito do povo, pois viram que ali estava diante deles um rei que amava a justiça e não o que era da sua conveniência pessoal.
Um homem público que não agia por caprichos, mas por meio daquilo que era bom para toda a nação.
Assim, Deus pode tirar do mal o bem, quando perseveramos na prática do bem.    



“1 Ora, houve uma longa guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi; porém Davi se fortalecia cada vez mais, enquanto a casa de Saul cada vez mais se enfraquecia.
2 Nasceram filhos a Davi em Hebrom. Seu primogênito foi Amnom, de Ainoã, a jizreelita;
3 o segundo Quileabe, de Abigail, que fôra mulher de Nabal, o carmelita; o terceiro Absalão, filho de Maacá, filha de Talmai, rei de Gesur;
4 o quarto Adonias, filho de Hagite, o quinto Sefatias, filho de Abital;
5 e o sexto Itreão, de Eglá, também mulher de Davi; estes nasceram a Davi em Hebrom.
6 Enquanto havia guerra entre a casa de Saul e a casa de Davi, Abner ia se tornando poderoso na casa de Saul:
7 Ora, Saul tivera uma concubina, cujo nome era Rispa, filha de Aías. Perguntou, pois, Is-Bosete a Abner: Por que entraste à concubina de meu pai?
8 Então Abner, irando-se muito pelas palavras de Is-Bosete, disse: Sou eu cabeça de cão, que pertença a Judá? Ainda hoje uso de benevolência para com a casa de Saul, teu pai, e para com seus irmãos e seus amigos, e não te entreguei nas mãos de Davi; contudo tu hoje queres culpar-me no tocante a essa mulher.
9 Assim faça Deus a Abner, e outro tanto, se, como o Senhor jurou a Davi, assim eu não lhe fizer,
10 transferindo o reino da casa de Saul, e estabelecendo o trono de Davi sobre Israel, e sobre Judá, desde Dã até Berseba.
11 E Is-Bosete não pôde responder a Abner mais uma palavra, porque o temia.
12 Então enviou Abner da sua parte mensageiros a Davi, dizendo: De quem é a terra? Comigo faze a tua aliança, e eis que a minha mão será contigo, para fazer tornar a ti todo o Israel.
13 Respondeu Davi: Está bem; farei aliança contigo; mas uma coisa te exijo; não verás a minha face, se primeiro não me trouxeres Mical, filha de Saul, quando vieres ver a minha face.
14 Também enviou Davi mensageiros a Is-Bosete, filho de Saul, dizendo: Entrega-me minha mulher Mical, que eu desposei por cem prepúcios de filisteus.
15 Enviou, pois, Is-Bosete, e a tirou a seu marido, a Paltiel, filho de Laís,
16 que a seguia, chorando atrás dela até Baurim. Então lhe disse Abner: Vai-te; volta! E ele voltou.
17 Falou Abner com os anciãos de Israel, dizendo: De há muito procurais fazer com que Davi reine sobre vós;
18 fazei-o, pois, agora, porque o Senhor falou de Davi, dizendo: Pela mão do meu servo Davi livrarei o meu povo da mão dos filisteus e da mão de todos os seus inimigos.
19 Do mesmo modo falou Abner a Benjamim, e foi também dizer a Davi, em Hebrom, tudo o que Israel e toda a casa de Benjamim tinham resolvido.
20 Abner foi ter com Davi, em Hebrom, com vinte homens; e Davi fez um banquete a Abner e aos homens que com ele estavam.
21 Então disse Abner a Davi: Eu me levantarei, e irei ajuntar ao rei meu senhor todo o Israel, para que faça aliança contigo; e tu reinarás sobre tudo o que desejar a sua alma: Assim despediu Davi a Abner, e ele se foi em paz.
22 Eis que os servos de Davi e Joabe voltaram de uma sortida, e traziam consigo grande despojo; mas Abner já não estava com Davi em Hebrom, porque este o tinha despedido, e ele se fora em paz.
23 Quando, pois, chegaram Joabe e todo o exército que vinha com ele, disseram-lhe: Abner, filho de Ner, veio ter com o rei; e o rei o despediu, e ele se foi em paz.
24 Então Joabe foi ao rei, e disse: Que fizeste? Eis que Abner veio ter contigo; por que, pois, o despediste, de maneira que se fosse assim livremente?
25 Bem conheces a Abner, filho de Ner; ele te veio enganar, e saber a tua saída e a tua entrada, e conhecer tudo quanto fazes.
26 E Joabe, retirando-se de Davi, enviou mensageiros atrás de Abner, que o fizeram voltar do poço de Sira, sem que Davi o soubesse.
27 Quando Abner voltou a Hebrom, Joabe o tomou à parte, à entrada da porta, para lhe falar em segredo; e ali, por causa do sangue de Asael, seu irmão, o feriu no ventre, de modo que ele morreu.
28 Depois Davi, quando o soube, disse: Inocente para sempre sou eu, e o meu reino, para com o Senhor, no tocante ao sangue de Abner, filho de Ner.
29 Caia ele sobre a cabeça de Joabe e sobre toda a casa de seu pai, e nunca falte na casa de Joabe quem tenha fluxo, ou quem seja leproso, ou quem se atenha a bordão, ou quem caia à espada, ou quem necessite de pão.
30 Joabe, pois, e Abisai, seu irmão, mataram Abner, por ter ele morto a Asael, irmão deles, na peleja em Gibeão.
31 Disse Davi a Joabe e a todo o povo que com ele estava: Rasgai as vossas vestes, cingi-vos de sacos e ide pranteando diante de Abner. E o rei Davi ia seguindo o féretro.
32 Sepultaram Abner em Hebrom; e o rei, levantando a sua voz, chorou junto da sepultura de Abner; chorou também todo o povo.
33 Pranteou o rei a Abner, dizendo: Devia Abner, porventura, morrer como morre o vilão?
34 As tuas mãos não estavam atadas, nem os teus pés carregados de grilhões; mas caíste como quem cai diante dos filhos da iniquidade. Então todo o povo tornou a chorar por ele.
35 Depois todo o povo veio fazer com que Davi comesse pão, sendo ainda dia; porém Davi jurou, dizendo: Assim Deus me faça e outro tanto, se, antes que o sol se ponha, eu provar pão ou qualquer outra coisa.
36 Todo o povo notou isso, e pareceu-lhe bem; assim como tudo quanto o rei fez pareceu bem a todo o povo.
37 Assim todo o povo e todo o Israel entenderam naquele mesmo dia que não fora a vontade do rei que matassem a Abner, filho de Ner.
38 Então disse o rei aos seus servos: Não sabeis que hoje caiu em Israel um príncipe, um grande homem?
39 E quanto a mim, hoje estou fraco, embora ungido rei; estes homens, filhos de Zeruia, são duros demais para mim. Retribua o Senhor ao malfeitor conforme a sua maldade.” (II Sm 3.1-39).




II Samuel 4

Não Há Justiça Negociando com o Mal

Nós vemos no quarto capitulo de 2 Samuel que, quando Is-Bosete soube que Abner havia morrido, caiu em sua fraqueza, porque apesar de Abner tê-lo abandonado em relação à sua confirmação no reino, certamente esperava, em razão do seu parentesco com ele, que fizesse com Davi uma negociação política que o preservasse quando da passagem do reino para as suas mãos.
Mas agora, com a morte de Abner, ficou desnorteado e sem esperanças, especialmente porque foi abandonado pelos israelitas, nem tanto porque quisessem de fato servir a Davi voluntariamente, mas para não serem prejudicados em seus interesses, vendo que agora, estando Abner morto, que ele tomaria as rédeas de toda a nação, e o melhor que eles fariam em sua própria causa, era apoiar o novo rei.
Assim, diante da fraqueza de Is-Bosete, dois de seus próprios servos, chamados Baaná e Recabe, que deveriam lutar em sua defesa, se sentiram incentivados pelas condições do momento, a tirar-lhe a vida, pensando com isso, agradarem a Davi, e conseguirem um lugar de destaque junto a ele, pela avaliação da sua ação ousada, como sendo digna de uma recompensa.
Quando eles levaram a cabeça de Is-Bosete a Davi, foram surpreendidos com a decisão do rei, que em vez de aprovar o assassinato deles, deu ordens para que fossem executados, por tal ato covarde contra um homem justo, no dizer de Davi, pois de fato a Bíblia não relata nenhum ato vil que tivesse sido praticado por Is-Bosete, prevalecendo-se da condição de ser rei, e o fato de ser um homem fraco não demandaria que fosse assassinado de modo tão covarde, quando estava dormindo em sua cama, à hora da sesta, em pleno calor do dia.
No verso quarto há um breve relato sobre a causa da deficiência física a que ficou sujeito o filho de Jônatas, chamado Mefibosete, como forma de introdução do que será dito dele adiante no nono capítulo, e talvez para revelar que o desespero que havia invadido a alma de Is-Bosete, quando soube da morte de Abner, era do mesmo tipo e grau do desespero que havia sentido a ama de Mefibosete quando ele tinha apenas cinco anos, e que tomou a iniciativa de fugir apressadamente para escondê-lo de um possível extermínio que os filisteus poderiam intentar contra toda a descendência de Saul, quando ela soube que este e seu filho Jônatas haviam morrido na batalha que empreenderam contra os filisteus.
Na pressa em fugir ela o deixou cair e Mefibosete ficou coxo para sempre. Este temor de ser morto por ordem de Davi deve ter se apoderado de Is-Bosete, mas ele acabou sendo morto pelos seus próprios servos.    
Quando Davi pronunciou sua sentença de morte sobre Baaná e Recabe, ele introduziu suas palavras com a expressão: “Vive o Senhor, que remiu a minha alma de toda a angústia!”, indicando com isto a eles que continuaria dependendo exclusivamente de Deus para ser posto sob o governo de todo Israel, e não precisava da ajuda de homens ímpios como eles para ser poupado de seus problemas e tribulações.
Davi pretendeu dizer que o Senhor que lhe havia livrado de muitas angústias até ali, certamente lhe continuaria livrando, e de fato foi o que ocorreu ao longo de toda a sua vida.
Davi lhes disse que assim como ele não havia poupado da morte aquele que lhe trouxera a coroa de Saul, gabando-se de tê-lo morto, muito menos pouparia aqueles que lhe trouxeram a cabeça de seu filho.
Ele agiria como o vingador do sangue daquele assassinato doloso, na condição de magistrado supremo da nação, e nenhuma intercessão em favor deles seria ouvida, porque pronunciara a sua sentença sobre eles com a introdução que fizera em nome do Deus vivo, que testemunhou aquele crime que  haviam confessado com suas próprias bocas.
Um rei justo como Davi estava capacitado a fazer uma avaliação de tal caso como lhe sendo desfavorável e completamente injusto, e não como uma ação justa que tivesse sido praticada em seu benefício.
Se tivesse se alegrado e poupado aqueles homens, cairia no descrédito de muitos israelitas, especialmente dos da tribo de Benjamim à qual pertencia Is-Bosete, e seria lançada uma suspeita sobre ele como sendo o mandante daquele assassinato covarde.
E assim, nas vidas dos servos de Deus, muitas tentações e facilidades ser-lhe-ão apresentadas pelo Inimigo de suas almas, disfarçando-se de amigo e cooperador, que poderão ser discernidas somente no Senhor, e que devem ser rejeitadas de forma decidida, porque não se pode ser bem sucedido e ser agradável a Deus a não ser somente pela prática daquilo que é justo aos Seus olhos.
E para serem expostos como um monumento da justiça, que havia no trono de Davi, foi ordenado que se cortassem as mãos e os pés daqueles assassinos para que se assinalasse qual é o destino de todos aqueles que pensem em servir os interesses do Filho de Davi por meio de práticas imorais, de violência, de fraude, roubo, ou por quaisquer outros meios que são usados por aqueles que têm procurado se estabelecer através da prática da injustiça, pensando estarem fazendo um bom serviço a Deus.          
 Davi citou neste capitulo, como vimos antes, os sofrimentos angustiosos que estava sofrendo, e isto certamente, por causa do seu amor à justiça.



“1 Quando Is-Bosete, filho de Saul, soube que Abner morrera em Hebrom, esvaíram-se-lhe as forças, e todo o Israel ficou perturbado.
2 Tinha Is-Bosete, filho de Saul, dois homens chefes de guerrilheiros; um deles se chamava Baaná, e o outro Recabe, filhos de Rimom, o beerotita, dos filhos de Benjamim (porque também Beerote era contado de Benjamim,
3 tendo os beerotitas fugido para Jitaim, onde têm peregrinado até o dia de hoje).
4 Ora, Jônatas, filho de Saul, tinha um filho aleijado dos pés. Este era da idade de cinco anos quando chegaram de Jizreel as novas a respeito de Saul e Jônatas; pelo que sua ama o tomou, e fugiu; e sucedeu que, apressando-se ela a fugir, ele caiu, e ficou coxo. O seu nome era Mefibosete.
5 Foram os filhos de Rimom, o beerotita, Recabe e Baanã, no maior calor do dia, e entraram em casa de Is-Bosete, estando ele deitado a dormir a sesta.
6 Entraram ali até o meio da casa, como que vindo apanhar trigo, e o feriram no ventre; e Recabe e Baaná, seu irmão, escaparam.
7 Porque entraram na sua casa, estando ele deitado na cama, no seu quarto de dormir, e o feriram e mataram, e cortando-lhe a cabeça, tomaram-na e andaram a noite toda pelo caminho da Arabá.
8 Assim trouxeram a cabeça de Is-Bosete a Davi em Hebrom, e disseram ao rei: Eis aqui a cabeça de Is-Bosete, filho de Saul, teu inimigo, que procurava a tua morte; assim o Senhor vingou hoje ao rei meu Senhor, de Saul e da sua descendência.
9 Mas Davi, respondendo a Recabe e a Baaná, seu irmão, filhos de Rimom, e beerotita, disse-lhes: Vive o Senhor, que remiu a minha alma de toda a angústia!
10 Se àquele que me trouxe novas, dizendo: Eis que Saul é morto, cuidando que trazia boas novas, eu logo lancei mão dele, e o matei em Ziclague, sendo essa a recompensa que lhe dei pelas novas,
11 quanto mais quando homens cruéis mataram um homem justo em sua casa, sobre a sua cama, não requererei eu o seu sangue de vossas mãos, e não vos exterminarei da terra?
12 E Davi deu ordem aos seus mancebos; e eles os mataram e, cortando-lhes as mãos e os pés, os penduraram junto ao tanque em Hebrom. Tomaram, porém, a cabeça de Is-Bosete, e a sepultaram na sepultura de Abner, em Hebrom.” (II Sm 4.1-12).


II Samuel 5

Estratégias para Derrotar o Mal

No quinto capítulo de 2 Samuel, vemos Davi sendo ungido rei pela terceira vez (v. 3), agora sobre todo Israel.
Antes, havia sido ungido por Samuel quando era ainda muito jovem, e depois foi ungido em Hebrom como rei sobre Judá, e agora, finalmente, dando-se pleno cumprimento à promessa de Deus, ele é ungido rei sobre todo Israel.
Ele tinha trinta anos quando começou a reinar (v. 4), mas não se diz, se sobre Judá, ou sobre todo Israel.
Se o  início do seu governo com trinta anos foi computado a partir do reinado apenas sobre Judá, podemos concluir que Davi morreu com setenta anos de idade, pois isto se obtêm somando os trinta anos de idade que tinha na ocasião com os quarenta anos totais de governo.
Mas se esta citação se refere à data do início do seu governo sobre todo Israel, então deve-se somar os trinta anos de idade aos trinta e três anos restantes do seu governo, e neste caso, teria morrido aos sessenta e três anos de idade.
A vida atribulada de Davi fez com que envelhecesse precocemente.
Não foram os muitos problemas de estado que o envelheceram de tal modo, a ponto de não poder se aquecer nos seus últimos dias de vida, senão com o auxílio de uma jovem que foi designada para isto, chamada Abisague.
Certamente foram os problemas familiares e as muitas traições e perseguições que ele sofreu, que o conduziram a tal estado.
Moisés por exemplo morreu aos cento e vinte anos em pleno vigor, tendo peregrinado no deserto durante os últimos quarenta anos de sua vida.
Entretanto, ele foi protegido por um viver fiel em toda a casa de Deus, não tendo por conseguinte os muitos conflitos de consciência que afligiram Davi, especialmente o de ter contraído matrimônio com várias mulheres, e de ter tido várias concubinas, e sobretudo o seu pecado de adultério com Bate-Seba e o assassinato de seu marido Urias.
Neste sentido Davi também se tornou um exemplo para muitos do povo de Deus, de modo a não imitarem estas suas obras que acabaram em se lhe tornando um laço, no qual ele se emaranhou a si mesmo, e que lhe trouxe muitas angústias e dores, a par de toda a graça que lhe foi exibida por Deus, em razão do seu caminhar humilde em Sua presença.
Em I Crôn 12.23-40 nós temos um detalhamento de quantos de Israel vieram ter com Davi em Hebrom, na ocasião que foi aclamado rei sobre todo Israel, e os três dias que permaneceram com ele.
Nos versos 6 a 9 é relatado o modo como Jerusalém foi conquistada por Davi.
Informações adicionais sobre a conquista de Jerusalém se encontram em I Crôn 11.4-9, e ali se diz  que Davi disse que aquele que subisse primeiro aos jebuseus seria feito chefe do seu exército.
E foi Joabe quem se dispôs a isto, e foi a partir de então que se tornou general, não apenas sobre o exército de Judá, mas de todo o exército de Israel.
Os jebuseus eram tão confiantes na fortaleza da sua cidade de Jebus, cujo nome foi mudado para Jerusalém, que provavelmente colocavam os cegos e coxos sobre os seus muros para ridicularizarem aqueles que intentavam tomar a cidade, e talvez foi por isso que os seus habitantes disseram a Davi que os coxos e os cegos da cidade o repeliriam, e de Davi ter dito a seus homens que ferissem aos cegos e os coxos daquela cidade que a sua alma aborrecia.
Depois da tomada de Jerusalém, em razão disto, passou a ser comum em Israel o ditado que nem cego nem coxo entrarão na casa.
Tendo conquistado Jerusalém, Davi se transferiu de Hebrom para lá (v. 9).
E se diz no verso 10 que “Davi ia-se engrandecendo cada vez mais, porque o Senhor Deus dos exércitos era com ele.”.
Isto não significa que todo aquele com o qual for o Senhor Deus dos exércitos será engrandecido por Ele neste mundo, mas que, no caso específico da grandeza de Davi, a causa dela era Deus mesmo quem a estava produzindo.
Ele determinara engrandecer a Davi por amor do Seu nome, como determinara fazer o mesmo no passado com Abraão, Moisés e Josué, conforme afirmara com Sua própria boca, que o faria em relação a eles.
Assim engrandece a quem quer, e abate a quem quer, humilha a quem quer, e exalta a quem quer, e faz o mesmo em relação à misericórdia e ao endurecimento.
Ele manifesta através destes atos soberanos que Ele é Senhor sobre tudo e todos, e não é dado ao homem dirigir o seu próprio destino.
 “O Senhor empobrece e enriquece; abate e também exalta.” (I Sm 2.7).
“Os olhos altivos do homem serão abatidos, e a altivez dos varões será humilhada, e só o Senhor será exaltado naquele dia. Pois o Senhor dos exércitos tem um dia contra todo soberbo e altivo, e contra todo o que se exalta, para que seja abatido;” (Is 2.11,12).
“Qualquer, pois, que a si mesmo se exaltar, será humilhado; e qualquer que a si mesmo se humilhar, será exaltado.” (Mt 23.12).
Assim, a glória do reino de Davi estava sendo acrescentada por Deus, e não era decorrente da sua própria iniciativa, e uma das grandes provas disto é que o rei Hirão de Tiro se dispôs a construir um palácio para Davi, enviando-lhe tanto o material de construção como os artífices (v.11).
Davi reconheceu sabiamente que era a mão de Deus que estava em tudo isto, conforme se depreende da palavras do verso 12:
“Entendeu, pois, Davi que o Senhor o confirmara rei sobre Israel, e que exaltara o reino dele por amor do seu povo Israel.”.
Saul foi feito rei mas o seu reinado não foi confirmado por Deus, ao contrário, foi rejeitado, mas Davi não foi feito somente rei, como também o seu reino foi estabelecido e confirmado por Deus, e nisto o seu reinado foi um tipo do reinado de Cristo, conforme se vê no Salmo 89.
Foi por amor do seu povo, Israel, que Deus engrandeceu o reino de Davi e o confirmou como rei sobre o seu povo.
Era para o bem do povo e não para a exclusiva exaltação de Davi.
Ministros são engrandecidos por amor da Igreja, e não propriamente para que exibam a si mesmos como troféus de um alegado favor divino que é dado exclusivamente a eles.
Os talentos que são recebidos são para serem aplicados no favor de outros em amor.
O que se tem recebido é para ser dado e não entesourado.
Não é para o próprio bem exclusivo que somos enriquecidos pela graça, mas para promover o bem de outros.
Foi por isso que Deus engrandeceu o reino de Davi. Para que Israel pudesse desfrutar das bênçãos do Senhor sob o Seu reinado.
Assim como a grande glória do reino de Jesus está em que Ele manifeste toda a bondade e justiça de Deus em favor dos pecadores penitentes, tanto quanto nos juízos que Ele trará sobre os perversos e incrédulos, dando-lhes a justa paga pelas suas más obras.
Davi foi engrandecido portanto, para ser não somente instrumento da bondade de Deus para com Israel, como também para manifestar a Sua justiça, julgando o povo segundo a Sua Lei.
Entretanto, o que se diz logo no verso seguinte (v. 13) não procedia de Deus para o engrandecimento de Davi, porque Ele não agiria contra a Sua própria determinação de que os reis de Israel não ajuntassem mulheres para si.
“Davi tomou ainda para si concubinas e mulheres de Jerusalém, depois que viera de Hebrom; e nasceram a Davi mais filhos e filhas.” (v.13).
E com estas ele gerou em Jerusalém mais onze filhos, além dos seis que havia gerado em Hebrom, chegando a dezessete o número de filhos que tivera, sem contar o que tivera com Bate-Seba e que havia morrido. No lugar deste foi-lhe dado Salomão, que é contado dentre os onze que são nomeados nos versos 14 a 16.
Davi havia sido levantado como rei para derrotar definitivamente os filisteus, e fazer com que Israel dominasse o território que eles ocupavam, e que foi dado por promessa aos israelitas juntamente com todas as demais terras de Canaã até o extremo norte do rio Eufrates.
Então nós temos nos versos 17 a 25 as circunstâncias e o modo com que se deu tal conquista.
Os filisteus vieram contra Israel porque souberam que Davi havia conquistado Jerusalém e que havia sido feito rei sobre todo Israel e não apenas sobre Judá.
E intentaram destruí-lo antes que se fortalecesse no trono, porque se lhes fizera tantos danos enquanto vivia Saul, ferindo aos seus dez milhares, sendo apenas um dos seus capitães, o que  não poderia lhes fazer agora como rei de todo Israel?
Então marcharam em grande número contra ele e se acamparam perto e defronte de Jerusalém no vale de Refaim (v. 18). .
Mas Davi não se precipitou logo sobre eles sem que antes consultasse ao Senhor para saber se deveria enfrentá-los num combate frontal em campo aberto, tropas contra tropas, e por motivo de prudência perguntou também ao Senhor se Ele entregaria os filisteus em suas mãos (v. 19).
Foi somente depois de ter recebido uma resposta afirmativa da parte de Deus, que Davi subiu para pelejar contra eles, e os derrotou no lugar que passou a ser chamado Baal-Perazim, que significa que Baal foi rompido, isto é, as forças que lutavam em seu nome foram rompidas, pois Davi viu aquela derrota como sendo o resultado do braço forte do Senhor, que rompeu seus inimigos diante dele como as águas de uma represa rompem as suas barreiras, depois que é feita uma brecha numa de suas paredes.
Afinal, fora o Senhor que o enviou à luta debaixo de uma promessa de vitória, e se Deus nos enviar, Ele nos confirmará e se levantará por nós.
A garantia da vitória que Deus nos deu sobre os nossos inimigos espirituais, repousa na promessa que Ele fez de que esmagará brevemente Satanás debaixo dos nossos pés.
Então, isto deveria nos animar em nossos conflitos espirituais.
Nós não lutamos debaixo da incerteza da vitória, e esta não depende da nossa superioridade numérica e nem mesmo da nossa própria força, porque poderoso e fiel é Aquele que fez a promessa, e assim, não lutamos confiando na nossa própria força e capacidade, mas na promessa do Senhor que é a nossa força.
Davi tributou toda glória daquela vitória a Deus, quando disse que fora Ele quem havia rompido os seus inimigos diante dEle. E não fizera isto por mera expressão verbal, mas para expressar uma grande realidade que ele havia presenciado, porque Deus não fez apenas a parte principal do trabalho, mas fizera tudo.
Deus fez tudo e Davi e seus homens fizeram tudo porque foram capacitados e protegidos pelo Senhor para fazê-lo.
É por este motivo que nós veremos adiante, que Davi destruiu centenas de carruagens e inutilizou centenas de cavalos que havia conquistado aos sírios, porque a sua confiança não estava em carruagens e cavalos, para obter vitória nas batalhas contra os seus inimigos, mas no Senhor.
Os ídolos que os filisteus trouxeram para o campo de batalha e que representavam os seus deuses foram deixados para trás para vergonha deles porque não puderam livrá-los. E haviam se transformado numa grande carga para os seus cavalos cansados (Is 46.1,2). E Davi e seus homens pegaram estas imagens para serem queimadas, conforme determinado pela lei de Moisés (Dt 7.5).
Não para recuperarem seus deuses, e nem mesmo para vingarem o ato de suas imagens terem sido queimadas pelos israelitas, mas para darem cumprimento ao intento inicial deles de impedir que Davi se estabelecesse e se fortalecesse como rei sobre todo Israel, eles voltaram a  se espalhar no mesmo vale de Refaim para uma segunda batalha (v. 22).
E Davi havia amadurecido na fé o suficiente nas experiências que tivera antes, principalmente naquelas em que havia falhado por não ter consultado antes ao Senhor, que importa ter uma completa dependência dEle, e assim havia aprendido que não deveria ousar agir com base na ordem do Senhor relativa à primeira batalha.
Para cada luta a sua respectiva oração e dependência do Senhor.
A bênção de ontem não deve ser motivo para a negligência de se buscar a Deus hoje ou amanhã, pensando que podemos agir com base nas mesmas instruções que recebemos da parte dEle no passado.
Basta a cada dia o seu próprio mal.
Devemos orar pelo nosso pão material e espiritual em cada dia.
Então Davi não se dispôs a atacar os filisteus subindo contra eles num ataque frontal, confiado na consulta que fizera na primeira batalha, antes voltou a consultar a Deus e desta vez recebeu como resposta que não deveria subir como da primeira vez, mas rodear os filisteus por detrás e vir sobre eles apressadamente quando ouvisse um ruído de marcha pelas copas das amoreiras, porque era o Senhor que saía adiante dele para ferir o arraial dos filisteus (v.23,24).
O que Deus havia prometido a Davi desta vez é que Ele se encarregaria em ferir o exército dos filisteus com um exército invisível de anjos, que marchariam sobre as copas das amoreiras.
Eles não seriam vistos, mas o estrondo da marcha deles seria ouvido, e isto seria um sinal para que Davi se apressasse a atacar também os filisteus.
Aquelas amoreiras deviam estar enfileiradas como uma cerca viva, separando os dois exércitos, e é bem possível que os filisteus ouviram aquele grande estrondo de marcha de um exército vindo sobre eles e certamente ficaram confusos e começaram a bater em retirada exatamente pelas amoreiras nas quais se defrontaram com o exército de Davi e foram duramente golpeados desde Geba até Gezer (v. 25).
Veja que embora Deus tenha prometido ir adiante de Davi para golpear os filisteus, contudo ele tem que se mover apressadamente e deve se empenhar para obter a vitória.
Assim se dá com a pregação do evangelho. É Deus quem unge, é quem dá graça, é quem subjuga os poderes das trevas, é quem justifica, regenera, santifica, cura, restaura, mas os que pregam devem se empenhar muito em fazê-lo com todas as suas forças, enquanto percebem que o exército celestial está operando em seu favor.
O mesmo pode ser dito em relação aos que oram, que jejuam, que ensinam, que presidem, que exercem misericórdia, enfim, isto é um princípio a ser aprendido por todos os que se empenham na obra de Deus.
Nós não fazemos a nossa parte e Deus faz a dEle.
Ao contrário, nós devemos estar em completa sintonia com o Senhor, trabalhando com todo o empenho e esforço enquanto Ele tudo faz por meio de nós.
Isto nos faz lembrar das palavras do grande Jonathan Edwards que disse o seguinte: “Na graça eficaz não somos meramente passivos, nem ainda Deus faz um pouco e nós fazemos o restante. Mas Deus faz tudo, e nós fazemos tudo. Deus produz tudo, e nós agimos em tudo. Pois é isso que ele produz, isto é, os nossos atos. Deus é o único verdadeiro autor e a única verdadeira fonte; nós somos tão-somente os verdadeiros agentes. Somos, em diferentes aspectos, totalmente passivos e totalmente ativos.”.
Assim, se a graça de Deus está operando em nosso favor nós não devemos sentar e cruzar os braços, como quem não tem nada mais para fazer.
Ao contrário é nosso dever nos apressarmos em agirmos e nos esforçarmos muito em oração e em todos os deveres que Ele nos tem ordenado, para que haja uma justa cooperação entre o poder que Ele libera para nós, e o trabalho que estivermos fazendo para Ele.
Na primeira batalha foi ordenado que Davi se lançasse num combate frontal, e na segunda foi ordenado que aguardasse por um sinal para que atacasse os seus inimigos.
Deus pode assim traçar várias estratégias de luta para colocar à prova a nossa dependência dEle e obediência à Sua vontade.
E importa que o consultemos em todas as coisas, especialmente naquelas relativas às lutas que temos que empreender contra os poderes das trevas na realização da Sua obra. Este é o modo de sermos bem sucedidos, por contarmos com a Sua ajuda e capacitação.
Para a obra geral da Igreja já se ouviu o som da marcha sobre a copa das amoreiras quando o Espírito Santo foi derramado no dia de Pentecoste, quando os apóstolos ouviram um som vindo do céu como de um vento impetuoso (At 2.2) que era um sinal para eles do derramamento do Espírito Santo para revestir-lhes de poder para a obra que lhes havia sido designada.
E no sentido particular para as necessidades de cada dia, deveríamos nos colocar em ação somente depois de percebermos que foi liberada a operação do Espírito Santo, através dos diversos sinais da Sua santa presença, que são manifestados a nós, quando nos colocamos na disposição correta de espírito daqueles que buscam de fato a Deus, tal como Davi fizera antes de entrar em combate contra os filisteus.  
Deus deve ser consultado para tudo, e algumas vezes Ele nos ordenará que aguardemos o som de marcha sobre a copa das amoreiras antes que comecemos a agir.



“1 Então todas as tribos de Israel vieram a Davi em Hebrom e disseram: Eis-nos aqui, teus ossos e tua carne!
2 Além disso, outrora, quando Saul ainda reinava sobre nós, eras tu o que saías e entravas com Israel; e também o Senhor te disse: Tu apascentarás o meu povo de Israel, e tu serás chefe sobre Israel.
3 Assim, pois, todos os anciãos de Israel vieram ter com o rei em Hebrom; e o rei Davi fez aliança com eles em Hebrom, perante o Senhor; e ungiram a Davi rei sobre Israel.
4 Trinta anos tinha Davi quando começou a reinar, e reinou quarenta anos.
5 Em Hebrom reinou sete anos e seis meses sobre Judá, e em Jerusalém reinou trinta e três anos sobre todo o Israel e Judá.
6 Depois partiu o rei com os seus homens para Jerusalém, contra os jebuseus, que habitavam naquela terra, os quais disseram a Davi: Não entrarás aqui; os cegos e os coxos te repelirão; querendo dizer: Davi de maneira alguma entrará aqui.
7 Todavia Davi tomou a fortaleza de Sião; esta é a cidade de Davi.
8 Ora, Davi disse naquele dia: Todo o que ferir os jebuseus, suba ao canal, e fira a esses coxos e cegos, a quem a alma de Davi aborrece. Por isso se diz: Nem cego nem, coxo entrara na casa.
9 Assim habitou Davi na fortaleza, e chamou-a cidade de Davi; e foi levantando edifícios em redor, desde Milo para dentro.
10 Davi ia-se engrandecendo cada vez mais, porque o Senhor Deus dos exércitos era com ele.
11 Hirão, rei de Tiro, enviou mensageiros a Davi, e madeira de cedro, e carpinteiros e pedreiros, que edificaram para Davi uma casa.
12 Entendeu, pois, Davi que o Senhor o confirmara rei sobre Israel, e que exaltara o reino dele por amor do seu povo Israel.
13 Davi tomou ainda para si concubinas e mulheres de Jerusalém, depois que viera de Hebrom; e nasceram a Davi mais filhos e filhas.
14 São estes os nomes dos que lhe nasceram em Jerusalém: Samua, Sobabe, Natã, Salomão,
15 Ibar, Elisua, Nefegue, Jafia,
16 Elisama, e Eliadá e Elifelete.
17 Quando os filisteus ouviram que Davi fora ungido rei sobre Israel, subiram todos em busca dele. Ouvindo isto, Davi desceu à fortaleza.
18 Os filisteus vieram, e se estenderam pelo vale de Refaim.
19 Pelo que Davi consultou ao Senhor, dizendo: Subirei contra os filisteus? entregar-mos-ás nas mãos? Respondeu o Senhor a Davi: Sobe, pois eu entregarei os filisteus nas tuas mãos.
20 Então foi Davi a Baal-Perazim, e ali os derrotou; e disse: O Senhor rompeu os meus inimigos diante de mim, como as águas rompem barreiras. Por isso chamou o nome daquele lugar Baal-Perazim.
21 Os filisteus deixaram lá os seus ídolos, e Davi e os seus homens os levaram.
22 Tornaram ainda os filisteus a subir, e se espalharam pelo vale de Refaim.
23 E Davi consultou ao Senhor, que respondeu: Não subirás; mas rodeia-os por detrás, e virás sobre eles por defronte das amoreiras.
24 E há de ser que, ouvindo tu o ruído de marcha pelas copas das amoreiras, então te apressarás, porque é o Senhor que sai diante de ti, a ferir o arraial dos filisteus.
25 Fez, pois, Davi como o Senhor lhe havia ordenado; e feriu os filisteus desde Geba, até chegar a Gezer.” (II Sm 5.1-25).


II Samuel 6

A Honra Devida ao Senhor

O décimo terceiro capítulo de I Crônicas é paralelo aos versos 1 a 11 deste sexto capítulo de II Samuel, que estaremos comentando.
A arca havia ficado em Quiriate-Jearim desde o seu retorno do cativeiro entre os filisteus (I Sm 7.1,2).
A cidade de Baalim, mencionada no verso 2 é Quiriate-Jearim, como se vê no texto paralelo de I Crônicas de 13.6.
Para empreender a remoção da arca de Quiriate-Jearim para Jerusalém, Davi reuniu uma comitiva de 30.000 pessoas da nobreza de Israel, de modo a produzir em todos os israelitas a convicção da importância e da deferência que era devida à arca, em face da solene reunião de tantos líderes escolhidos, que estariam acompanhando a sua transferência para Jerusalém.      
E tal era a envergadura do cortejo que a forma singela de se transportar a arca pelos seus varais, pelos levitas, foi desprezada, e se mandou construir um carro novo de bois para efetuar o seu transporte.
Havia certamente da parte de Deus a intenção de transmitir um ensino didático na forma de se transportar a arca, porque o transporte pelos varais impedia que a arca propriamente dita fosse tocada por mãos humanas, ensinando-se assim a reverência e respeito que são devidos ao Senhor, e que Ele não pode ser conduzido pelos homens, tanto que o ato de se tocar na arca, seria punido com a morte.
Talvez tenha sido este um dos motivos de não ter havido anteriormente um interesse em se remover a arca de Quiriate-Jearim, em razão do temor das mortes que poderia causar um transporte indevido de objeto tão sagrado.
E ao que tudo indica Davi talvez tenha intentado se prevenir destes juízos divinos, por meio da grandiosa solenidade que ele planejou juntamente com os líderes de Israel para trazê-la a Jerusalém.
Cânticos de louvor eram entoados com acompanhamento de toda sorte de instrumentos musicais, e havia grandes manifestações de alegria, mas nada disso foi capaz de impedir que Deus matasse Uzá, pela sua falta de reverência, quando ele tocou a arca quando os bois que a transportavam tropeçaram (v. 6,7).
Deus nunca prestigiará a grandiosidade das solenidades que realizemos para cultuá-lo, pela suspensão dos seus juízos determinados sobre tudo o que tem definido como transgressão da Sua vontade.
Ele manterá o que tem prometido fazer e cumprirá tudo o que a Sua boca tem proferido, independentemente do fato se a Sua atuação poderá ou não frustrar as nossas expectativas, tal como Ele sabia que sucederia com Davi, e com todo o cortejo que o acompanhava, quando a Sua ira se acendeu contra Uzá, e produziu a cessação de toda a atmosfera festiva da ocasião.
Ainda que toda aquela alegria pública estivesse sendo manifestada na presença de Deus, de forma que não havia o risco de que  se transformasse numa alegria carnal e sensual, como costuma ocorrer com toda alegria pública, que não é manifestada na Sua presença, Ele não deixou, nem mesmo por isso, de castigar a irreverência de Uzá.
E nem mesmo levou em conta o fato de ser ele um levita, tal como o seu irmão Aiô, e nem ainda o de a arca ter ficado na casa deles durante a sua permanência em Quiriate-Jearim, ou seja, na casa de Abinadabe, que era pai de Aiô e Uzá.
Uzá tinha sido traído pela sua familiaridade com a arca, julgando que possuía direitos sobre ela, que não eram permitidos aos demais.
Ele pode ter desejado manifestar publicamente que tinha um certo privilégio em relação àquele objeto sagrado, colocando-se ao lado dela, quando estava sendo transportada pelos carros de bois, enquanto seu irmão Aiô ia adiante deles.
Foi talvez por isso que não teve qualquer constrangimento em estender sua mão para segurar a arca quando os bois tropeçaram, sendo o seu gesto considerado por Deus como uma irreverência, que despertou a Sua ira, conforme é dito diretamente na Bíblia.
Note que não se diz que a arca estava caindo quando ele a segurou, e poderoso é o Senhor para impedir que ela caísse.
Aquele gesto irreverente à vista de todos os líderes e de muitos do povo de Israel, não passaria impune, e o Senhor vindicou a Sua santidade em Uzá, e todos temeram e tremeram, inclusive o próprio Davi.
Ele não somente se desgostou (v.8), como também temeu ao Senhor naquele dia (v.9) a ponto de desistir de trazer a arca para junto de si em Jerusalém (v.10), e providenciou para que ela ficasse na casa de Obede-Edom, que ficava nas cercanias do lugar onde ocorreu a morte de Uzá.
Ele deve ter cogitado que Uzá não era mais pecador do que ele, para que Deus o matasse daquele modo.
Ele temeu que Deus o matasse da mesma maneira. Ele temeu que Deus poderia matá-lo tal como fizera com Uzá.
E a arca permaneceu três meses na casa de Obede-Edom, mas nenhum mal lhe fizera, ao contrário, tanto ele quanto a sua casa foram abençoados pelo Senhor (v. 11).
A mesma mão que castigou a presunção de Uzá abençoou a coragem humilde de Obede-Edom, e se a arca foi cheiro de morte para a morte para o primeiro, ela foi aroma de vida para a vida, para o segundo, tal como Cristo é em relação a toda a humanidade.
Cristo é o mesmo, mas Ele é tanto motivo de ruína para os que se perdem, quanto é de bênção para os que se salvam.
Quando Davi soube que Obede-Edom e a sua casa haviam sido abençoados por Deus (v. 12), ele se dispôs novamente a trazer a arca para Jerusalém, porque se a presença da arca havia abençoado sua casa, todo Israel poderia ser abençoado por ela. E o fato de Obede-Edom ter sido abençoado significava que a ira do Senhor havia cessado.
Em I Crôn 15.1-15; 25-28, nós encontramos informações adicionais ao texto de II Sm 6.12-23, que descreve a remoção da arca da casa de Obede-Edom para Jerusalém.
Desta vez Davi reconheceu que havia errado em não transportar a arca segundo o que estava prescrito na Lei, e não somente separou os levitas para isto, como também estes se santificaram antes, e quando a arca começou a ser transportada pelos varais, foram oferecidos sacrifícios de bois e carneiros cevados (v. 13), provavelmente como forma de reparação dos erros cometidos anteriormente.
E holocaustos e ofertas pacíficas foram trazidos quando a arca foi colocada na tenda que havia sido preparada para ela (v. 17,18).
Estas ofertas simbolizavam a consagração, a comunhão e a gratidão por Deus ter-se mostrado propício a eles.
Tal era a alegria de Davi que ele dançava com todas as suas forças diante do Senhor, e se despojou dos seus trajes reais, para se cingir de uma estola sacerdotal de linho v. 14), como símbolo de sua consagração ao serviço de Deus e de sua inteira devoção a Ele. Assim, ele acompanhou o cortejo não como um rei, mas como um simples servo de Deus, que é o verdadeiro e eterno rei de Israel.
Era de tal ordem a humildade, simplicidade e alegria com que Davi entrou na cidade de Jerusalém, que sua mulher Mical, contemplando o que ele fazia, através da janela do palácio, desprezou-o em seu coração (v. 16).          
Mas mesmo que Davi soubesse disto, certamente não se intimidaria e continuaria com sua alegria, prestando as homenagens públicas, que entendia serem devidas por ele ao Senhor, por todo o bem que estava fazendo a ele e a todo o povo de Israel.
Foi por este motivo que ele pretendeu que todo o povo que acompanhara o transporte da arca, participasse das ofertas pacíficas que foram apresentadas a Deus, e por isso ele abençoou o povo em nome do Senhor, e repartiu a todos eles um bolo de pão, um pedaço de carne e passas (v. 18,19).
Foi quando chegou em sua casa, depois de ter despedido o povo, para abençoar os seus, que Mical veio ao seu encontro, repreendendo-o com as seguintes palavras: “Que bela figura fez o rei de Israel, descobrindo-se hoje aos olhos das servas de seus servos, como sem pejo se descobre um vadio qualquer.” (v. 20).
Foi o orgulho de Mical que a levou a agir de tal maneira. Ela pensava que Davi havia se rebaixado muito diante dos olhos das servas dos seus oficiais, nivelando-se a elas, e isto faria com que elas não o respeitassem mais e não lhe dessem a devida honra, uma vez que, segundo ela, Davi não havia respeitado a sua elevada posição de rei diante deles.
A devoção religiosa daqueles que são sinceros diante de Deus sempre soa mal aos ouvidos e fere os olhos daqueles que não Lhe são devotados.
Este era o problema com Mical. Ela não conhecia a alegria de quem derrama a sua alma na presença do Senhor.
Mas Davi defendeu a honra de Deus quando justificou o seu comportamento com as seguintes palavras:
  “Perante o Senhor, que escolheu a mim de preferência a teu pai e a toda a sua casa, estabelecendo-me por chefe sobre o povo do Senhor, sobre Israel, sim, foi perante o Senhor que dancei; e perante ele ainda hei de dançar. Também ainda mais do que isso me envilecerei, e me humilharei aos meus olhos; mas das servas, de quem falaste, delas serei honrado.”.
O teor destas palavras indica que não foi dos seus servos que recebeu a honra de ser escolhido rei sobre Israel, mas foi do próprio Deus que a recebeu.
Se Mical havia repreendido Davi, pensando que foram seu pai e sua casa que emprestaram a verdadeira dignidade e honra à realeza, Davi lhe fez recordar que Saul e toda a sua casa haviam sido rejeitados por Deus para não reinarem sobre Israel, e que lhe havia escolhido para ser o rei do Seu povo.
Como poderia então ser desonrado pelas servas dos seus servos por ter dado a honra devida a Deus, que o pai de Mical, Saul, negou a Ele durante toda a sua vida?
Como Deus desprezaria aqueles que não O desprezam?
Como permitiria que não fossem honrados aqueles que O estavam honrando?
Se alguma serva de Davi não lhe estivesse honrando tal como Mical, pelo fato dele estar se alegrando na presença de Deus, certamente estaria fazendo isto por não estar honrando não a Davi, mas o próprio Deus, que inundou o coração dele com tal alegria, que foi levado pelo Espírito Santo a dançar com todas as suas forças na presença do Senhor, e ser cheio da Sua graça, que o levou a abençoar não somente todo o povo, mas a sua própria casa.
Como Mical se recusou a dar honra ao Senhor, e a Sua bênção através de Davi, quando as suas próprias servas O estavam honrando, ela foi impedida de gerar filhos a Davi por toda a sua vida, como uma marca do desagrado de Deus sobre o comportamento dela.
Quem não honraria Davi seria ela mesma como não lhe havia honrado em sua alegria, antes lhe recriminou por isto. Ela não lhe daria também a honra de ser pai, porque nisto fora impedida pelo próprio Deus, para que soubesse que estava no poder dEle e não no das servas de Davi honrá-lo como rei.
Assim como Ele havia engrandecido a Moisés e a Josué diante de todo o Israel, Ele fez o mesmo com Davi, e não seriam suas servas incentivadas por um espírito orgulhoso de uma Mical, que impediriam a Sua poderosa mão de fazê-lo.



“1 Tornou Davi a ajuntar todos os escolhidos de Israel, em número de trinta mil.
2 Depois levantou-se Davi, e partiu para Baal-Judá com todo o povo que tinha consigo, para trazerem dali para cima a arca de Deus, a qual é chamada pelo Nome, o nome do Senhor dos exércitos, que se assenta sobre os querubins.
3 Puseram a arca de Deus em um carro novo, e a levaram da casa de Abinadabe, que estava sobre o outeiro; e Uzá e Aiô, filhos de Abinadabe, guiavam o carro novo.
4 Foram, pois, levando-o da casa de Abinadabe, que estava sobre o outeiro, com a arca de Deus; e Aiô ia adiante da arca.
5 E Davi, e toda a casa de Israel, tocavam perante o Senhor, com toda sorte de instrumentos de pau de faia, como também com harpas, saltérios, tamboris, pandeiros e címbalos.
6 Quando chegaram à eira de Nacom, Uzá estendeu a mão à arca de Deus, e pegou nela, porque os bois tropeçaram.
7 Então a ira do Senhor se acendeu contra Uzá, e Deus o feriu ali; e Uzá morreu ali junto à arca de Deus.
8 E Davi se contristou, porque o Senhor abrira rotura em Uzá; e passou-se a chamar àquele lugar, Pérez-Uzá, até o dia de hoje.
9 Davi, pois, teve medo do Senhor naquele dia, e disse: Como virá a mim a arca do Senhor?
10 E não quis levar a arca do Senhor para a cidade de Davi; mas fê-la entrar na casa de Obede-Edom, o gitita.
11 E ficou a arca do Senhor três meses na casa de Obede-Edom, o gitita, e o Senhor o abençoou e a toda a sua casa.
12 Então informaram a Davi, dizendo: O Senhor abençoou a casa de Obede-Edom, e tudo quanto é dele, por causa da arca de Deus. Foi, pois, Davi, e com alegria fez subir a arca de Deus, da casa de Obede-Edom para a cidade de Davi.
13 Quando os que levavam a arca do Senhor tinham dado seis passos, ele sacrificou um boi e um animal cevado.
14 E Davi dançava com todas as suas forças diante do Senhor; e estava Davi cingido dum éfode de linho.
15 Assim Davi e toda a casa de Israel subiam, trazendo a arca do Senhor com júbilo e ao som de trombetas.
16 Quando entrava a arca do Senhor na cidade de Davi, Mical, filha de Saul, estava olhando pela janela; e, vendo ao rei Davi saltando e dançando diante do Senhor, o desprezou no seu coração.
17 Introduziram, pois, a arca do Senhor, e a puseram no seu lugar, no meio da tenda que Davi lhe armara; e Davi ofereceu holocaustos e ofertas pacíficas perante o Senhor.
18 Quando Davi acabou de oferecer os holocaustos e ofertas pacíficas, abençoou o povo em nome do Senhor dos exércitos.
19 Depois repartiu a todo o povo, a toda a multidão de Israel, tanto a homens como a mulheres, a cada um, um bolo de pão, um bom pedaço de carne e um bolo de passas. Em seguida todo o povo se retirou, cada um para sua casa.
20 Então Davi voltou para abençoar a sua casa; e Mical, filha de Saul, saiu a encontrar-se com Davi, e disse: Quão honrado foi o rei de Israel, descobrindo-se hoje aos olhos das servas de seus servos, como sem pejo se descobre um indivíduo qualquer.
21 Disse, porém, Davi a Mical: Perante o Senhor, que escolheu a mim de preferência a teu pai e a toda a sua casa, estabelecendo-me por chefe sobre o povo do Senhor, sobre Israel, sim, foi perante o Senhor que dancei; e perante ele ainda hei de dançar
22 Também ainda mais do que isso me envilecerei, e me humilharei aos meus olhos; mas das servas, de quem falaste, delas serei honrado.


23 E Mical, filha de Saul não teve filhos, até o dia de sua morte.” (II Sm 6.1-23).


II Samuel 7

A Aliança da Graça

Nós vemos no capítulo sétimo de 2 Samuel, que depois de longas e sucessivas guerras com as nações inimigas de Israel, e estando subjugados os povos inimigos dos israelitas, principalmente os filisteus, Davi estava enfim desfrutando em sua vida de um período da paz que ele tanto amava (Sl 120.7).
Em sua meditação sobre a pessoa de Deus ele se sentiu constrangido por estar residindo no palácio suntuoso que Hirão, rei de Tiro, construiu para ele, enquanto a arca ainda permanecia na tenda que ele havia preparado para ela em Jerusalém.
Davi estava descansado de seus inimigos em sua casa, mas não achou descanso em sua alma porque lhe pesava esta preocupação em edificar um templo para o Senhor, e ele compartilha o peso de sua preocupação com o  profeta Natã, e este lhe encorajou a fazer tudo quanto estava no seu coração, porque o Senhor era com ele (v. 2,3).
Porém na noite daquele mesmo dia, Deus se manifestou a Natã dizendo-lhe que Davi não lhe edificaria nenhum templo (I Crôn 17.4), apesar de reconhecer que havia feito bem em ter-se preocupado em honrar o seu Deus, ao pensar em construir um templo para Ele (I Rs 8.18).
Natã havia portanto, incentivado Davi a construir o templo, lhe falando como um amigo, mas não da parte de Deus.
E estava enganado neste particular quanto à vontade do Senhor para Davi, que teve que ser-lhe revelada por Deus, pois Davi havia sido separado para estender e consolidar as fronteiras de Israel, mas não para gastar a maior parte do  tempo do seu reinado na construção de um templo, que já estava assentado nos desígnios de Deus como sendo algo para ser levado a efeito por seu filho Salomão, e é por isso que ele foi citado na mesma palavra que o Senhor havia dado a Nata, para ser dita a Davi.
Além disso, Deus não havia dado nenhuma autorização ou fizera qualquer pedido, desde a saída de Israel do Egito, até então, para que fosse construído um templo, e não cabia portanto a Davi ou a qualquer outro, tomar uma iniciativa em relação a algo que o Senhor não havia ordenado.
Se Davi não estava confortado em saber que a arca permanecia habitando em tendas, Deus não estava nem um pouco desconfortável, porque qual é a habitação, por mais suntuosa que seja, que os homens possam edificar para o Senhor, que possa ser digna e estar à altura da Sua Majestade?
Se o próprio céu é obra das mãos dEle, tudo o que o homem possa edificar neste mundo com ouro, prata, pedras e madeiras preciosas e nobres, será mais do que nada para Aquele que não habita em moradas fabricadas por homens, pois nem o céu dos céus pode contê-lo (II Crôn 2.6).
Mas Deus mandou dizer a Davi que o templo que ele intentava erigir seria edificado pelo seu filho (v. 13), e esta profecia se aplica tanto a Salomão, quanto a Cristo, que é o descendente de Davi que está edificando a Igreja, para ser templo para a habitação de Deus no Espírito.
Deus não pode habitar naquilo que o homem edifica, mas criou o próprio homem para ser lugar da Sua habitação.
E é dito que aquele que edificaria o templo seria filho de Deus (isto se aplica a Salomão e a Jesus), e a parte da profecia que afirma que se ele viesse a transgredir, seria castigado por Ele, mas não retiraria dele a Sua misericórdia como fizera com Saul (v. 14,15) se aplica óbvia e exclusivamente a Salomão.
Isto fala da segurança da promessa feita de que o trono de Davi seria firmado, ainda que Salomão, seu filho, viesse a falhar, bem como os seus descendentes, porque o cetro permaneceria na casa de Davi, e seria firmado para sempre em Cristo, que é da sua casa.
A casa de Saul foi rejeitada por Deus e não foi confirmada.
Mas a Davi, o Senhor estava prometendo que a sua casa permaneceria no trono para sempre (v. 16).
Aqui está pois referido o caráter da aliança da graça, que é feita para aqueles que participarão do reino de Cristo pela fé nEle.
Esta promessa de que serão firmados no reino, ainda que venham a transgredir, é garantida pelo próprio Deus conforme revelou a Davi através do profeta Natã.
Esta é uma aliança para sempre que o Senhor jamais revogará, porque prometeu não remover a Sua misericórdia daqueles que fazem parte da casa de Davi.
Não da casa terrena, pois esta promessa não alcançou Absalão e a outros que eram da sua casa, mas a casa espiritual, daqueles que tivessem a mesma fé dele e que fossem eleitos por Deus para a salvação.
Isto não é maravilhoso?
E temos isto confirmado nas palavras dos profetas, dos apóstolos, e do próprio Cristo, como por exemplo em Is 55.3; Jer 33.21,22; Ez 34.23,24; Zac 12.7,8; At 13.34; 15.16; Apo 3.7.
Com a ida de Israel para o cativeiro, o tabernáculo (a casa) de Davi ficou caída (Amós 9.11), porque foi interrompida a sucessão de reis em Judá, da sua descendência, mas quando Cristo estiver reinando, o tabernáculo de Davi estará plenamente restaurado, e a promessa que Deus lhe fez estará vigorando para sempre em toda a sua plenitude.
Diante da grandiosidade da promessa que Deus lhe fizera quanto à casa que edificaria para ele, Davi se retirou da presença de Natã e foi adorar e agradecer ao Senhor diante da tenda onde se encontrava a arca (v. 18 a 29).
É importante destacar que Deus disse que edificaria tal casa a Davi para o bem de seu povo Israel (v. 8 a 11), e é com o mesmo propósito que Cristo foi exaltado com um nome que é sobre todo o nome, a saber, para dar descanso para o Seu povo.





“1 Ora, estando o rei Davi em sua casa e tendo-lhe dado o Senhor descanso de todos os seus inimigos em redor,
2 disse ele ao profeta Natã: Eis que eu moro numa casa de cedro, enquanto que a arca de Deus dentro de uma tenda.
3 Respondeu Natã ao rei: Vai e faze tudo quanto está no teu coração, porque o Senhor é contigo.
4 Mas naquela mesma noite a palavra do Senhor veio a Natã, dizendo:
5 Vai, e dize a meu servo Davi: Assim diz o Senhor: Edificar-me-ás tu uma casa para eu nela habitar?
6 Porque em casa nenhuma habitei, desde o dia em que fiz subir do Egito os filhos de Israel até o dia de hoje, mas tenho andado em tenda e em tabernáculo.
7 E em todo lugar em que tenho andado com todos os filhos de Israel, falei porventura, alguma palavra a qualquer das suas tribos a que mandei apascentar o meu povo de Israel, dizendo: por que não me edificais uma casa de cedro?
8 Agora, pois, assim dirás ao meu servo Davi: Assim diz o Senhor dos exércitos: Eu te tomei da malhada, de detrás das ovelhas, para que fosses príncipe sobre o meu povo, sobre Israel;
9 e fui contigo, por onde quer que foste, e destruí a todos os teus inimigos diante de ti; e te farei um grande nome, como o nome dos grandes que há na terra.
10 Também designarei lugar para o meu povo, para Israel, e o plantarei ali, para que ele habite no seu lugar, e não mais seja perturbado, e nunca mais os filhos da iniquidade o aflijam, como dantes,
11 e como desde o dia em que ordenei que houvesse juízes sobre o meu povo Israel. A ti, porém, darei descanso de todos os teus inimigos. Também o Senhor te declara que ele te fará casa.
12 Quando teus dias forem completos, e vieres a dormir com teus pais, então farei levantar depois de ti um dentre a tua descendência, que sair das tuas entranhas, e estabelecerei o seu reino.
13 Este edificará uma casa ao meu nome, e eu estabelecerei para sempre o trono do seu reino.
14 Eu lhe serei pai, e ele me será filho. E, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos de homens;
15 mas não retirarei dele a minha benignidade como a retirei de Saul, a quem tirei de diante de ti.
16 A tua casa, porém, e o teu reino serão firmados para sempre diante de ti; teu trono será estabelecido para sempre.
17 Conforme todas estas palavras, e conforme toda esta visão, assim falou Natã a Davi.
18 Então entrou o rei Davi, e sentou-se perante o Senhor, e disse: Quem sou eu, Senhor Jeová, e que é a minha casa, para me teres trazido até aqui?
19 E isso ainda foi pouco aos teus olhos, Senhor Jeová, senão que também falaste da casa do teu servo para tempos distantes; e me tens mostrado gerações futuras, ó Senhor Jeová?
20 Que mais te poderá dizer Davi. pois tu conheces bem o teu servo, ó Senhor Jeová.
21 Por causa da tua palavra, e segundo o teu coração, fizeste toda esta grandeza, revelando-a ao teu servo.
22 Portanto és grandioso, ó Senhor Jeová, porque ninguém há semelhante a ti, e não há Deus senão tu só, segundo tudo o que temos ouvido com os nossos ouvidos.
23 Que outra nação na terra é semelhante a teu povo Israel, a quem tu, ó Deus, foste resgatar para te ser povo, para te fazeres um nome, e para fazeres a seu favor estas grandes e terríveis coisas para a tua terra, diante do teu povo, que tu resgataste para ti do Egito, desterrando nações e seus deuses?
24 Assim estabeleceste o teu povo Israel por teu povo para sempre, e tu, Senhor, te fizeste o seu Deus.
25 Agora, pois, ó Senhor Jeová, confirma para sempre a palavra que falaste acerca do teu servo e acerca da sua casa, e faze como tens falado,
26 para que seja engrandecido o teu nome para sempre, e se diga: O Senhor dos exércitos é Deus sobre Israel; e a casa do teu servo será estabelecida diante de ti.
27 Pois tu, Senhor dos exércitos, Deus de Israel, fizeste uma revelação ao teu servo, dizendo: Edificar-te-ei uma casa. Por isso o teu servo se animou a fazer-te esta oração.
28 Agora, pois, Senhor Jeová, tu és Deus, e as tuas palavras são verdade, e tens prometido a teu servo este bem.
29 Sê, pois, agora servido de abençoar a casa do teu servo, para que subsista para sempre diante de ti; pois tu, ó Senhor Jeová, o disseste; e com a tua bênção a casa do teu servo será, abençoada para sempre.” (II Sm 7.1-29).


II Samuel 8

A Glória Dada por Deus ao Reino de Davi

O capítulo oitavo de 2 Samuel, cujo texto paralelo se encontra em I Crôn 18, dá conta das vitórias significativas que Davi logrou sobre os exércitos dos filisteus (v.1), moabitas (v.2) e sobre os siros de Zobá e de Damasco (v. 3 a 8), além de ter feito os edomitas tributários de Israel (v. 14).
As conquistas citadas neste capítulo são celebradas por Davi no Salmo 60.
A metrópole dos filisteus referida no verso 1 é a cidade de Gate, que é nomeada no texto paralelo de I Crôn 18.1.
É dito que Davi tomou as rédeas de Gate, significando isto que o território dos filisteus passou em seus dias, a ficar debaixo da administração de Israel.
Além dos edomitas, os moabitas foram feitos também tributários de Israel (v.2).
Davi dividiu o país deles em três partes, duas das quais ele destruiu pela espada, e a terceira parte que foi poupada, foi colocada debaixo de servidão, e lhe pagava tributos.
Com isto, deu-se cumprimento à profecia de Balaão relativa a Moabe (Nm 24.17).
Os moabitas permaneceram sob o jugo de servidão até depois da morte do rei Acabe (II Reis 3.4,5), quando eles se rebelaram e nunca mais foram reduzidos à servidão por Israel.
Quanto aos edomitas, foi cumprida a profecia de Isaque proferida a Esaú, e a Palavra dada pelo Senhor a Rebeca de que o seu filho mais velho Esaú, que é Edom, serviria o mais novo, Jacó,  que é Israel (Gên 25.23), e na profecia de Isaque, que Edom serviria a Jacó, é dito também que quando Edom se libertasse sacudiria o jugo da sua cerviz (Gên 27.40), e isto ocorreria somente nos dias do rei Jeorão (II Crôn 21.8), quando os edomitas voltaram a constituir o seu próprio rei.
De que forma maravilhosa Deus revela o seu completo conhecimento e poder sobre o curso de toda a história da humanidade.
Toda a história das nações já está prevista nos Seus conselhos eternos, de modo que o que foi conhecido pelo Senhor na Sua presciência sucederá inevitavelmente, e o homem nada mais é do que um mero refém da Sua vontade Soberana, e não é dado a ele traçar o seu próprio destino.
“O coração do homem propõe o seu caminho; mas o Senhor lhe dirige os passos.” (Pv 16.9).
“Os passos do homem são dirigidos pelo Senhor; como, pois, poderá o homem entender o seu caminho?” (Pv 20.24).
“Eu sei, ó Senhor, que não é do homem o seu caminho; nem é do homem que caminha o dirigir os seus passos.” (*Jer 10.23).
De fato Deus tudo governa e dirige e não há quem possa resistir à Sua vontade, naquilo que Ele tem determinado.
Por isso Ele é digno de ser honrado e exaltado, pois é o Rei Soberano do Universo, que tudo faz de acordo com o conselho da Sua santa vontade.
“nele, digo, no qual também fomos feitos herança, havendo sido predestinados conforme o propósito daquele que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade,” (Ef 1.11).
Era a mão do Senhor escrevendo a história de Israel, pelas mãos de Davi, e como veremos adiante foi Ele mesmo quem lhe proveu de homens valorosos e valentes, que debaixo do poder do seu Espírito Santo, tal como Sansão fora capacitado antes, ainda que estes homens tivessem sido capacitados, numa menor medida em relação a ele, puderam lograr vencer de maneira miraculosa todas as batalhas em que se empenharam pelo reino de Davi e de Israel, que na verdade era um empenho pelo reino de Deus.
Assim, Davi subiu aos siros do Eufrates, porque as terras que eles ocupavam ao norte da Palestina, haviam sido prometidas por Deus a Israel desde os dias de Abraão (Gên 15.18).
O quarto versículo, tanto de II Samuel, quanto de I Crônicas 18, enumeram os carros, cavaleiros e tropas a pé que Davi venceu do exército siro, quando Hadadezer tentou restabelecer os seus antigos domínios no Eufrates. O texto de II Samuel 8.4 relaciona 1.700 cavaleiros, 22.000 homens a pé, e que Davi jarretou todos os cavalos dos carros, exceto a 100 deles.
E o texto paralelo de I Crôn 18.4 relaciona 1.000 carros, 7.000 cavaleiros e 20.000 homens de pé, e que Davi jarretou todos os cavalos dos carros, exceto a 100 deles.
Comparando estes números, nós vemos que dos 1.700 cavaleiros citados em II Samuel, 1.000 deles ocupavam os 1.000 carros, aos quais é dado destaque e ênfase no texto de I Crônicas, e que cita também o número total de cavaleiros (7.000) que compunha aquele exército, que era ainda maior do que o número que consta em II Samuel (1.700).
Mas o grande destaque da revelação bíblica é que destes 1.000 carros que tinham provavelmente 1.000 cavalos para serem puxados respectivamente, 900 destes cavalos foram jarretados, isto é, eles foram inutilizados para a guerra, e Davi poupou apenas a 100 deles, e com isto estava cumprindo o preceito de Dt 17.16, não multiplicando cavalos para a guerra, de modo que se evidenciasse a sua inteira fé no Senhor dos exércitos nas batalhas que tinha que empreender, e não em carros e em cavalos (Sl 20.7; 33.16,17), de modo que toda a glória fosse tributada ao Senhor.
Desde a sua juventude ele havia testemunhado os grandes feitos de Deus em sua própria vida, quando matou um urso, um leão e o gigante Golias.
Agora, estava vendo os grandes livramentos que o Senhor vinha operando em favor de Israel, através dos seus valentes, de modo que um deles matou oitocentos filisteus em uma só batalha (23.8), e um outro defendeu uma parte do território de Israel lutando sozinho com os filisteus até vencê-los, e chegar à exaustão, e lutou de tal modo que a sua mão ficou apegada à espada (23.9, 10).
Eram milagres que Deus estava realizando através deles, e assim dando fiel cumprimento à Sua promessa de abençoar o Seu povo, quando este não andasse contrariamente à Sua vontade, pois um só deles estava fazendo com que muitos inimigos fugissem da sua presença.
“Cinco de vós perseguirão a um cento deles, e cem de vós perseguirão a dez mil; e os vossos inimigos cairão à espada diante de vós.” (Dt 26.8).
Era ou não era de fato algo para ser celebrado por Davi?
A sua fidelidade e a de Israel estavam fazendo com que as boas promessas do Senhor estivessem sendo cumpridas em relação ao Seu povo.
É por isso que nós o vemos celebrando com toda a sua alma os grandes feitos do Senhor por amor dele e de Israel.
Que coisa boa é viver em estrita obediência a Deus, pois nós veremos sinais e maravilhas, e ficaremos extasiados, com a manifestação da Sua glória e satisfeitos com o derramar abundante da Sua graça em nossos corações.
“Se vós permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes, e vos será feito.” (Jo 15.7).  
É coisa vã colocar a nossa esperança de segurança em qualquer aparato deste mundo.
Mas vai bem a todo aquele que põe a sua confiança inteiramente no Senhor. E isto deve ser feito em santidade de vida, porque não há outro modo pelo qual o Senhor possa se agradar de nós.
Até mesmo o socorro do homem é vão, quando Deus está lutando contra nós, tal como ocorreu com o rei de Zobá, que não pôde ser livrada de Davi, não somente com os seus carros e cavaleiros, como também pelo rei siro de Damasco, que veio em seu socorro, e que acabou perdendo 22.000 homens no campo de batalha, na luta contra os israelitas (v.5).
O segredo do sucesso de Davi é dito nos versos 6 e 14: “O Senhor dava vitórias a Davi por onde quer que ia.”.
Todo o ouro e prata que Davi tomava como despojo das nações conquistadas, bem como o que lhe era dado como presente em reconhecimento da sua grandeza, e descanso que Davi lhes dava dos seus inimigos, como fizera o rei de Hamate (v. 9,10), ele consagrava ao Senhor (v.11).
E toda esta riqueza que ajuntou foi destinada por ele para a construção do templo em Jerusalém, que viria a ser realizada por Salomão.
O grande amor e devoção que Davi tinha ao Senhor foi o que o moveu a isto.
Ele não desistiu da ideia de construir um templo, ainda que soubesse que isto lhe fora proibido por Deus.
Se não poderia erigir o templo, no entanto tomaria todas as providências necessárias para tal, tanto na reunião de materiais quanto na organização dos serviços de músicos, cantores, porteiros, sacerdotes e levitas, de modo que o desejo que havia se instalado no seu coração não viesse a cair no esquecimento depois da sua morte.
Com isto, deu provas de que não estava buscando a sua própria glória, como Júlio César ou Alexandre Magno, mas a glória do Senhor a quem ele servia.
Todo este engrandecimento do reino de Israel e todas as providências que vinham sendo tomadas por Davi em relação ao templo, demandou um maior cuidado com a administração, e não faltou também a ele este talento e cuidado, pois organizou a vida administrativa da nação conforme podemos ver nos versos 15 a 18.
É dito que ele administrava a justiça e a equidade a todo o seu povo (v. 15), e agira assim, porque o fizera debaixo do temor do Senhor, como ele mesmo declara nas últimas palavras que proferiu, quando estava próxima a sua morte (23.7).
Nós vemos em tudo que está relatado sobre a vida de Davi, nos dois livros de Samuel que ele era um administrador imparcial e até mesmo soube comandar e dirigir pessoas desqualificadas para a sociedade, antes mesmo de começar a reinar, como vimos na sábia direção que teve sobre aqueles seiscentos homens endividados e amargurados de espírito, que passaram a segui-lo quando fugiu de Saul.
Ele introduziu no seu conselho e admitiu no tribunal até mesmo pessoas que não lhe eram totalmente leais como era o caso de Joabe, que sempre foi o general de todo o seu exército (v. 16), e Aitofel, conselheiro do reino que o traiu com Absalão, e até mesmo a Abner ele admitira na sua administração depois de ter sido seu ferrenho opositor na causa de Is-Bosete, por sete longos anos.
Com isto, pode-se de fato dizer que ele administrava com justiça, pois não fazia segundo as suas conveniências e interesses pessoais, mas segundo os interesses soberanos do Senhor e do reino de Israel.
Era de fato um homem público sempre buscando o bem do Seu povo, não segundo o mundo, mas segundo a lei do Seu Deus.
Ele designou um cronista (Jeosafá) para registrar os fatos históricos relativos ao reino, e um escrivão (Seraías), que era o Secretário dos assuntos de Estado, dois sacerdotes principais (Zadoque e Aimeleque), que estavam debaixo do sumo-sacerdócio de Abiatar, e finalmente Benaia, que era o comandante da sua guarda pessoal.
É dito também que os filhos de Davi eram ministros de estado.



“1 Sucedeu depois disso que Davi derrotou os filisteus, e os sujeitou; e Davi tomou a metrópole das mãos dos filisteus.
2 Também derrotou os moabitas, e os mediu com cordel, fazendo-os deitar por terra; e mediu dois cordéis para os matar, e um cordel inteiro para os deixar com vida. Ficaram assim os moabitas por servos de Davi, pagando-lhe tributos.
3 Davi também derrotou a Hadadézer, filho de Reobe, rei de Zobá, quando este ia estabelecer o seu domínio sobre o rio Eufrates.
4 E tomou-lhe Davi mil e setecentos cavaleiros e vinte mil homens de infantaria; e Davi jarretou a todos os cavalos dos carros, reservando apenas cavalos para cem carros.
5 Os sírios de Damasco vieram socorrer a Hadadézer, rei de Zobá, mas Davi matou deles vinte e dois mil homens.
6 Então Davi pôs guarnições em Síria de Damasco, e os sírios ficaram por servos de Davi, pagando-lhe tributos. E o Senhor lhe dava a vitória por onde quer que ia.
7 E Davi tomou os escudos de ouro que os servos de Hadadézer usavam, e os trouxe para Jerusalém.
8 De Betá e de Berotai, cidades de Hadadézer, o rei Davi tomou grande quantidade de bronze.
9 Quando Toí, rei de Hamate, ouviu que Davi ferira todo o exército de Hadadézer,
10 mandou-lhe seu filho Jorão para saudá-lo, e para felicitá-lo por haver pelejado contra Hadadézer e o haver derrotado; pois Hadadézer de contínuo fazia guerra a Toí. E Jorão trouxe consigo vasos de prata de ouro e de bronze,
11 os quais o rei Davi consagrou ao Senhor, como já havia consagrado a prata e o ouro de todas as nações que sujeitara.
12 da Síria, de Moabe, dos amonitas, dos filisteus, de Amaleque e dos despojos de Hadadézer, filho de Reobe, rei de Zobá.
13 Assim Davi ganhou nome para si. E quando voltou, matou no Vale do Sal a dezoito mil edomitas.
14 E pôs guarnições em Edom; pô-las em todo o Edom, e todos os edomitas tornaram-se servos de Davi. E o Senhor lhe dava a vitória por onde quer que ia.
15 Reinou, pois, Davi sobre todo o Israel, e administrava a justiça e a equidade a todo o seu povo.
16 Joabe, filho de Zeruia, estava sobre o exército; Jeosafá, filho de Ailude, era cronista;
17 Zadoque, filho de Aitube, e Aimeleque, filho de Abiatar, eram sacerdotes; Seraías era escrivão;


18 Benaia, filho de Jeoiada, tinha o cargo dos quereteus e peleteus; e os filhos de Davi eram ministros de estado.” (II Sm 8.1-18).


II Samuel 9

Mefibosete

O capítulo nono de 2 Samuel relata a bondade de Davi manifestada ao filho de Jônatas, chamado Mefibosete, que era aleijado de ambos os pés (v. 3).
Is-Bosete, vem do hebraico Ish-Bosete, que significa homem de vergonha ou honra, e Mefibosete é também um nome composto de duas palavras, que significa desprovido de vergonha ou honra.
Era esta realmente a condição de Mefibosete até que Davi viesse a manifestar a sua bondade a ele.
Todos nós éramos mefibosetes diante de Deus, até que Ele manifestasse a Sua bondade para conosco em Cristo Jesus, livrando-nos da condição de vergonha e total falta de honra perante Ele, por causa dos nossos pecados.
Davi tinha jurado tanto a Saul, quanto a Jônatas, não fazer qualquer mal à descendência deles, mas deu um passo muito além, porque não somente usou de misericórdia para com os seus descendentes, como procurou fazer o bem a eles, no que dependeu dele e o quanto lhe foi possível.
Até ao próprio Is-Bosete, que se opusera a ele, foi objeto da sua misericórdia, porque não se determinou em matá-lo, mesmo depois da morte de Abner, e deu a ele um sepultamento honroso, depois de ter sido assassinado friamente por dois de seus servos, que trouxeram a sua cabeça a ele.
Davi mandou investigar se ainda restava alguém da casa de Saul para que usasse de bondade para com ele por amor a Jônatas.
Veja que ele não indagou se havia algum filho de Jônatas, mas se havia algum descendente de Saul, ao qual não tivera até então, a oportunidade de manifestar a sua bondade.
É bom que fixemos isto para aquilatarmos o quanto não deve ter-lhe doído a falsa acusação de Simei, quando fugia de Absalão, de que havia exterminado a casa de Saul.
Nós vemos que, muito ao contrário, ele estava se esforçando para fazer o bem a toda a casa daquele que fora o seu inimigo implacável.
Davi não se permitiu ser dominado por qualquer sentimento de vingança, e estava vencendo o mal com o bem, conforme se exige dos cristãos na justiça do evangelho.
Foi trazido à presença de Davi um servo da casa de Saul, chamado Ziba, que tinha quinze filhos e vinte servos (v. 2,10), e este informou ao rei, que ainda havia um filho de Jônatas, chamado Mefibosete, que estava residindo na casa de Maquir, em Lo-Debar, que ficava na Transjordânia (v.4), e Davi ordenou que ele fosse trazido de lá à sua presença.
Mefibosete tinha um filho ainda menino, nesta ocasião, que se chamava Mica (v.12).
Pelo nome deste filho, podemos concluir que Meribe-Baal é o nome dado a Mefibosete em I Crôn 8.34, e este nome lhe fazia justiça, porque significa contendedor de Baal, isto é, aquele que contende com Baal, pois Mefibosete era um homem justo, que tinha o temor do Senhor.
O neto de um rei e filho de um príncipe estava vivendo em completa obscuridade, totalmente afastado da honra que viveu até os cinco anos de idade, quando seu avô e seu pai morreram na batalha contra os filisteus, e ele, que não possuía qualquer deficiência física, adquiriu-a por ter caído do colo de sua ama, quando esta fugia apressadamente, por temor dos filisteus.
Como o cego de nascença ao qual Jesus se referiu dizendo que não o era por motivo de um juízo imposto por Deus a qualquer pecado específico cometido por ele ou por seus pais, de igual modo, Mefibosete não fora marcado pela tragédia, por motivo de um juízo de Deus sobre algum pecado de Jônatas, seu pai, ou dele próprio, mas para exibir nele toda a Sua bondade e misericórdia, quando a manifestou através de Davi, fazendo com que promovesse a honra que lhe era devida, na condição de ser um homem justo e filho de Jônatas, que também amava ao Senhor.
O argumento em prol de não ter sido ferido por nenhum juízo de Deus estava comprovado no fato de que o Senhor estava sendo misericordioso para com ele, tal como Jesus fora com o cego de nascença (Jo 9.1-3).
Assim como o cego foi visitado pela bondade e misericórdia de Deus, restaurando-lhe a visão, Mefibosete foi também visitado pela mesma misericórdia, que conduziu Davi a restaurar-lhe a antiga honra, uma vez que não somente recebeu as propriedades que pertenciam ao rei Saul, como também foi admitido à corte, comendo na presença do rei, juntamente com os seus filhos, como se fosse o seu próprio filho (v. 7,10, 11, 13).
Ele se sentou ao lado de Amnom, Absalão, Salomão e de todos os demais filhos de Davi, que eram príncipes e seus ministros.
Assim, se alguém estiver vivendo em condições desfavoráveis neste mundo de muitas aflições, por motivo de nenhum juízo específico de Deus imposto sobre os seus pecados, pode contar certamente com a bondade e misericórdia do Senhor, porque Ele permitiu que tais circunstâncias adversas fossem introduzidas na criação exatamente para manifestar a Sua graça, bondade, amor e misericórdia, especialmente àqueles que se humilham na Sua presença, tal como Mefibosete fizera quando chegou à presença de Davi, vindo da casa de Maquir em Ló-Debar, pois ele não somente se inclinou perante o rei, como lhe disse as seguintes palavras: “Eis aqui teu servo” (v.6), e quando Davi revelou a ele o bem que pretendia lhe fazer, ele disse: “Quem é teu servo, para teres olhado para um cão morto tal como eu?” (v. 8).
É certamente este tipo de humilhação prática e real, perante o Senhor, no meio da adversidade, que, move a misericórdia e bondade de Deus em relação a nós, pobres pecadores, assim como Jesus não pôde conter a Sua misericórdia diante do clamor do cego de Jericó que lhe disse: “Filho de Davi, tem misericórdia de mim.” (Mc 10.47).
Se de Davi podia se esperar compaixão, quanto mais de Jesus que é a fonte da misericórdia que havia em Davi.
Como Ziba tinha muitos filhos e servos, e como Mefibosete não podia trabalhar na administração de negócios em razão de uma possível invalidez ou inabilidade, produzidas pelo modo como encarou a sua deficiência, Ziba foi colocado por Davi como administrador da propriedade de Mefibosete, mas como este Ziba amava a riqueza, nós veremos adiante que ele usou de um estratagema maligno, para enganar Davi, e assim conseguiu transferir as propriedades de Mefibosete para a sua posse por ordem do próprio rei (16.1-4).



“1 Disse Davi: Resta ainda alguém da casa de Saul, para que eu use de benevolência para com ele por amor de Jônatas?
2 E havia um servo da casa de Saul, cujo nome era Ziba; e o chamaram à presença de Davi. perguntou-lhe o rei: Tu és Ziba? Respondeu ele: Teu servo!
3 Prosseguiu o rei: Não há ainda alguém da casa de Saul para que eu possa usar com ele da benevolência de Deus? Então disse Ziba ao rei: Ainda há um filho de Jônatas, aleijado dos pés.
4 Perguntou-lhe o rei: Onde está. Respondeu Ziba ao rei: Está em casa de Maquir, filho de Amiel, em Lo-Debar.
5 Então mandou o rei Davi, e o tomou da casa de Maquir, filho de Amiel, em Lo-Debar.
6 E Mefibosete, filho de Jônatas, filho de Saul, veio a Davi e, prostrando-se com o rosto em terra, lhe fez reverência. E disse Davi: Mefibosete! Respondeu ele: Eis aqui teu servo.
7 Então lhe disse Davi: Não temas, porque de certo usarei contigo de benevolência por amor de Jônatas, teu pai, e te restituirei todas as terras de Saul, teu pai; e tu sempre comerás à minha mesa.
8 Então Mefibosete lhe fez reverência, e disse: Que é o teu servo, para teres olhado para um cão morto tal como eu?
9 Então chamou Davi a Ziba, servo de Saul, e disse-lhe: Tudo o que pertencia a Saul, e a toda a sua casa, tenho dado ao filho de teu senhor.
10 Cultivar-lhe-ás, pois, a terra, tu e teus filhos, e teus servos; e recolherás os frutos, para que o filho de teu senhor tenha pão para comer; mas Mefibosete, filho de teu senhor, comerá sempre à minha mesa. Ora, tinha Ziba quinze filhos e vinte servos.
11 Respondeu Ziba ao rei: Conforme tudo quanto meu senhor, o rei, manda a seu servo, assim o fará ele. Disse o rei: Quanto a Mefibosete, ele comerá à minha mesa como um dos filhos do rei.
12 E tinha Mefibosete um filho pequeno, cujo nome era Mica. E todos quantos moravam em casa de Ziba eram servos de Mefibosete.
13 Morava, pois, Mefibosete em Jerusalém, porquanto sempre comia à mesa do rei. E era coxo de ambos os pés.” (II Sm 9.1-13).



II Samuel 10

Os Dias Áureos do Reinado de Davi

A vida de Davi pode ser dividida em dois períodos distintos, a saber: antes e depois de ter pecado com Bate-Seba.
Antes de ter cometido aquela transgressão nós o vemos ainda com aquilo que se pode chamar de vida abençoada por Deus em todos os sentidos.
Vitórias práticas tanto nos assuntos familiares, quanto nos relativos ao reino.
Não ouvimos falar sobre nenhuma desavença séria em família, e de nenhuma dificuldade que ameaçasse seriamente o reino, que não fosse dissolvida com o auxílio do Senhor.
Assim, o que vemos no décimo capítulo de 2 Samuel, que estaremos comentando, ainda faz parte do que podemos chamar do período em que Davi não teve a própria mão do Senhor agindo contra ele, em qualquer sentido.
Tal era a prosperidade que o Senhor lhe dera por amor do seu povo de Israel, que ele se dispôs até mesmo a consolar Hanum, novo rei dos amonitas, da morte de seu pai Naás, que no passado havia abrigado a família de Davi, quando ele fugia de Saul.
Foi por causa do rei do amonitas, ter-lhe dado boa acolhida no passado, que Davi enviou uma embaixada para consolar Hanum, ao mesmo tempo que prestava a honra que considerava devida a Naás, seu pai.
Entretanto, aquela bondade foi mal interpretada, como sendo um ato de espionagem, e como os amonitas pensavam que Davi desejava entrar em guerra contra eles, então se adiantaram em lhe dar motivo para isto, fazendo um declaração de guerra informal, desonrando a embaixada que lhes fora enviada, raspando as barbas e rasgando as vestes daqueles homens pela metade (v.4).
Deus permitiu que o bem de Davi fosse interpretado como mal, para trazer um bem e glória ainda maiores ao Seu povo, e ao reino de Israel, uma vez que as nações que estavam aliançadas aos sírios, e que os serviam, lhes abandonaram depois de terem os sírios sido derrotados por Davi, e elas passaram para o lado de Israel (v. 19).
Entretanto, isto não foi conseguido sem que antes houvesse grande luta, em batalhas sucessivas.
E temos por conseguinte uma grande ilustração das batalhas sucessivas que os cristãos empreendem contra os poderes das trevas, quando pretendem fazer o bem, e saindo-se vencedores nelas, não somente terão a sua própria paz, bem e glória aumentados, como receberão honra daqueles que libertaram das garras do Inimigo, a saber, aqueles que se convertem debaixo da pregação, oração e testemunho deles.
Os amonitas fizeram tal agravo a Davi porque estavam aliançados com os sírios e com outras nações, que eram antigos inimigos de Israel.
Eles assumiram os gastos daquela guerra pagando o soldo do exército de 20.000 homens dos sírios, 1.000 do rei de Maaca, e 12.000 de Tobe, totalizando 33.000 homens.
Estes atacariam Israel por um lado do campo de batalha, e os amonitas, por outro.
Por isso Joabe dividiu o exército de Israel em dois grandes grupamentos, tendo ficado à cabeça de um deles e colocando a Abisai, seu irmão, como líder do outro grupamento (v. 8 a 11).
E como Joabe prevaleceu sobre os sírios e sobre as forças que estavam coligadas a eles, bateram em retirada, e vendo isto, os amonitas também fugiram da luta contra as tropas que estavam sob o comando de Abisai, irmão de Joabe (v. 13,14).
Os sírios resolveram retornar ao campo de batalha por sua própria iniciativa, empregando agora uma força bélica maior, mas o próprio Davi subiu a pelejar contra eles com todo o exército de Israel, e foram mortos dentre os sírios, os homens de 700 carros e 40.000 cavaleiros, bem como o seu general  chamado Soboque (v.18).
Tal foi a derrota imposta pelos Senhor a eles que não ousaram por um bom tempo ameaçarem a paz de Israel.
E foi no descanso da guerra que Davi entraria na pior derrota de sua vida.
Foi quando estava confiando na força do seu próprio reino que Satanás pôde enfim derrotá-lo, não pelas mãos de um grande e poderoso exército inimigo, mas usando os encantos de uma mulher casada, como veremos no capítulo seguinte.  
As batalhas espirituais são empreendidas em várias frentes e de variadas formas e por isso nos é ordenado vigiar e orar em todo o tempo, para não cairmos nas tentações e astutas ciladas do diabo.




“1 Depois disto morreu o rei dos amonitas, e seu filho Hanum reinou em seu lugar.
2 Então disse Davi: usarei de benevolência para com Hanum, filho de Naás, como seu pai usou de benevolência para comigo. Davi, pois, enviou os seus servos para o consolar acerca de seu pai; e foram os servos de Davi à terra dos amonitas.
3 Então disseram os príncipes dos amonitas a seu senhor, Hanum: Pensas, porventura, que foi para honrar teu pai que Davi te enviou consoladores? Não te enviou antes os seus servos para reconhecerem esta cidade e para a espiarem, a fim de transtorná-la?
4 Pelo que Hanum tomou os servos de Davi, rapou-lhes metade da barba, cortou-lhes metade dos vestidos, até as nádegas, e os despediu.
5 Quando isso foi dito a Davi, enviou ele mensageiros a encontrá-los, porque aqueles homens estavam sobremaneira envergonhados; e mandou dizer-lhes: Deixai-vos estar em Jericó, até que vos torne a crescer a barba, e então voltai.
6 Vendo, pois, os amonitas que se haviam feito abomináveis para com Davi, enviaram e alugaram dos sírios de Bete-Reobe e dos sírios de Bete-Reobe e dos sírios de Sobá vinte mil homens de infantaria, e do rei de Maacá mil homens, e dos homens de Tobe doze mil.
7 O que ouvindo Davi, enviou contra eles a Joabe com todo o exército dos valentes.
8 E saíram os amonitas, e ordenaram a batalha a entrada da porta; mas os sírios de Zobá e de Reobe, e os homens de Tobe e de Maacá estavam à parte no campo.
9 Vendo, pois, Joabe que a batalha estava preparada contra ele pela frente e pela retaguarda, escolheu alguns homens dentre a flor do exército de Israel, e formou-os em linha contra os sírios;
10 e entregou o resto do povo a seu irmão Abisai, para que o formasse em linha contra os amonitas.
11 E disse-lhe: Se os sírios forem mais fortes do que eu, tu me virás em socorro; e se os amonitas forem mais fortes do que tu, eu irei em teu socorro.
12 Tem bom ânimo, e sejamos corajosos pelo nosso povo, e pelas cidades de nosso Deus; e faça o Senhor o que bem lhe parecer.
13 Então Joabe e o povo que estava com ele travaram a peleja contra os sírios; e estes fugiram diante dele.
14 E, vendo os amonitas que os sírios fugiam, também eles fugiram de diante de Abisai, e entraram na cidade. Então Joabe voltou dos amonitas e veio para Jerusalém.
15 Os sírios, vendo que tinham sido derrotados diante de Israel, trataram de refazer-se.
16 E Hadadézer mandou que viessem os sírios que estavam da outra banda do rio; e eles vieram a Helã, tendo à sua frente Sobaque, chefe do exército de Hadadézer.
17 Davi, informado disto, ajuntou todo o Israel e, passando o Jordão, foi a Helã; e os sírios se puseram em ordem contra Davi, e pelejaram contra ele.
18 Os sírios, porém, fugiram de diante de Israel; e Davi matou deles os homens de setecentos carros, e quarenta mil homens de cavalaria; e feriu a Sobaque, general do exército, de sorte que ele morreu ali.


19 Vendo, pois, todos os reis, servos de Hadadézer, que estavam derrotados diante de Israel, fizeram paz com Israel, e o serviram. E os sírios não ousaram mais socorrer aos amonitas.” (II Sm 10.1-19).


II Samuel 11

O Adultério de Davi com Bate-Seba

No 11º capítulo de 2 Samuel é descrito o pecado que Davi cometeu e que traz dores e desonra a um homem, mais do que qualquer outro pecado, e cujas manchas, que são deixadas por ele, não podem ser completamente apagadas tanto na mente de quem o praticou quando daqueles que o sofrem.
O perdão de Deus e dos homens pode ocorrer, tal como se deu com Davi, mas as consequências e sequelas deste mal não podem ser evitadas.
Águas paradas juntam sujeira, e a inatividade dá grande vantagem ao tentador, e foi deste modo, que Davi foi apanhado no laço do passarinheiro, quando estava dando folga a si mesmo no seu palácio.
É possível que ele tenha até dado naquele período, férias à sua devoção a Deus.
Um homem que esteja empenhado a serviço do Senhor, jamais poderá tirar férias de Deus.
Ainda que se separe de tudo o mais por algum tempo, jamais poderá tirar férias em relação a Deus, senão para prejuízo de sua própria alma, porque o Inimigo anda em derredor buscando a quem possa tragar.
Spurgeon sabia disto, e é testemunhado por sua própria esposa Susana, numa de suas biografias, que aonde quer que ele fosse, mesmo em passeio, jamais se descuidava da sua devoção ao Senhor, e era sempre acompanhado, em razão disso, de uma doce atmosfera da presença do Espírito Santo.
Se nos descuidamos na guarda pessoal, o Inimigo desferirá os seus golpes fatais e seremos atingidos, por não estarmos protegidos pela barreira intransponível do poder do Espírito Santo.
Não foi portanto, Bate-Seba, e nem o próprio diabo, os principais responsáveis na queda de Davi no pecado de adultério e em todos os demais pecados que ele praticou tentando encobrir o de adultério, mas ele próprio foi o principal responsável em não vigiar e em não domar o desejo pecaminoso, que jazia à porta do seu coração.
O pecado de adultério de Davi foi agravado porque ele não o praticara contra um inimigo ou contra um ímpio, mas contra um homem honrado e valoroso, que se encontrava em batalha contra os amonitas, defendendo o reino do próprio Davi.
Em II Sm 23.39 nós vemos que Urias era um dos bravos que compunham o grupo fechado dos trinta mais honrados dos valentes de Davi.
Nós podemos também inferir da parábola que foi dirigida a Davi por Natã, que ele abusou da posição elevada que Deus lhe dera para exercer uma influência coatora sobre uma das suas súditas, seduzindo-a para se deitar com ele.
Tendo Bate-Seba engravidado, mandou que tal notícia fosse dada ao rei (v.5) e isto trouxe um problema adicional a ele porque o seu marido estava fora em batalha.
Então, Davi pensou em forjar uma farsa e ordenou que Urias fosse trazido à sua presença sob o pretexto de lhe trazer notícias do campo.
E tendo feito isto despachou-o para a sua casa, esperando que ele se deitasse com sua esposa, e assim, do filho que Bate-Seba esperava seria dito que era de Urias, e não haveria como se comprovar a paternidade numa época em que nem se sonhava com testes de DNA.
Mas algo mais que infalível que teste de DNA revelaria a verdadeira paternidade, porque o Senhor tudo vê, e haveria de declarar a Davi tanto o seu pecado quanto o Seu desgosto e as consequências com as quais ele teria que arcar.
Se por obra da Providência naquela ocasião ou se exclusivamente em razão do próprio caráter virtuoso de Urias, ele não se dirigiu para a sua casa, como Davi esperava, sob a alegação de que a arca do Senhor estava numa tenda e os homens de guerra de Davi também estavam dormindo em tendas no campo de batalha, longe de suas esposas, e como ele poderia ter paz em sua consciência indo para a sua casa?
Davi não se deu por vencido, e convocando-o uma segunda vez, embebedou-o, e nem assim Urias voltou para sua casa para ter com sua esposa.
Então ele resolveu diante da constatação do caráter nobre daquele homem, que ele deveria morrer, e casando-se às pressas com a viúva, o adultério poderia ser acobertado.
Às vilezas anteriores, Davi ajuntou uma maior ainda, pois enviou uma carta a Joabe pelas próprias mãos de Urias, ordenando-lhe que o colocasse na pior frente de batalha e que fosse deixado sozinho para que morresse.
De tal forma estava cauterizada a consciência de Davi pelo seu pecado, que  mandou dizer a Joabe, depois que este lhe informou que Urias havia morrido, que não lamentasse pelo que fizera, porque afinal o risco de morrer está ao alcance de qualquer um que está empenhado na guerra.
Adultério, falsidade, assassinato, indiferença, crueldade, deslealdade, de quantos pecados Davi não poderia ser acusado neste caso?
E Deus levou tudo isto em consideração, e vindicaria a Sua justiça e santidade em Davi, conforme veremos nos capítulos subsequentes.
Davi pensava que tendo se casado com Bate- Seba, todas as coisas estariam por fim acomodadas, mas nós lemos no final deste capítulo as seguintes palavras:
“Porém isto que Davi fizera, foi mal aos olhos do Senhor.” (v. 27).
Não podemos portanto, usar o mau exemplo que Davi deixou neste pecado de adultério para tentar justificar os cristãos que adulteram sob o argumento que o próprio Davi adulterou, e que nem por isto deixou de governar Israel, e de ser ainda abençoado por Deus, e por Deus tê-lo perdoado e poupado, porque este é apenas um ângulo de uma questão que possui um outro ângulo que não é omitido nas Escrituras, a saber, que apesar de ter sido perdoado, Davi havia causado um grande mal e dado ocasião aos inimigos de Israel que o nome do Senhor fosse desprezado e blasfemado, e isto não ficaria sem a justa retribuição da parte dAquele que é Misericórdia e Amor, mas que também é Santo, Justo e Juiz.
Que nunca preguemos o perdão de Deus como uma forma de incentivo à negligência na fidelidade no matrimônio, pois é certo que Ele não deixará sem o devido castigo um pecado que fere não somente aquele que o pratica mas a muitas partes envolvidas, e que traz mancha e desonra a todo o corpo de Cristo. Isto nos faz lembrar das palavras de Paulo em sua epístola aos Romanos, alertando os cristãos sobre o perigo de se abusar da graça de Deus:
“Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que abunde a graça? De modo nenhum. Nós, que já morremos para o pecado, como viveremos ainda nele?” (Rom 6.1,2).
E consideremos atentamente ainda o que ele nos diz em Gál 6.7,8: ”Não vos enganeis; Deus não se deixa escarnecer; pois tudo o que o homem semear, isso também ceifará. Porque quem semeia na sua carne, da carne ceifará a corrupção; mas quem semeia no Espírito, do Espírito ceifará a vida eterna.”.      



“1 Tendo decorrido um ano, no tempo em que os reis saem à guerra, Davi enviou Joabe, e com ele os seus servos e todo o Israel; e eles destruíram os amonitas, e sitiaram a Rabá. Porém Davi ficou em Jerusalém.
2 Ora, aconteceu que, numa tarde, Davi se levantou do seu leito e se pôs a passear no terraço da casa real; e do terraço viu uma mulher que se estava lavando; e era esta mulher mui formosa à vista.
3 Tendo Davi enviado a indagar a respeito daquela mulher, disseram-lhe: Porventura não é Bate-Seba, filha de Eliã, mulher de Urias, o heteu?
4 Então Davi mandou mensageiros para trazê-la; e ela veio a ele, e ele se deitou com ela (pois já estava purificada da sua imundícia); depois ela voltou para sua casa.
5 A mulher concebeu; e mandou dizer a Davi: Estou grávida.
6 Então Davi mandou dizer a Joabe: Envia-me Urias, o heteu. E Joabe o enviou a Davi.
7 Vindo, pois, Urias a Davi, este lhe perguntou como passava Joabe, e como estava o povo, e como ia a guerra.
8 Depois disse Davi a Urias: Desce a tua casa, e lava os teus pés. E, saindo Urias da casa real, logo foi mandado após ele um presente do rei.
9 Mas Urias dormiu à porta da casa real, com todos os servos do seu senhor, e não desceu a sua casa.
10 E o contaram a Davi, dizendo: Urias não desceu a sua casa. Então perguntou Davi a Urias: Não vens tu duma jornada? por que não desceste a tua casa?
11 Respondeu Urias a Davi: A arca, e Israel, e Judá estão em tendas; e Joabe, meu senhor, e os servos de meu senhor estão acampados ao relento; e entrarei eu na minha casa, para comer e beber, e para me deitar com minha mulher? Como vives tu, e como vive a tua alma, não farei tal coisa.
12 Então disse Davi a Urias: Fica ainda hoje aqui, e amanhã te despedirei. Urias, pois, ficou em Jerusalém aquele dia e o seguinte.
13 E Davi o convidou a comer e a beber na sua presença, e o embebedou; e à tarde saiu Urias a deitar-se na sua cama com os servos de seu senhor, porém não desceu a sua casa.
14 Pela manhã Davi escreveu uma carta a Joabe, e mandou-lha por mão de Urias.
15 Escreveu na carta: Ponde Urias na frente onde for mais renhida a peleja, e retirai-vos dele, para que seja ferido e morra.
16 Enquanto Joabe sitiava a cidade, pôs Urias no lugar onde sabia que havia homens valentes.
17 Quando os homens da cidade saíram e pelejaram contra Joabe, caíram alguns do povo, isto é, dos servos de Davi; morreu também Urias, o heteu.
18 Então Joabe mandou dizer a Davi tudo o que sucedera na peleja;
19 e deu ordem ao mensageiro, dizendo: Quando tiveres acabado de contar ao rei tudo o que sucedeu nesta peleja,
20 caso o rei se encolerize, e te diga: Por que vos chegastes tão perto da cidade a pelejar. Não sabíeis vós que haviam de atirar do muro?
21 Quem matou a Abimeleque, filho de Jerubesete? Não foi uma mulher que lançou sobre ele, do alto do muro, a pedra superior dum moinho, de modo que morreu em Tebez? Por que chegastes tão perto do muro? Então dirás: Também morreu teu servo Urias, o heteu.
22 Partiu, pois, o mensageiro e, tendo chegado, referiu a Davi tudo o que Joabe lhe ordenara.
23 Disse o mensageiro a Davi: Os homens ganharam uma vantagem sobre nós, e sairam contra nos ao campo; porém nos os repelimos até a entrada da porta.
24 Então os flecheiros atiraram contra os teus servos desde o alto do muro, e morreram alguns servos do rei; e também morreu o teu servo Urias, o heteu.
25 Disse Davi ao mensageiro: Assim dirás a Joabe: Não te preocupes com isso, pois a espada tanto devora este como aquele; aperta a tua peleja contra a cidade, e a derrota. Encoraja-o tu assim.
26 Ouvindo, pois, a mulher de Urias que seu marido era morto, o chorou.
27 E, passado o tempo do luto, mandou Davi recolhê-la a sua casa: e ela lhe foi por mulher, e lhe deu um filho. Mas isto que Davi fez desagradou ao Senhor.” (II Sm 11.1-27).


II Samuel 12

Como Deus Julgou o Adultério de Davi

Desde que Davi adulterou com Bate-Seba ele havia perdido a alegria da salvação, e  sabemos disto porque nós o vemos pedindo ao Senhor que lhe devolvesse a referida alegria no Salmo 51.12, que ele escreveu depois que Natã veio ter com ele, como veremos neste 12º capítulo de II Samuel.
Pelo menos nove meses haviam passado até que Deus enviou o profeta Natã a Davi, pois tendo profetizado que o filho que lhe nascera com Bate-Seba morreria (v.14), não demorou muito para que a criança fosse enfermada gravemente pelo Senhor  (v.15), e esta veio a morrer apenas sete dias depois (v. 18).
Como Natã disse “o filho que te nasceu” (v.14), quando falou a Davi, a criança era portanto nascida, e é por isso que podemos concluir que o endurecimento de Davi em seu pecado durou pelo menos nove meses, e isto em si mesmo foi uma forma de manifestação de um dos juízos do Senhor desferidos contra Ele, pois ficara privado das consolações do Espírito Santo a ponto de pedir que Deus lhe devolvesse a alegria da sua salvação,  e que não retirasse dele o Espírito Santo (Sl 51.11), porque vinha sentindo profundamente a ausência de suas doces consolações em sua vida.
Ele tinha perdido naquele período de endurecimento o elevado nível de graça que desfrutava em sua comunhão com o Espírito de Deus, em razão de tê-lo entristecido e apagado.
Há determinados pecados que não somente entristecem o Espírito Santo, como também diminuem as Suas graças e consolações, até o momento determinado por Deus para a nossa restauração.
Assim, neste caso, não estava no poder de Davi reverter o quadro no momento que bem lhe aprouvesse, porque havia um juízo do Senhor imposto sobre ele, mediante o qual lhe manifestava todo o Seu desagrado pelo pecado que ele praticara.
As portas que nós fechamos à comunhão com o Senhor e à ação da Sua graça em nossas vidas, por pecados que praticamos, serão abertas não quando nós o desejarmos, mas no tempo que ele tiver determinado para a nossa correção.
Certamente Davi não pôde compor neste período de sequidão que lhe sobreveio da parte do Senhor, nenhum salmo.
A sua harpa ficou desafinada.
A inspiração celestial foi apagada e ele ficou entregue a si mesmo, incapaz de manter um espírito reto e voluntário (Sl 51.12).
Somente depois que Natã veio ter com ele, e lhe foi concedida graça pelo Senhor para que se arrependesse, que ele conseguiu enxergar e confessar o seu pecado e não somente isto, clamar humildemente a Deus que restaurasse nele o mesmo bom e antigo espírito que lhe sustentava.
Por isso, nós o vemos pedindo a Deus um coração puro (Sl 51.10), e que para isto, o purificasse e lavasse de modo que ficasse mais alvo do que a neve (Sl 51.7).
Ele reconheceu finalmente que havia pecado contra o próprio Deus (Sl 51.4) e reconheceu que Ele estava sendo justo ao repreendê-lo e em tê-lo mantido desassistido das suas consolações (Sl 51.4b).
Mas, recebendo graça para arrependimento agora, ele se sente encorajado a clamar pela misericórdia do Senhor (Sl 51.1).
É provável que tenha continuado a apresentar sacrifícios e ofertas ao Senhor, mas isto não foi suficiente para alterar o estado da sua alma, e daí talvez o teor das suas palavras no Salmo 51.16,17.
Nós cremos, segundo o teor das palavras do Salmo 51, que Davi voltou a sentir a paz, o perdão e a alegria do Espírito Santo, invadindo a sua alma e coração, somente depois que Natã veio ter com ele, e muito lhe ajudou ter ouvido a confirmação que veio do Espírito Santo a ele, através dos lábios do profeta: “o teu pecado foi perdoado”.
É importante para qualquer cristão aprender o que há no exemplo de Davi, quanto a se colocar na posição correta diante de Deus, para poder receber o seu perdão, e isto se faz humilhando-se debaixo de Sua potente mão, para que em tempo oportuno Ele possa de novo nos exaltar, ungindo a nossa cabeça com o óleo da alegria do Espírito Santo, e quebrando todas as correntes que aprisionavam a nossa alma, e que nos privavam da verdadeira alegria e paz do Espírito Santo.
Este é o maior bem e o verdadeiro sentido e significado desta vida, a saber: a plena comunhão com Deus, e saber que já não há nada se interpondo entre nós e Ele, que podemos andar confiantemente, gozando a Sua presença sem ter pesando sobre a nossa consciência as antigas acusações, relativas aos males que praticamos, por sabermos que a mão do Senhor se moveu em compaixão por nós, diante da nossa quieta humilhação, e nos lavou aplicando o sangue de Jesus em nossas feridas.
Oh! Quão bom é isto, e quão necessário é para um viver em retidão na paz, na verdade e no amor.
Não esqueçamos que as palavras do Salmo 51 são as palavras de um crente que expressam estas realidades a que estamos nos referindo.
Davi chega até mesmo a dizer no referido Salmo que se sentia impedido em dar testemunho do Senhor na congregação dos justos, por causa do seu pecado e do juízo do Senhor que pesava sobre ele, e somente agora ele é capacitado pela graça do Senhor a pedir-lhe restauração, para que pudesse de novo ensinar aos transgressores os caminhos de Deus, de modo que os pecadores pudessem se converter a Ele (Sl 51.13); e também que o livrasse do peso em sua consciência dos crimes de sangue que havia cometido, de modo que a sua língua pudesse cantar alegremente a justiça do Senhor, porque quando Deus abre os nossos lábios, a nossa boca proclama o Seu louvor (Sl 51.14,15).
Nós falamos anteriormente de alma em cadeias, e era assim que se encontrava a de Davi apesar de ser um crente. E esta é a condição que os cristãos podem experimentar ao longo de suas vidas, uns mais e outros menos, enquanto praticam contra o Senhor aqueles pecados contra o próximo, que lhes conduzem a tal situação.
Jesus falou diretamente sobre isto e o ilustrou inclusive em parábolas, como na do credor incompassivo.
Ele ensinou que o pecado de ofensa e cólera contra o próximo é equivalente, aos olhos de Deus, ao crime de assassinato, e sujeita a alma às cadeias a que estamos nos referindo, que nos privam das consolações do Espírito Santo, até que o problema seja tratado.
Cabe destacar que se encontra na esfera do poder de Deus a decisão do momento em que poderemos sair desta cadeia espiritual, porque é o Juiz que decide sobre isto e não o prisioneiro no mundo natural, quanto mais no espiritual, que é governado pelo Senhor.
Davi teria ainda que arcar com as consequências do seu pecado, mas isto não significa que Deus estava andando contrariamente com ele e manifestando de modo visível e sensível o Seu desagrado, de forma que Davi ficasse privado das graças e consolações da abençoadora manifestação da presença do Espírito Santo.
É muito importante ter uma clara compreensão desta verdade espiritual para que não permitamos que o diabo e uma consciência fraca, que não conheça este caráter perdoador da justiça divina, continuem nos acusando implacavelmente, e nos impedindo de ter uma aproximação adequada de Deus.
Enquanto andamos diante do Deus justo e santo, devemos saber que as Suas misericórdias não têm fim, e que Ele se mostra de fato favorável, em razão delas, a todo aquele que se humilhar diante dEle, quando for repreendido pelos seus pecados, e arrependendo-se efetivamente deles.
Na parábola proferida por Natã, quando Deus se moveu em direção a Davi para conduzi-lo ao arrependimento, foram colocados em contraste um homem rico e um outro, pobre, que possuía somente uma cordeirinha.
E para atender a um viajante que viera ter com ele, o rico não lançou mão de seu rebanho, mas tomou a cordeirinha do pobre.
Isto despertou a ira de Davi porque foi omitido a ele que a estória era uma parábola, e ele a tomou como um fato real, e por isso disse que tal homem deveria morrer, mas antes deveria fazer restituição ao pobre daquilo que lhe havia furtado, conforme prescrevia a Lei de Moisés, a saber, quatro cordeiras pela que havia tomado.
Com isso ele pronunciou uma sentença sobre si mesmo e foi convencido por Deus do seu próprio pecado que cometera tomando Bate-Seba de Urias, e ainda ordenando que o dono da cordeira fosse morto, fato este que foi omitido na parábola de Natã, mas não nos juízos que o Senhor proferiu através dele sobre Davi.
Ele era rico não sem que o Senhor o tivesse designado para isto, pois fora ungido por Deus para ser rei sobre Israel (v.7), e não somente o livrou das mãos de Saul como também lhe deu a casa dele e as mulheres da sua casa, referindo-se certamente a Mical, filha de Saul, e como não fosse pouco a casa de Saul, deu-lhe também a casa de Israel e de Judá (v. 8), e se Davi achasse que isto ainda era pouco ter-lhe-ia concedido outras coisas como estas.
E por que então ele foi lançar mão daquilo que Deus não lhe dera?
Na verdade não o deu apenas a Davi, como a qualquer outro homem, a saber, a mulher do seu próximo.
E para que ninguém buscasse se desculpar na Sua presença do crime de adultério, Ele o proibiu expressamente na Sua Palavra.
Deste modo, o Senhor protestou contra o pecado de Davi como sendo desprezo da Sua Palavra (v. 9), que é no final das contas, um desprezo do próprio Deus (v. 10). Pois Davi não somente transgrediu a lei que diz “Não adulterarás”, como a que diz “Não matarás” pois ordenou a morte de Urias sem qualquer motivo justo.
Se o assunto fosse encerrado apenas com uma repreensão verbal, Deus estaria incentivando os pecadores a transgredirem a Sua Palavra porque a mera admoestação em certos tipos de pecados, especialmente aqueles que não atingem apenas o próprio praticante, mas o seu próximo, como foi o caso de Davi, não pode ser considerada como uma justa retribuição do mal, porque no caso há a exigência justa de uma reparação ou restituição, ou ainda, uma compensação que faça justiça à parte ofendida.
Nós já vimos anteriormente, que Davi estava experimentando o desgosto de Deus pela diminuição das graças e consolações do Espírito Santo em sua vida, e certamente sua alma se encontrava em cadeias, sob a opressão dos verdugos, e somente nisto ele teria restituído quatro vezes mais em sofrimentos que havia experimentado, todo o sofrimento que havia causado a outros.
Mas os juízos não terminariam quando Natã veio ter com ele,e quando finalmente pôde se arrepender, conforme vemos no Salmo 51, pois foi-lhe dito pelo Senhor, através do profeta, que suscitaria o mal sobre ele, vindo da sua própria casa, e que daria as suas mulheres ao seu próximo (quem viria a fazer isto seria o seu próprio filho Absalão seguindo o conselho que lhe fora dado por um dos próprios conselheiros de confiança de Davi, chamado Aitofel), e isto seria feito à luz do dia à vista dos israelitas (v. 10 a 12).
A grandeza dos juízos levou Davi a exclamar: “Pequei contra o Senhor”, e deve ter pensado que Deus o mataria pela espada que fora profetizada para vir sobre a sua casa, mas Natã lhe disse que o Senhor havia perdoado o seu pecado, e que ele não morreria em consequência destes juízos relativos àquele pecado (v. 13).
Talvez tivesse causado menor dor a Davi ter sido morto por Deus quando Natã lhe falou, pois ele veio a desejar a sua própria morte quando soube que seu filho Absalão havia sido morto pela espada, e teve que testemunhar ainda em vida o incesto de Absalão com suas concubinas, o incesto de seu filho Amnom com sua filha Tamar, e a morte de Amnom por Absalão.
E como o juízo do Senhor foi estabelecido sobre a sua casa, um outro filho de Davi chamado Adonias seria morto a mando de Salomão.
E a casa de Davi não foi rejeitada por Deus como fora a de Saul, porque Deus é fiel e havia feito a ele a promessa de confirmar o seu reino para sempre, de modo que nunca lhe faltasse herdeiros no trono, e nós vemos assim que a promessa feita a Davi foi cumprida por causa da perfeita fidelidade e misericórdia de Deus, e não por causa dos méritos, bondade e justiça do próprio Davi.
Isto fala bem de perto do caráter da aliança da graça que Deus fez com os cristãos por meio da fé em Jesus: não foi também pelos méritos, bondade e justiça deles, senão pelos de Cristo.
Oh! A doce e preciosa promessa do Evangelho!
A promessa de vida eterna e perdão dos pecados em Cristo! Ai de nós! Ai de Davi! Caso Deus não tivesse feito a promessa de perdoar todos os nossos pecados em Jesus Cristo para efeito de sermos reconciliados com Ele e não sermos condenados eternamente.
Se podemos dizer juntamente com o apóstolo Paulo: “miseráveis homens que somos”, por causa do pecado, podemos também dizer juntamente com ele: “Graças a Deus, por Jesus Cristo nosso Senhor!”.
Agora, nós vemos neste mesmo capítulo o modo maravilhoso como Deus administra  a Sua justiça, tanto no aspecto da retribuição do mal, quanto na recompensa do bem, pois é ainda nele que se fala do nascimento de Salomão (v. 24,25), que Davi tivera com Bate-Seba, e a sua conquista de Rabá, recebendo ele próprio a honra daquela conquista (v. 26 a 31).
Tudo isto foi concedido a Davi como forma de demonstração do favor do Senhor, que sabe equilibrar as aflições e consolações dos seus filhos, porque ele não somente se arrependeu do seu pecado como também se sujeitou humildemente debaixo da poderosa mão do Senhor (I Pe 5.6).
Ele havia comprovado isto na maneira como se comportou diante da manifestação do juízo de Deus sobre o primeiro filho que tivera com Bate-Seba (v. 15 a 23).
Ele não reclamou com o Senhor pela enfermidade que Ele trouxe sobre a criança mas apelou insistentemente pela Sua misericórdia, enquanto jejuava para que Deus não executasse o juízo que havia determinado.
Mas quando soube que a criança havia morrido, ele abandonou o jejum, ungiu-se, trocou suas vestes, e entrou na casa do Senhor para adorá-lo (v. 20), dando uma clara demonstração que havia se submetido ao Seu juízo.
E como poderia o Pai das misericórdias reter a Sua compaixão e bondade a quem se submete a Ele da forma como fizera Davi?
Ele visitaria o seu pecado com os Seus juízos determinados, mas ao mesmo tempo lhe manifestaria a Sua bondade e misericórdia, e é por isso que temos registrado neste 12º capítulo os juízos proferidos, e em parte executados sobre Davi, com a morte de seu filho, como também o registro do nascimento de Salomão, e a vitória sobre os amonitas de Rabá.
Cabe ainda dizer que Salomão fora concebido debaixo do favor do Senhor porque o nome que lhe foi dado pelos seus pais significa “pacífico” e mais do que isto, foi-lhe dado um nome profético por Deus, através de Nata: Jedidias, que significa “o amado de Jeová” (v. 25). Esta palavra é da  mesma raiz do nome Davi, que significa “o amado”, e é uma combinação do seu nome com o de Jeová.
Deus estava portanto enviando uma mensagem a Davi que havia amado e escolhido aquele menino, e é por este motivo que nós vemos Natã empenhado nos últimos dias de Davi para que Salomão lhe sucedesse no trono, apesar de não ter a precedência em ordem de primogenitura, pois esta cabia a Adonias, por terem morrido Amnom e Absalão, e ele procedeu assim porque sabia que Salomão havia sido dado por Deus para ser o terceiro rei de Israel, depois da morte de seu pai.  
Todos estes juízos misturados com a misericórdia, têm o propósito didático de nos ensinarem, que somente Deus é o Criador, porque nada poderia ser sustentado na criação, caso o Criador não tivesse o Seu trono firmado sobre a justiça e a misericórdia, porque senão, todas as suas criaturas morais, que nada são sem Ele, conforme a Palavra demonstra até mesmo no exemplo de um gigante espiritual como Davi,  poderiam subsistir na Sua presença completamente santa e justa.      
  Por outro lado, aprendemos também que o mal somente destrói aquele que o pratica, como também causa destruição a outros. Então,  o Criador de todas as coisas nunca poderia ter em Si qualquer forma de mal, porque, do contrário, nunca poderia estabelecer um reino eterno e inabalável, como o que o Senhor está construindo através da conversão dos eleitos.


“1 O Senhor, pois, enviou Natã a Davi. E, entrando ele a ter com Davi, disse-lhe: Havia numa cidade dois homens, um rico e outro pobre.
2 O rico tinha rebanhos e manadas em grande número;
3 mas o pobre não tinha coisa alguma, senão uma pequena cordeira que comprara e criara; ela crescera em companhia dele e de seus filhos; do seu bocado comia, do seu copo bebia, e dormia em seu regaço; e ele a tinha como filha.
4 Chegou um viajante à casa do rico; e este, não querendo tomar das suas ovelhas e do seu gado para guisar para o viajante que viera a ele, tomou a cordeira do pobre e a preparou para o seu hóspede.
5 Então a ira de Davi se acendeu em grande maneira contra aquele homem; e disse a Natã: Vive o Senhor, que digno de morte é o homem que fez isso.
6 Pela cordeira restituirá o quádruplo, porque fez tal coisa, e não teve compaixão.
7 Então disse Natã a Davi: Esse homem és tu! Assim diz o Senhor Deus de Israel: Eu te ungi rei sobre Israel, livrei-te da mão de Saul,
8 e te dei a casa de teu senhor, e as mulheres de teu senhor em teu seio; também te dei a casa de Israel e de Judá. E se isso fosse pouco, te acrescentaria outro tanto.
9 Por que desprezaste a palavra do Senhor, fazendo o mal diante de seus olhos? A Urias, o heteu, mataste à espada, e a sua mulher tomaste para ser tua mulher; sim, a ele mataste com a espada dos amonitas.
10 Agora, pois, a espada jamais se apartará da tua casa, porquanto me desprezaste, e tomaste a mulher de Urias, o heteu, para ser tua mulher.
11 Assim diz o Senhor: Eis que suscitarei da tua própria casa o mal sobre ti, e tomarei tuas mulheres perante os teus olhos, e as darei a teu próximo, o qual se deitará com tuas mulheres à luz deste sol.
12 Pois tu o fizeste em oculto; mas eu farei este negócio perante todo o Israel e à luz do sol.
13 Então disse Davi a Natã: Pequei contra o Senhor. Tornou Natã a Davi: Também o Senhor perdoou o teu pecado; não morrerás.
14 Todavia, porquanto com este feito deste lugar a que os inimigos do Senhor blasfemem, o filho que te nasceu certamente morrerá.
15 Então Natã foi para sua casa. Depois o Senhor feriu a criança que a mulher de Urias dera a Davi, de sorte que adoeceu gravemente.
16 Davi, pois, buscou a Deus pela criança, e observou rigoroso jejum e, recolhendo-se, passava a noite toda prostrado sobre a terra.
17 Então os anciãos da sua casa se puseram ao lado dele para o fazerem levantar-se da terra; porém ele não quis, nem comeu com eles.
18 Ao sétimo dia a criança morreu; e temiam os servos de Davi dizer-lhe que a criança tinha morrido; pois diziam: Eis que, sendo a criança ainda viva, lhe falávamos, porém ele não dava ouvidos à nossa voz; como, pois, lhe diremos que a criança morreu? Poderá cometer um desatino.
19 Davi, porém, percebeu que seus servos cochichavam entre si, e entendeu que a criança havia morrido; pelo que perguntou a seus servos: Morreu a criança? E eles responderam: Morreu.
20 Então Davi se levantou da terra, lavou-se, ungiu-se, e mudou de vestes; e, entrando na casa do Senhor, adorou. Depois veio a sua casa, e pediu o que comer; e lho deram, e ele comeu.
21 Então os seus servos lhe disseram: Que é isso que fizeste? pela criança viva jejuaste e choraste; porém depois que a criança morreu te levantaste e comeste.
22 Respondeu ele: Quando a criança ainda vivia, jejuei e chorei, pois dizia: Quem sabe se o Senhor não se compadecerá de mim, de modo que viva a criança?
23 Todavia, agora que é morta, por que ainda jejuaria eu? Poderei eu fazê-la voltar? Eu irei para ela, porém ela não voltará para mim.
24 Então consolou Davi a Bate-Seba, sua mulher, e entrou, e se deitou com ela. E teve ela um filho, e Davi lhe deu o nome de Salomão. E o Senhor o amou;
25 e mandou, por intermédio do profeta Natã, dar-lhe o nome de Jedidias, por amor do Senhor.
26 Ora, pelejou Joabe contra Rabá, dos amonitas, e tomou a cidade real.
27 Então mandou Joabe mensageiros a Davi, e disse: Pelejei contra Rabá, e já tomei a cidade das águas.
28 Ajunta, pois, agora o resto do povo, acampa contra a cidade e toma-a, para que eu não a tome e seja o meu nome aclamado sobre ela.
29 Então Davi ajuntou todo o povo, e marchou para Rabá; pelejou contra ela, e a tomou.
30 Também tirou a coroa da cabeça do seu rei; e o peso dela era de um talento de ouro e havia nela uma pedra preciosa; e foi posta sobre a cabeça de Davi, que levou da cidade mui grande despojo.
31 E, trazendo os seus habitantes, os pôs a trabalhar com serras, trilhos de ferro, machados de ferro, e em fornos de tijolos; e assim fez a todas as cidades dos amonitas. Depois voltou Davi e todo o povo para Jerusalém.” (II Sm 12.1-31).


II Samuel 13

Juízos de Deus Sobre a Família de Davi

Como já dissemos anteriormente, nós podemos dividir a vida de Davi em dois períodos distintos: antes e depois do seu pecado de adultério com Bate-Seba e o assassinato de Urias.
Nós vemos que este segundo período é marcado por uma sequência de juízos divinos sobre ele e sua casa, a par de todo o amor e favor de Deus, que ele permaneceu desfrutando.
Não é difícil observar no relato bíblico, que ele próprio foi usado como instrumento indireto de Satanás para realização dos seus desígnios malignos forjados contra o próprio Davi e sua casa, de modo que nisto estava sendo dado cumprimento à palavra profética de juízo que o mal seria suscitado contra a sua casa.
Nós vemos 13º capítulo de 2 Samuel, que ele foi enganado por Amnom, seu filho, e contribuiu para o seu incesto com Tamar, por ter dado ouvido ao seu filho e não ter tido qualquer ação da graça de Deus para alertá-lo e prevenir o mal que já havia sido forjado, porque como dissemos, isto daria ocasião para que o mal fosse suscitado sobre ele e sua casa.
Satanás teve permissão de Deus para que Davi lhe fosse entregue, para fazer, evidentemente dentro da esfera de permissão divina, o mal que desejava causar-lhe, tal como fizera com Jó e com Pedro, sendo que no caso destes dois últimos, o mal que lhes fizera não foi por motivo de um juízo específico de Deus, por algum mal que tivessem praticado, senão para o amadurecimento da sua fé.
O pecado de adultério de Davi havia aberto esta grande porta para as operações do diabo, dando-lhe lugar para agir contra a sua vida.
O grande juízo de Deus consistia nesta negação da graça que permitiria que Davi resistisse à tentação, prevenindo-se do mal.
Assim como Davi foi enganado por Amnom em relação a Tamar, seria enganado dois anos depois por Absalão em relação a Amnom, e este engano possibilitou que este fosse morto pelo seu irmão, em vingança contra o que  fizera a Tamar, porque esta era filha da mesma mãe de Absalão (v.1).
A resposta do Senhor estava sendo dada à altura, exatamente como dissera o profeta, e todo Israel temeu e tremeu, e mais uma vez pôde entender que o Deus deles é um fogo consumidor que detesta o pecado e é reto Juiz.
Neste 13º capítulo de 2 Samuel, nós vemos Jonadabe, sobrinho de Davi, filho de Simeia, irmão do rei, do qual se diz no verso 3, que era homem muito sagaz, percebendo que Amnom estava emagrecendo a olhos vistos e conseguiu arrancar dele a confissão do motivo de tal emagrecimento: ele estava fascinado por sua meia irmã Tamar, que era filha da mesma mãe de Absalão, e não tinha qualquer esperança de poder possuí-la, porque além de ser sua irmã,  era virgem e uma jovem virtuosa e obediente a seu pai,  pois mesmo sendo uma formosa princesa, que se vestia muito bem, atendeu prontamente ao pedido de Davi para cozinhar para Amnom, e ela se submeteu a isto sem saber do estratagema de Amnon para seduzi-la, conforme fora instruído por Jonadabe, seu primo, para que tirasse proveito do seu emagrecimento por causa de Tamar, fingindo-se de doente, e que pedisse ao rei para que a enviasse a ele para assisti-lo em seu leito de enfermidade, porque isto lhe daria novo ânimo, porque tinha grande estima por ela, e assim, teria oportunidade de levar a efeito o seu intento incestuoso, pela condição de estar sozinho com ela em sua própria casa.
Conseguindo êxito em enganar o seu pai, este lha enviou e ele a forçou a se deitar com ele, apesar de todo o esforço que ela fez para se lhe opor, argumentando que deveria pedi-la em casamento a Davi, mas não abusar dela, primeiro porque era seu irmão, e segundo, deflorá-la sem estar formalmente compromissado pelo matrimônio era algo proibido pela Lei de Deus, e não era portanto um costume entre os israelitas fazê-lo, senão entre os pagãos.
Mas Amnom não lhe deu ouvido e a forçou, e tendo sentido depois desprezo por ela, tendo uma vez satisfeito o desejo lascivo e maligno que o diabo colocou em sua mente, ele a expulsou da sua casa, infamando-a, e esta sua atitude foi tão grave quanto o estupro que  havia cometido.
Tamar colocou cinza sobre a cabeça e rasgou a longa túnica de mangas compridas que trajava, e que a identificava como uma princesa, e colocando a mão na cabeça, por causa da vergonha a que fora submetida, andava clamando (v. 19).
Vendo-a neste estado, seu irmão Absalão lhe indagou se não havia estado com Amnom, temendo o pior, pois não somente devia desconfiar das intenções de Amnom para com ela, e também possivelmente da tendência que ele tinha para práticas lascivas.
Absalão a tomou em sua casa e a reteve com ele em sua desolação.
É provável que o modo como ele a via desolada em cada dia, fazia com que o ressentimento que guardava em seu coração contra Amnom e contra Davi por não ter castigado o pecado dele, aumentava a cada dia que passava.
O diabo estava trabalhando silenciosamente nele e transformou aquele ressentimento em ódio.
Tudo o que viria a acontecer depois como atos de Absalão contra Amnom e Davi seria apenas a consequência destes sentimentos que ele guardou por dois anos (v. 23), até colocar em prática o plano que havia forjado, para que os seus servos matassem Amnom na festa da tosquia que promovera, e para a qual convidara o rei e todos os seus filhos (v. 23 a 36).
Tendo Amnom sido morto, Absalão fugiu para junto de Talmai, seu avô, rei de Gesur (v. 37), que era um dos países dos sírios, que ficava no extremo norte da Palestina, e permaneceu lá pelo prazo de três anos (v. 38), quando Davi cessou de persegui-lo, porque já havia se consolado da morte de Amnom, pelo qual ele chorava todos os dias (v. 37, 38).
Amnom era o primogênito de Davi e o seu provável sucessor no trono.
Isto explica de certo modo o fato de ter lamentado a morte de Amnom por tanto tempo, e também explica um motivo adicional que Absalão teria para matá-lo, tendo em vista a corrida de sucessão ao trono.



“1 Ora, Absalão, filho de Davi, tinha uma irmã formosa, cujo nome era Tamar; e sucedeu depois de algum tempo que Amnom, filho de Davi enamorou-se dela.
2 E angustiou-se Amnom, até adoecer, por amar, sua irmã; pois era virgem, e parecia impossível a Amnom fazer coisa alguma com ela.
3 Tinha, porém, Amnom um amigo, cujo nome era Jonadabe, filho de Simeia, irmão de Davi; e era Jonadabe homem mui sagaz.
4 Este lhe perguntou: Por que tu de dia para dia tanto emagreces, ó filho do rei? não mo dirás a mim? Então lhe respondeu Amnom: Amo a Tamar, irmã de Absalão, meu irmão.
5 Tornou-lhe Jonadabe: Deita-te na tua cama, e finge-te doente; e quando teu pai te vier visitar, dize-lhe: Peço-te que minha irmã Tamar venha dar-me de comer, preparando a comida diante dos meus olhos, para que eu veja e coma da sua mão.
6 Deitou-se, pois, Amnom, e fingiu-se doente. Vindo o rei visitá-lo, disse-lhe Amnom: Peço-te que minha irmã Tamar venha e prepare dois bolos diante dos meus olhos, para que eu coma da sua mão.
7 Mandou, então, Davi a casa, a dizer a Tamar: Vai a casa de Amnom, teu irmão, e faze-lhe alguma comida.
8 Foi, pois, Tamar a casa de Amnom, seu irmão; e ele estava deitado. Ela tomou massa e, amassando-a, fez bolos e os cozeu diante dos seus olhos.
9 E tomou a panela, e os tirou diante dele; porém ele recusou comer. E disse Amnom: Fazei retirar a todos da minha presença. E todos se retiraram dele.
10 Então disse Amnom a Tamar: Traze a comida a câmara, para que eu coma da tua mão. E Tamar, tomando os bolos que fizera, levou-os à câmara, ao seu irmão Amnom.
11 Quando lhos chegou, para que ele comesse, Amnom pegou dela, e disse-lhe: Vem, deita-te comigo, minha irmã.
12 Ela, porém, lhe respondeu: Não, meu irmão, não me forces, porque não se faz assim em Israel; não faças tal loucura.
13 Quanto a mim, para onde levaria o meu opróbrio? E tu passarias por um dos insensatos em Israel. Rogo-te, pois, que fales ao rei, porque ele não me negará a ti.
14 Todavia ele não quis dar ouvidos à sua voz; antes, sendo mais forte do que ela, forçou-a e se deitou com ela.
15 Depois sentiu Amnom grande aversão por ela, pois maior era a aversão que se sentiu por ela do que o amor que lhe tivera. E disse-lhe Amnom: Levanta-te, e vai-te.
16 Então ela lhe respondeu: Não há razão de me despedires; maior seria este mal do que o outro já me tens feito. Porém ele não lhe quis dar ouvidos,
17 mas, chamando o moço que o servia, disse-lhe: Deita fora a esta mulher, e fecha a porta após ela.
18 Ora, trazia ela uma túnica talar; porque assim se vestiam as filhas virgens dos reis. Então o criado dele a deitou fora, e fechou a porta após ela.
19 Pelo que Tamar, lançando cinza sobre a cabeça, e rasgando a túnica talar que trazia, pôs as mãos sobre a cabeça, e se foi andando e clamando.
20 Mas Absalão, seu irmão, lhe perguntou: Esteve Amnom, teu irmão, contigo? Ora pois, minha irmã, cala-te; é teu irmão. Não se angustie o seu coração por isto. Assim ficou Tamar, desolada, em casa de Absalão, seu irmão.
21 Quando o rei Davi ouviu todas estas coisas, muito se lhe acendeu a ira.
22 Absalão, porém, não falou com Amnom, nem mal nem bem, porque odiava a Amnom por ter ele forçado a Tamar, sua irmã.
23 Decorridos dois anos inteiros, tendo Absalão tosquiadores em Baal-Hazor, que está junto a Efraim, convidou todos os filhos do rei.
24 Foi, pois, Absalão ter com o rei, e disse: Eis que agora o teu servo faz a tosquia. Peço que o rei e os seus servos venham com o teu servo.
25 O rei, porém, respondeu a Absalão: Não, meu filho, não vamos todos, para não te sermos pesados. Absalão instou com ele; todavia ele não quis ir, mas deu-lhe a sua benção.
26 Disse-lhe Absalão: Ao menos, deixa ir conosco Amnom, meu irmão. O rei, porém, lhe perguntou: Para que iria ele contigo?
27 Mas como Absalão instasse com o rei, este deixou ir com ele Amnom, e os demais filhos do rei.
28 Ora, Absalão deu ordem aos seus servos, dizendo: Tomai sentido; quando o coração de Amnom estiver alegre do vinho, e eu vos disser: Feri a Amnom; então matai-o. Não tenhais medo; não sou eu quem vo-lo ordenou? Esforçai-vos, e sede valentes.
29 E os servos de Absalão fizeram a Amnom como Absalão lhes havia ordenado. Então todos os filhos do rei se levantaram e, montando cada um no seu mulo, fugiram.
30 Enquanto eles ainda estavam em caminho, chegou a Davi um rumor, segundo o qual se dizia: Absalão matou todos os filhos do rei; nenhum deles ficou.
31 Então o rei se levantou e, rasgando as suas vestes, lançou-se por terra; da mesma maneira todos os seus servos que lhe assistiam rasgaram as suas vestes.
32 Mas Jonadabe, filho de Simeia, irmão de Davi, disse-lhe: Não presuma o meu senhor que mataram todos os mancebos filhos do rei, porque só morreu Amnom; porque assim o tinha resolvido fazer Absalão, desde o dia em que ele forçou a Tamar, sua irmã.
33 Não se lhe meta, pois, agora no coração ao rei meu senhor o pensar que morreram todos os filhos do rei; porque só morreu Amnom.
34 Absalão, porém, fugiu. E o mancebo que estava de guarda, levantando os olhos, orou, e eis que vinha muito povo pelo caminho por detrás dele, ao lado do monte.
35 Então disse Jonadabe ao rei: Eis aí vêm os filhos do rei; conforme a palavra de teu servo, assim sucedeu.
36 Acabando ele de falar, chegaram os filhos do rei e, levantando a sua voz, choraram; e também o rei e todos os seus servos choraram amargamente.
37 Absalão, porém, fugiu, e foi ter com Talmai, filho de Amiur, rei de Gesur. E Davi pranteava a seu filho todos os dias.
38 Tendo Absalão fugido para Gesur, esteve ali três anos.


39 Então o rei Davi sentiu saudades de Absalão, pois já se tinha consolado acerca da morte de Amnom.” (II Sm 13.1-39).


II Samuel 14

O Reino de Deus não É Político

Nós vemos no 14º capítulo de 2 Samuel, que o interesse de Joabe pelo regresso de Absalão do exílio em Gesur, para Jerusalém, não era devido a qualquer amizade pessoal e simpatia que tivesse por ele, pois foi quem buscaria intensamente a sua morte, na rebelião contra Davi, mesmo contra uma ordem expressa deste para que fosse poupado com vida.
O interesse que moveu Joabe era de caráter político e não sentimental, porque Absalão era o sucessor natural de Davi ao trono, e as opiniões estavam divididas em Israel, quanto à necessidade do seu retorno para Israel, para que pudesse reinar no lugar do seu pai quando este morresse.
Assim, o interesse de Joabe em trazê-lo de volta visava à preservação da paz civil, de modo que se evitasse uma possível guerra futura na luta de sucessão ao trono.
Nós encontramos Absalão, no início deste 14º capítulo, ainda no exílio.
A sua busca por Davi, para ser o vingador do sangue de Amnom, havia cessado depois de passados três anos, e como as opiniões em Israel se dividiam a respeito dele, quanto a pesar os justos motivos que teria ou não para ter assassinado o seu irmão, e tendo Joabe notado que caso Davi morresse, poderia haver uma guerra civil em Israel, em razão de um partido que fosse a favor de trazer Absalão do exílio, então ele se antecipou a isto tomando providências para convencer Davi a reintegrá-lo no reino.
Contudo, não sabia que o mal já havia construído um grande castelo no coração de Absalão, para reger todas as suas intenções de se vingar do seu próprio pai, não apenas pelo exílio a que fora submetido por ele, quanto a ter deixado Amnom impune no caso do seu incesto com Tamar.
E quando Joabe percebeu que o coração de Davi voltava a se inclinar para Absalão (v. 1), ele se apressou em trazer uma mulher sábia de Tecoa (v.2), mas não certamente sábia segundo Deus, mas segundo o mundo, no exercício da arte da política, e a pedido de Joabe, e por instrução deste, fingiu estar de luto por um dos seus filhos que disse ter sido morto pelo seu próprio irmão, e que sendo viúva e tendo somente a ele por arrimo, temia passar por sérias dificuldades, caso a sua parentela conseguisse vingar o sangue que ele havia derramado do seu irmão.
E ela insistiu veementemente com Davi para que não deixasse os vingadores do sangue matarem o único filho que lhe restara, e visava com isto dissuadir o próprio rei e toda a sua parentela de vingarem o sangue de Amnom, que havia sido derramado por Absalão.
E somente depois de ter obtido dele o compromisso de atender à sua petição, que ela lhe apresentou o caso de Absalão, e mostrou a Davi, do ponto de vista político, e não do de Deus, que a sua resistência em trazer Absalão de volta ao reino era na verdade contra o povo de Deus, e que Davi estava condenando a si mesmo, por não trazer de volta aquele que ele havia desterrado (v. 13).
As palavras proferidas pela mulher tecoíta no verso 14 podem parecer numa interpretação apressada como expressão da verdade, assim, este versículo não deve ser ensinado fora do contexto bíblico, no qual aprendemos que Deus tira sim a vida no exercício da Sua soberania, e nem sempre Ele cogita meios para que os banidos não permaneçam arrojados da Sua presença, afinal Ele tem afirmado que terá misericórdia de quem Lhe aprouver ter misericórdia, assim como Ele endurece a quem quer.
Ele tanto pode tirar a vida do corpo quanto fazer a alma perecer no inferno.
A sabedoria do mundo diz juntamente com a mulher tecoíta, contra a revelação de Deus registrada na Bíblia, que Ele é pai de todos os homens e que não pode trazer qualquer mal a eles em decorrência de ser o pai deles.
No entanto, cabe lembrar que a lei do goel, do vingador do sangue, que vigorava no Velho Testamento, para nossa instrução quanto ao caráter de Deus, foi prescrita por Ele e não por iniciativa de Moisés.
Os juízos de Deus, a propósito, começam pela Sua própria casa (I Pe 4.17), porque no equilíbrio justo da Sua misericórdia com os Seus juízos, nunca deixará a qualquer um dos seus verdadeiros filhos sem a devida correção, até mesmo se for necessária, pelo uso da morte física, como fizera com muitos na Igreja de Corinto, e que continua fazendo desde o início da criação.
Davi se deixou persuadir pelos argumentos da mulher, que na verdade, eram os argumentos de Joabe, e não consultou ao Senhor, senão os seus próprios sentimentos e conveniências políticas que envolviam a questão.
Tanto isto é verdade que Davi não havia perdoado plenamente a Absalão, pois apesar de ter ordenado a Joabe que o trouxesse de volta a Jerusalém, contudo proibiu que ele visse a sua face, e que se dirigisse para a sua própria casa (v. 23, 24).
A única referência que a Palavra de Deus faz à pessoa de Absalão é a de que ele era o homem de grande beleza em Israel e que não tinha qualquer defeito físico, sendo dono de uma cabeleira admirável (v. 25, 26).
Nada se diz de sua sabedoria e devoção a Deus.
É motivo de preocupação para os pais quando os seus filhos estão mais interessados na sua beleza física do que na virtude deles.
Depois de ter ficado dois anos em Jerusalém, sem poder ser admitido na presença do rei, e participar dos assuntos relativos ao reino, Absalão manifestou um interesse fingido de ver a face de seu pai, dizemos fingido, porque não era o arrependimento e o amor que o moviam a isto, mas o desejo de se vingar e suplantar Davi, e ele não poderia fazê-lo enquanto não fosse reempossado em sua antiga posição de ministro do rei.
Absalão havia aprendido com seu avô, rei de Gesur, a multiplicar cavalos e é por isso que nós o veremos logo no início do capítulo seguinte a este, provendo-se de um carro e cavalos, e cinquenta homens que corriam adiante dele pomposamente, para anunciarem a sua chegada aonde quer que ele fosse (15.1).
Era com este sonho de poder e glória em mira que ele mandou chamar Joabe para que tomasse providências para fazê-lo retornar à corte real.
Como este demorava em atender à sua chamada, ordenou aos seus servos que ateassem fogo no campo de Joabe, que ficava próximo à sua residência.
Foi com insolência ameaçadora que falou a Joabe quando este veio ter com ele para que apresentasse as razões do danos que lhe causara.
Talvez Joabe tenha se recusado a vir ter logo com Absalão quando este lhe chamou, em razão deste não ter se mostrado grato pelas providências que havia tomado para que pudesse retornar a Jerusalém.
Homens orgulhosos consideram os favores que nos prestam como dívida.
Mas em vez de Absalão mostrar gratidão, ele causou um dano a quem lhe havia beneficiado, e nem tampouco se dispôs a reparar o dano, fazendo uma compensação por ele (v. 28 a 39).
Pessoas nobres são sempre gratas, e nunca pesam os motivos daqueles que as têm beneficiado, e sempre manifestarão a sua gratidão pelo favor que tiverem recebido, ainda que saibam que aqueles que o praticaram o fizeram em causa própria ou por qualquer outro tipo de interesse.  


“1 Percebendo Joabe, filho de Zeruia, que o coração do rei estava inclinado para Absalão,
2 mandou a Tecoa trazer de lá uma mulher sagaz, e disse-lhe: Ora, finge que estás de nojo; põe vestidos de luto, não te unjas com óleo, e faze-te como uma mulher que há muitos dias chora algum morto;
3 vai ter com o rei, e fala-lhe desta maneira. Então Joabe lhe pôs as palavras na boca.
4 A mulher tecoíta, pois, indo ter com o rei e prostrando-se com o rosto em terra, fez-lhe uma reverência e disse: Salva-me, o rei.
5 Ao que lhe perguntou o rei: Que tens? Respondeu ela: Na verdade eu sou viúva; morreu meu marido.
6 Tinha a tua serva dois filhos, os quais tiveram uma briga no campo e, não havendo quem os apartasse, um feriu ao outro, e o matou.
7 E eis que toda a parentela se levantou contra a tua serva, dizendo: Dá-nos aquele que matou a seu irmão, para que o matemos pela vida de seu irmão, a quem ele matou, de modo que exterminemos também o herdeiro. Assim apagarão a brasa que me ficou, de sorte a não deixarem a meu marido nem nome, nem remanescente sobre a terra.
8 Então disse o rei à mulher: Vai para tua casa, e eu darei ordem a teu respeito.
9 Respondeu a mulher tecoíta ao rei: A iniquidade, ó rei meu senhor, venha sobre mim e sobre a casa de meu pai; e fique inculpável o rei e o seu trono.
10 Tornou o rei: Quem falar contra ti, traze-mo a mim, e nunca mais te tocará.
11 Disse ela: Ora, lembre-se o rei do Senhor seu Deus, para que o vingador do sangue não prossiga na destruição, e não extermine a meu filho. Então disse ele: Vive o Senhor, que não há de cair no chão nem um cabelo de teu filho.
12 Então disse a mulher: Permite que a tua serva fale uma palavra ao rei meu senhor. Respondeu ele: Fala.
13 Ao que disse a mulher: Por que, pois, pensas tu tal coisa contra o povo de Deus? Pois, falando o rei esta palavra, fica como culpado, visto que o rei não torna a trazer o seu desterrado.
14 Porque certamente morreremos, e seremos como águas derramadas na terra, que não se podem ajuntar mais; Deus, todavia, não tira a vida, mas cogita meios para que não fique banido dele o seu desterrado.
15 E se eu agora vim falar esta palavra ao rei meu senhor, e porque o povo me atemorizou; pelo que dizia a tua serva: Falarei, pois, ao rei; porventura fará o rei segundo a palavra da sua serva.
16 Porque o rei ouvirá, para livrar a sua serva da mão do homem que intenta exterminar da herança de Deus tanto a mim como a meu filho.
17 Dizia mais a tua serva: Que a palavra do rei meu senhor me dê um descanso; porque como o anjo de Deus é o rei, meu senhor, para discernir o bem e o mal; e o Senhor teu Deus seja contigo.
18 Então respondeu o rei à mulher: Peço-te que não me encubras o que eu te perguntar. Tornou a mulher: Fale agora o rei meu senhor.
19 Perguntou, pois, o rei: Não é verdade que a mão de Joabe está contigo em tudo isso? Respondeu a mulher: Vive a tua alma, ó rei meu senhor, que ninguém se poderá desviar, nem para a direita nem para a esquerda, de tudo quanto diz o rei meu senhor; porque Joabe, teu servo, é quem me deu ordem, e foi ele que pôs na boca da tua serva todas estas palavras;
20 para mudar a feição do negócio é que Joabe, teu servo, fez isso. Sábio, porém, é meu senhor, conforme a sabedoria do anjo de Deus, para entender tudo o que há na terra.
21 Então o rei disse a Joabe: Eis que faço o que pedes; vai, pois, e faze voltar o mancebo Absalão.
22 Então Joabe se prostrou com o rosto em terra e, fazendo uma reverência, abençoou o rei; e disse Joabe: Hoje conhece o teu servo que achei graça aos teus olhos, ó rei meu senhor, porque o rei fez segundo a palavra do teu servo.
23 Levantou-se, pois, Joabe, foi a Gesur e trouxe Absalão para Jerusalém.
24 E disse o rei: Torne ele para sua casa, mas não venha à minha presença. Tornou, pois, Absalão para sua casa, e não foi à presença do rei.
25 Não havia em todo o Israel homem tão admirável pela sua beleza como Absalão; desde a planta do pé até o alto da cabeça não havia nele defeito algum.
26 E, quando ele cortava o cabelo, o que costumava fazer no fim de cada ano, porquanto lhe pesava muito, o peso do cabelo era de duzentos siclos, segundo o peso real.
27 Nasceram a Absalão três filhos, e uma filha cujo nome era Tamar; e esta era mulher formosa à vista.
28 Assim ficou Absalão dois anos inteiros em Jerusalém, sem ver a face do rei.
29 Então Absalão mandou chamar Joabe, para o enviar ao rei; porém Joabe não quis vir a ele. Mandou chamá-lo segunda vez, mas ele não quis vir.
30 Pelo que disse aos seus servos: Vede ali o campo de Joabe pegado ao meu, onde ele tem cevada; ide, e ponde-lhe fogo. E os servos de Absalão puseram fogo ao campo:
31 Então Joabe se levantou, e veio ter com Absalão, em casa, e lhe perguntou: Por que os teus servos puseram fogo ao meu campo.
32 Respondeu Absalão a Joabe: Eis que enviei a ti, dizendo: Vem cá, para que te envie ao rei, a dizer-lhe: Para que vim de Gesur? Melhor me fora estar ainda lá. Agora, pois, veja eu a face do rei; e, se há em mim alguma culpa, que me mate.
33 Foi, pois, Joabe à presença do rei, e lho disse. Então o rei chamou Absalão, e ele entrou à presença do rei, e se prostrou com o rosto em terra diante do rei; e o rei beijou Absalão.” (II Sm 14.1-33).


II Samuel 15

A Revolta de Absalão

Nós vemos no 15º capítulo de 2 Samuel, que quando Davi permitiu a Absalão que formasse o grande cortejo que ia adiante dele anunciando a sua presença (v. 1), deve ter consentido nisto por pensar que aquilo traria de alguma forma honra e glória ao reino de Israel, sem saber das verdadeiras intenções de seu filho, cujo nome Absalão, significa “a paz do seu pai”, e no entanto foi o filho que traria as maiores dificuldades vividas por Davi.
Os pais cometem grande erro quando alimentam ou contribuem para as manifestações orgulhosas de seus filhos, porque o orgulho arruína os jovens muito mais do que qualquer luxúria.
Estava armado o palco do drama que Davi viveria em razão do seu pecado com Bate-Seba, conforme a palavra de juízo do Senhor contra ele através do profeta Natã.
Durante quatro anos Absalão se postava todas as manhãs junto à porta da cidade de Jerusalém, porque no passado, os juízos eram dados junto ao portão pelos anciãos das cidades.
Com adulações e doces palavras, conquistava o coração do povo afirmando ser justa a causa de todos que o procuravam, mas lamentava não ter o poder necessário para fazer valer o direito de cada um daqueles que o procuravam.
Com isto, conseguiu grande popularidade naqueles quatro anos, e gerou no povo a necessidade e a expectativa de conduzi-lo ao poder supremo, para verem atendidas as suas demandas.
Ao mesmo tempo, Absalão obtinha junto à corte grande prestígio, através de uma fingida lealdade ao rei, tanto que obteve permissão de Davi para ser acompanhado por uma comitiva de 200 homens notáveis do reino, num alegado e falso cumprimento de voto, que disse ter feito quando se encontrava em Gesur, na Síria, e que deveria ser cumprido em Hebrom (v. 7 a 11).
Estes 200 homens acompanharam-no sem saberem das suas reais intenções, e para aumentar ainda mais a falsa impressão de que os líderes de Israel haviam se unido a ele para constitui-lo rei em Hebrom, pela deposição e morte de Davi, mandou chamar Aitofel para estar com ele em Hebrom, porque era o homem com maior sabedoria política no reino e o principal conselheiro de Davi, tanto nas questões religiosas quanto civis (v. 12).
Ao mesmo tempo mandou mensageiros por todas as tribos de Israel, que deveriam dizer que ele reinava em Hebrom, quando ouvissem o som das trombetas (v. 10).
E a conspiração cresceu e era grande o número de pessoas que tomava o partido de Absalão (v. 12b).
Tudo isto estava acontecendo apesar de todo o grande bem que Deus estava fazendo a Israel por amor de Davi.
De igual modo, as massas de Israel procederam em relação a Jesus rejeitando-o e escolhendo a Barrabás, e não somente isto, como também procurando a sua morte, como os israelitas que seguiam a Absalão estavam procurando matar a Davi.
Absalão escolheu Hebrom como o seu quartel general, porque era oriundo daquela cidade e devia contar com um grande número de adeptos na mesma.
Quando a conspiração foi informada a Davi ele não decidiu permanecer em Jerusalém, e lutar contra eles, mas fugiu da cidade (v. 14), certamente para evitar uma guerra civil e não expor Jerusalém à destruição.
O principal motivo de sua fuga deve ter sido o seu reconhecimento, que aquela tribulação estava vindo sobre ele por permissão do Senhor, em razão do cumprimento da profecia que lhe fora transmitida por Natã, e assim, não estava se submetendo às forças que se encontravam com Absalão, mas ao potente braço do Senhor, que não era com ele naquela hora difícil, quanto a impedir tudo aquilo que estava ocorrendo.
E na fuga, deixou dez de suas concubinas em Jerusalém, para cuidarem da casa (v. 16) e foram estas mulheres que viriam a ser abusadas por Absalão, seguindo o conselho que lhe fora dado por Aitofel (v. 20 a 23), não por motivações lascivas, senão políticas, de maneira que manifestasse a todo Israel até que ponto estava decidido em tomar o lugar do seu pai, e que não recuaria na decisão de matá-lo.
Mas, como sucede em todas as provações dos cristãos, Deus também provê a eles alívio e escape em meio às aflições que possam sofrer.
Nós vemos isto naqueles que foram mantidos por Deus fiéis a Davi, inclusive seiscentos homens filisteus, de Gate, sob a liderança de Itai, da mesma cidade de Gate.
Estes se converteram ao Deus de Israel por todas as Suas obras que testemunharam e pela devoção a Ele que viram em Davi, quando estivera entre eles fugindo de Saul.
Tal era a fidelidade destes homens que permaneceram junto a Davi e se recusaram a retornar à sua própria terra.
As palavras de Itai a Davi que lemos no verso 21, nos fazem lembrar as palavras que Rute dirigiu a Noemi. E assim eles decidiram permanecer com Davi quando ele se dirigia para o deserto (v. 23).
Os sacerdotes e levitas também permaneceram leais a Davi (v. 24) porque conheciam a sua devoção ao Senhor, e o quanto estimava e honrava o seu ofício, e nada disto era visto por eles em Absalão.
Abiatar era o sumo-sacerdote e Zadoque o principal depois dele, sendo que Zadoque era também vidente (v. 26), como se costumava designar os profetas.
Eles trouxeram a arca com a comitiva que seguia Davi até que todos tivessem saído da cidade, mas atendendo a ordens diretas de Davi a eles, retornaram a Jerusalém com a arca, tanto para preservá-la dos desatinos de Absalão, quanto para mantê-lo informado enquanto estivesse ausente, enviando-lhe mensagens por seus filhos Aimaás (de Zadoque), e Jônatas (de Abiatar) (v. 36).
E Davi pediu a Husai que se juntasse a eles em Jerusalém, porque certamente este viera ter com ele da parte de Deus, ainda que não o soubesse, em resposta à oração espontânea, que fizera, para que Deus confundisse o aconselhamento que Aitofel daria a Absalão (v. 31).
Logo no verso 32, seguinte àquele em que aparece a sua oração (v. 31) nós vemos Husai vindo ao seu encontro quando chegou ao cume do monte das Oliveiras, no qual se costumava adorar a Deus (v. 30, 32).
Este Husai era outro grande especialista nos assuntos de governo e seria o instrumento usado por Deus para derrotar Aitofel, e Davi teve inteligência espiritual suficiente para reconhecer que Husai lhe fora enviado pelo Senhor como resposta à oração que lhe havia feito (v. 34).
Husai chegou à cidade de Jerusalém a tempo, antes de que Absalão se dirigisse a ela (v. 37), de modo que isto não despertaria a sua desconfiança de que aqueles que lá se encontravam, ainda permaneciam de algum modo leais a Davi.
Assim, Abiatar, Zadoque e Husai deveriam enganar sem que fossem homens dados à prática do engano.
Eles teriam que agir assim naquela situação excepcional de ameaça de guerra, como estrategistas a serviço do seu rei.
Eles deveriam fingir que eram leais a Absalão, para que Israel pudesse voltar a prestar lealdade ao rei, que era leal a Deus e o seu escolhido para governá-los.
Estes homens estavam sendo empenhados em estratagemas de guerra, de modo que as suas ações não seriam consideradas como um pecado aos olhos de Deus.
Assim como Absalão havia dissimulado e enganado o seu próprio pai, ele também seria enganado pelos homens que estariam ao seu lado, dissimulando serem fiéis a ele.
Neste caso estaria sendo aplicada a lei do olho por olho, que vigorava naquela dispensação.


“1 Aconteceu depois disso que Absalão adquiriu para si um carro e cavalos, e cinquenta homens que corressem adiante dele.
2 E levantando-se Absalão cedo, parava ao lado do caminho da porta; e quando algum homem tinha uma demanda para, vir ao rei a juízo, Absalão o chamava a si e lhe dizia: De que cidade és tu? E, dizendo ele: De tal tribo de Israel é teu servo;
3 Absalão lhe dizia: Olha, a tua causa é boa e reta, porém não há da parte do rei quem te ouça.
4 Dizia mais Absalão: Ah, quem me dera ser constituído juiz na terra! para que viesse ter comigo todo homem que tivesse demanda ou questão, e eu lhe faria justiça.
5 Sucedia também que, quando alguém se chegava a ele para lhe fazer reverência, ele estendia a mão e, pegando nele o beijava.
6 Assim fazia Absalão a todo o Israel que vinha ao rei para juízo; desse modo Absalão furtava o coração dos homens de Israel.
7 Aconteceu, ao cabo de quatro anos, que Absalão disse ao rei: Deixa-me ir pagar em Hebrom o voto que fiz ao Senhor.
8 Porque, morando eu em Gesur, na Síria, fez o teu servo um voto, dizendo: Se o Senhor, na verdade, me fizer tornar a Jerusalém, servirei ao Senhor.
9 Então lhe disse o rei: Vai em paz. Levantou-se, pois, e foi para Hebrom.
10 Absalão, porém, enviou emissários por todas as tribos de Israel, dizendo: Quando ouvirdes o som da trombeta, direis: Absalão reina em Hebrom.
11 E de Jerusalém foram com Absalão duzentos homens que tinham sido convidados; mas iam na sua simplicidade, pois nada sabiam daquele desígnio.
12 Também Absalão, enquanto oferecia os seus sacrifícios, mandou vir da cidade de Siló, Aitofel, o gilonita, conselheiro de Davi. E a conspiração tornava-se poderosa, crescendo cada vez mais o número do povo que estava com Absalão.
13 Então veio um mensageiro a Davi, dizendo: O coração de todo o Israel vai após Absalão.
14 Disse, pois, Davi a todos os seus servos que estavam com ele em Jerusalém: Levantai-vos, e fujamos, porque doutra forma não poderemos escapar diante de Absalão. Apressai-vos a sair; não seja caso que ele nos apanhe de súbito, e lance sobre nós a ruína, e fira a cidade ao fio da espada.
15 Então os servos do rei lhe disseram: Eis aqui os teus servos para tudo quanto determinar o rei, nosso senhor.
16 Assim saiu o rei, com todos os de sua casa, deixando, porém, dez concubinas para guardarem a casa.
17 Tendo, pois, saído o rei com todo o povo, pararam na última casa:
18 E todos os seus servos iam ao seu lado; mas todos os quereteus, e todos os peleteus, e todos os giteus, seiscentos homens que o seguiram de Gate, caminhavam adiante do rei.
19 Disse o rei a Itai, o giteu: Por que irias tu também conosco? Volta e fica-te com o rei, porque és estrangeiro e exilado; torna a teu lugar.
20 Ontem vieste, e te levaria eu hoje conosco a vaguear? Pois eu vou para onde puder ir; volta a Leí, e contigo teus irmãos; a misericórdia e a fidelidade sejam contigo.
21 Respondeu, porém, Itai ao rei, e disse: Vive o Senhor, e vive o rei meu senhor, que no lugar em que estiver o rei meu senhor, seja para morte, seja para vida, aí estará também o teu servo.
22 Então disse Davi a Itai: Vai, pois, e passa adiante. Assim passou Itai, o giteu, e todos os seus homens, e todos os pequeninos que havia com ele.
23 Toda a terra chorava em alta voz, enquanto todo o povo passava; e o rei atravessou o ribeiro de Cedrom, e todo o povo caminhava na direção do deserto.
24 E chegou Abiatar; e veio também Zadoque, e com ele todos os levitas que levavam a arca do pacto de Deus; e puseram ali a arca de Deus, até que todo o povo acabou de sair da cidade.
25 Então disse o rei a Zadoque: Torna a levar a arca de Deus à cidade; pois, se eu achar graça aos olhos do Senhor, ele me fará voltar para lá, e me deixará ver a arca e a sua habitação.
26 Se ele, porém, disser: Não tenho prazer em ti; eis-me aqui, faça a mim o que bem lhe parecer.
27 Disse mais o rei a Zadoque, o sacerdote: Não és tu porventura vidente? volta, pois, para a cidade em paz, e contigo também teus dois filhos, Aimaás, teu filho, e Jônatas, filho de Abiatar.
28 Vede eu me demorarei nos vaus do deserto até que tenha notícias da vossa parte.
29 Zadoque, pois, e Abiatar tornaram a levar para Jerusalém a arca de Deus, e ficaram ali.
30 Mas Davi, subindo pela encosta do monte das Oliveiras, ia chorando; tinha a cabeça coberta, e caminhava com os pés descalços. Também todo o povo que ia com ele tinha a cabeça coberta, e subia chorando sem cessar.
31 Então disseram a Davi: Aitofel está entre os que conspiraram com Absalão. Pelo que disse Davi: Ó Senhor, torna o conselho de Aitofel em loucura!
32 Ora, aconteceu que, chegando Davi ao cume, onde se costumava adorar a Deus, Husai, o arquita, veio encontrar-se com ele, com a roupa rasgada e a cabeça coberta de terra.
33 Disse-lhe Davi: Se fores comigo, ser-me-ás pesado;
34 porém se voltares para a cidade, e disseres a Absalão: Eu serei, ó rei, teu servo; como fui dantes servo de teu pai, assim agora serei teu servo; dissipar-me-ás então a conselho de Aitofel.
35 E não estão ali contigo Zadoque e Abiatar, sacerdotes? Portanto, tudo o que ouvires da casa do rei lhes dirás.
36 Eis que estão também ali com eles seus dois filhos, Aimaás, filho de Zadoque, e Jônatas, filho de Abiatar; por eles me avisareis de tudo o que ouvirdes.
37 Husai, pois, amigo de Davi, voltou para a cidade. E Absalão entrou em Jerusalém.” (II Sm 15.1-37).



II Samuel 16

Davi Enganado por Ziba

Não podemos dizer que o fato de Davi ter sido ludibriado por Ziba, como se vê no 16º capítulo de 2 Samuel, foi uma retribuição da parte de Deus pelo fato de ter enganado a Absalão através de Husai, Zadoque e Abiatar, mas certamente, tudo o que estava ocorrendo com ele para afligir a sua alma vinha da parte do Senhor como retribuição por ter enganado Urias, não somente em relação à sua esposa, quanto à sua própria vida, pois fez com que fosse o portador da carta que deveria ser entregue a Joabe, que continha ordens específicas para que ele fosse morto.
E agora Davi estava experimentando das mãos do Senhor a dor que há em ser traído e enganado, não somente por Ziba, mas pelo próprio povo e pelos seus oficias que seguiam Absalão, inclusive Aitofel, que era pessoa de sua confiança.
Até com uma suposta falsa traição, Davi foi enganado e sofreu muito por uma alegada ingratidão e traição de Mefibosete, da qual lhe falara Ziba, que veio ao seu encontro, quando  estava atravessando o outro lado da encosta do monte das Oliveiras, trazendo provisões para ele e seus homens.
Ziba lhe mentiu dizendo que Mefibosete se recusara a acompanhá-lo em sua fuga, permanecendo em Jerusalém, porque havia dito que naquele dia a casa de Israel lhe restituiria o reino que pertencia por direito a seu pai (v. 3).
Davi, sem saber que estava sendo enganado, decidiu precipitadamente transferir as propriedades de Mefibosete para a posse de Ziba (v. 4).
Ele tomaria mais tarde providências para reparar a injustiça que fizera a Mefibosete (19.29), quando tomou conhecimento da verdade.
Quando Davi estava ainda se deslocando em sua fuga, veio ao seu encontro um parente de Saul, chamado Simei, que atirava pedras em sua direção, ainda que bastante fora do seu alcance, e o amaldiçoava com duras e falsas afirmações acusando Davi de ser homem sanguinário, por ter exterminado a casa de Saul, e que o que ele estava sofrendo era um justo juízo de Deus, que estava transferindo o seu reino para Absalão.
Nós já comentamos anteriormente todo o bem que Davi fizera não somente a Saul como a toda a sua casa.
Mas assim mesmo ele se humilhou debaixo da potente mão de Deus, considerando que aquela aflição era também consequência do juízo que o Senhor havia proferido sobre ele, e assim, não permitiu que os seus homens matassem Simei, conforme desejava Abisai, irmão de Joabe.
É digno de registro as palavras que Davi proferiu na ocasião: “Que tenho eu convosco, filhos de Zeruia? Por ele amaldiçoar e por lhe ter dito o Senhor: Amaldiçoa a Davi; quem dirá: Por que assim fizeste?” (v. 10).
É um exemplo para nós o modo como ele se comportou debaixo daquela aflição, não retribuindo mal com mal e injúria com injúria, pois disse: “Porventura o Senhor olhará para a minha aflição, e me pagará com bem a maldição deste dia.” (v. 12).
Nos versos 15 a 19 nós encontramos um relato do diálogo havido entre Absalão e Husai e o modo como este o enganou protestando que havia abandonado Davi para se juntar a ele.
Absalão deve ter se sentido absolutamente seguro por ter do seu lado os dois melhores conselheiros de Israel, sendo que os conselhos de Aitofel era tão profundos, que eram considerados como se fosse uma resposta de Deus a uma consulta que lhe fosse feita (v. 23)
Foi confiando no que ele dizia que Absalão não hesitou em se deitar com as dez concubinas de seu pai, à vista de todo Israel (v. 20 a 22).
Isto estava dando cumprimento à profecia de Natã (12.11), e não podemos pensar que foi o próprio Deus quem lhe inspirara a fazer tal abominação porque Ele a ninguém tenta.
Em II Sm 12.11, onde esta profecia está registrada, é dito pelo Senhor que Ele suscitaria o mal contra Davi para que isto ocorresse, a saber, ele seria entregue a Satanás para juízo do seu pecado, e assim não poderia contar com a assistência da graça do Senhor, para impedir este mal que seria produzido por inspiração de espíritos malignos, e que certamente viria sobre ele, conforme Deus conheceu em Sua presciência, sobre o que estava sendo forjado no inferno desde que ele pecara com Bate-Seba.
Quando o cristão comete o pecado ele abre uma porta para a atuação do inferno e é a isto que o apóstolo Paulo chama de dar lugar ao diabo.
Ele diz em Ef 4.26,27: “ Irai-vos, e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira; nem deis lugar ao Diabo.”.
O que ele está dizendo é que se praticamos os pecados que ele relaciona neste capitulo de Efésios, nós estamos abrindo uma porta para que o diabo acesse às nossas vidas e realize o mal que tiver intentado contra nós, porque seremos deixados à mercê da sua maldade pelo próprio Deus, naquilo que lhe for permitido que nos faça, em razão dos nossos pecados.
Não se pode falar sobre isto como direito legal do diabo, ou que o Senhor esteja associado a ele, mas como direito legal de Deus em permitir que sejamos entregues ao Inimigo, como forma de sermos corrigidos e desestimulados de continuarmos na prática do mal.
Porque, como vimos antes, Deus estabelece os Seus juízos contra a maldade, porque é o Criador e sustentador da criação, que não pode ser mantida senão somente pelo bem.
Afinal, o ministério do mal, representado no seu maior grau, na pessoa do próprio diabo, é o de roubar, matar e destruir. Justamente o oposto do ministério do Filho Unigênito de Deus, nosso Senhor Jesus Cristo, que sendo Criador, é somente o de dar vida e vida em abundância.
Portanto, quando Ele está permitindo ou realizando juízos de destruição sobre o mal, é para garantir a preservação da vida e do bem.


“1 Tendo Davi passado um pouco além do cume, eis que Ziba, o moço de Mefibosete, veio encontrar-se com ele, com um par de jumentos albardados, e sobre eles duzentos pães, cem cachos de passas, e cem de frutas de verão e um odre de vinho.
2 Perguntou, pois, o rei a Ziba: Que pretendes com isso? Respondeu Ziba: Os jumentos são para a casa do rei, para se montarem neles; e o pão e as frutas de verão para os moços comerem; e o vinho para os cansados no deserto beberem.
3 Perguntou ainda o rei: E onde está o filho de teu senhor? Respondeu Ziba ao rei: Eis que permanece em Jerusalém, pois disse: Hoje a casa de Israel me restituirá o reino de meu pai.
4 Então disse o rei a Ziba: Eis que tudo quanto pertencia a Mefibosete é teu. Ao que Ziba, inclinando-se, disse: Que eu ache graça aos teus olhos, ó rei meu senhor.
5 Tendo o rei Davi chegado a Baurim, veio saindo dali um homem da linhagem da casa de Saul, cujo nome era Simei, filho de Gêra; e, adiantando-se, proferia maldições.
6 Também atirava pedras contra Davi e todos os seus servos, ainda que todo o povo e todos os valorosos iam à direita e à esquerda do rei.
7 E, amaldiçoando-o Simei, assim dizia: Sai, sai, homem sanguinário, homem de Belial!
8 O Senhor te deu agora a paga de todo o sangue da casa de Saul, em cujo lugar tens reinado; já entregou o Senhor o reino na mão de Absalão, teu filho; e eis-te agora na desgraça, pois és um homem sanguinário.
9 Então Abisai, filho de Zeruia, disse ao rei: Por que esse cão morto amaldiçoaria ao rei meu senhor? Deixa-me passar e tirar-lhe a cabeça.
10 Disse, porém, o rei: Que tenho eu convosco, filhos de Zeruia? Por ele amaldiçoar e por lhe ter dito o Senhor: Amaldiçoa a Davi; quem dirá: Por que assim fizeste?
11 Disse mais Davi a Abisai, e a todos os seus servos: Eis que meu filho, que saiu das minhas entranhas, procura tirar-me a vida; quanto mais ainda esse benjamita? Deixai-o; deixai que amaldiçoe, porque o Senhor lho ordenou.
12 Porventura o Senhor olhará para a minha aflição, e me pagará com bem a maldição deste dia.
13 Prosseguiam, pois, o seu caminho, Davi e os seus homens, enquanto Simei ia pela encosta do monte, defronte dele, caminhando e amaldiçoando, e atirava pedras contra ele, e levantava poeira.
14 E o rei e todo o povo que ia com ele chegaram cansados ao Jordão; e ali descansaram.
15 Absalão e todo o povo, os homens de Israel, vieram a Jerusalém; e Aitofel estava com ele.
16 E chegando Husai, o arquita, amigo de Davi, a Absalão, disse-lhe: Viva o rei, viva o rei!
17 Absalão, porém, perguntou a Husai: E esta a tua benevolência para com o teu amigo? Por que não foste com o teu amigo?
18 Respondeu-lhe Husai: Não; pois aquele a quem o Senhor, e este povo, e todos os homens de Israel têm escolhido, dele serei e com ele ficarei.
19 E, demais disto, a quem serviria eu? Porventura não seria a seu filho? como servi a teu pai, assim servirei a ti.
20 Então disse Absalão a Aitofel: Dai o vosso conselho sobre o que devemos fazer.
21 Respondeu Aitofel a Absalão: Entra às concubinas de teu pai, que ele deixou para guardarem a casa; e assim todo o Israel ouvirá que te fizeste aborrecível para com teu pai, e se fortalecerão as mãos de todos os que estão contigo.
22 Estenderam, pois, para Absalão uma tenda no terraço; e entrou Absalão às concubinas de seu pai, à vista de todo o Israel.
23 E o conselho que Aitofel dava naqueles dias era como se o oráculo de Deus se consultara; tal era todo o conselho de Aitofel, tanto para com Davi como para Absalão.” (II Sm 16.1-23).




II Samuel 17

Deus Confunde os Sábios Segundo o Mundo

É comum muitos se justificarem em seus pecados comparando-se com Davi, dizendo que ele havia adulterado e no entanto continuou debaixo do favor de Deus.
Todavia, se esquecem que quase a metade do livro de 2 Samuel, foi escrita, por inspiração do Espírito Santo, justamente para relatar as terríveis consequências dos juízos de Deus que vieram sobre Davi, em razão deste seu pecado.
Cremos também que o registro sagrado quis também marcar o modo submisso como Davi se submeteu a todos estes juízos de Deus, nunca deixando de declarar que o Senhor estava sendo justo em tudo o que lhe estava sucedendo.
Isto está registrado para o nosso exemplo, porque convém imitá-lo neste aspecto, porque estamos muito mais para as contradições de um Davi, do que para toda a fidelidade de um Moisés.
O primeiro conselho dado por Aitofel a Absalão foi executado por ele, conforme vimos no capítulo anterior a este 17º de 2 Samuel, que estaremos comentando, deitando-se com as concubinas, que seu pai havia deixado em Jerusalém para cuidarem da sua casa.
Agora, neste capítulo 17º vemos o conselho que ele deu em relação ao modo como Davi deveria ser enfrentado.
Aitofel não propôs uma guerra civil num confronto aberto de tropas, mas que Absalão lhe deixasse recrutar um regimento de 12.000 homens com os quais perseguiria pessoalmente naquela mesma noite e concentraria o seu ataque apenas sobre o próprio rei, que àquela altura deveria estar exausto e aturdido, e mataria apenas a ele, de modo que o restante do povo, que se encontrava em sua companhia fosse poupado, e seria unido a Absalão depois que Davi fosse morto (v. 1 a 3).
O parecer de Aitofel agradou a Absalão e aos anciãos de Israel (v.4).
E caso a Providência divina não livrasse Davi por uma intervenção direta, e se tal parecer fosse levado à execução, certamente ele teria sido morto, porque se encontrava de fato exausto bem como todo o povo que estava com ele, quando chegou ao Jordão (v. 14) e ele não estava ainda preparado para resistir a um ataque de tal proporção naquele momento.
Mas aprouve a Deus livrar Davi por meio da intervenção de Husai, e com isto estaria estabelecendo um juízo sobre o orgulho de Absalão e do próprio Aitofel, revelando o Seu poder de mover os corações dos homens.
Ele marcaria no exemplo do que faria a Absalão, que é vão confiar no homem, quando não se tem a direção dEle, e a que estão sujeitos todos aqueles que não colocam a Sua confiança no Senhor.
Ao mesmo tempo Ele revelaria que não aprova as ações dos ímpios, e que é contra aqueles que praticam males, antes ajuda aos que praticam a justiça, estando os seus olhos sobre eles para livrá-los do mal (I Pe 3.12).
Deus não havia permitido que todo o mal que havia proferido pela boca de Natã, viesse a Davi no período de pelo menos nove meses, em que permaneceu endurecido no seu pecado com Bate-Seba, porque não teria a graça do Senhor ao seu lado nas provações que teria que enfrentar, por causa da falta de arrependimento, pelo pecado que havia cometido.
Mas tendo confessado o seu pecado, e sendo restaurado a sua comunhão com o Senhor, poderia ser submetido às provações que haviam sido profetizadas.
É por isso que o apóstolo Paulo afirma o que nós lemos em I Cor 10.13, que juntamente com a provação Deus provê também o escape.
A provação que é para correção não visa de modo nenhum à nossa destruição, e isto se comprova na vida prática dos cristãos, que são poupados pelo Senhor de serem provados com situações para as quais não estão em condições de enfrentar, mas Ele o fará certamente no momento apropriado para o nosso próprio aproveitamento, de modo que possamos compartilhar da Sua santidade (Hb 12.10).
Caberia a Husai destruir os argumentos de Aitofel, de modo que Davi ganhasse tempo para se organizar e reunir em torno de si um maior número de guerreiros; que Absalão fosse conduzido ao campo de batalha de maneira que se expusesse à morte e não conduzisse o exército com a mesma habilidade estratégica com que Aitofel certamente o faria, porque Absalão era inexperiente na arte da guerra, e então Husai usou de muita sabedoria no conselho que deu porque não desprezou Aitofel, e satisfez ao seu orgulho dizendo que sempre havia aconselhado com sabedoria e precisão, mas naquele caso o seu parecer não era bom, e passou a expor as razões de ter feito tal consideração: em primeiro lugar ele realçou o valor dos homens que estavam com Davi e a sua experiência na guerra, e a astúcia do próprio Davi, que certamente teria montado uma emboscada para eles, e caso se saísse vencedor na primeira batalha, todo o Israel se juntaria a ele e abandonaria Absalão.
Ele valorizou assim e superestimou as forças do rei que Aitofel havia subestimado pretendendo combatê-lo com apenas 12.000 homens, com os quais não haviam combatido antes, tal como Davi em relação aos homens que estavam ao seu lado, dispostos a darem suas vidas por ele.
A força de Absalão foi diminuída por ele e a de Davi exaltada.
Ele prosseguiu dizendo que Absalão deveria ganhar tempo para aumentar o número de homens do seu exército e que ele próprio deveria marchar à frente deles, para que a honra da vitória não fosse atribuída a um outro (no caso Aitofel que pretendia comandar o exército), senão ao próprio rei, que com isso receberia honra e glória do povo sendo confirmado em seu trono.
Agora Husai estava manipulando habilmente o orgulho de Absalão, de tal maneira que ele viesse a ser traído pelo mesmo.
E todos concordaram que o parecer de Husai era melhor do que o de Aitofel, porque, como se afirma no verso 14: “Porque assim o Senhor o ordenara, para aniquilar o bom conselho de Aitofel, a fim de trazer o mal sobre Absalão.”.
Husai expôs a situação a Abiatar e Zadoque para que Davi fosse informado, e que passasse para o outro lado do Jordão (v. 15,16).
Os filhos de Zadoque (Aimaás) e de Abiatar (Jônatas) foram encarregados de transmitirem tais notícias a Davi, conforme havia sido combinado anteriormente, e o rei e todos os que estavam com ele atravessaram o Jordão, chegando a Maanaim (v. 24).
Nós vemos que os dois sacerdotes tiveram que enfrentar dificuldades para poderem levar as boas novas ao rei, e isto parece ilustrar o modo normal da pregação do evangelho, que é a boa nova da salvação, porque sempre será em meio a lutas espirituais, em que o Inimigo apresenta forte oposição, que os cristãos terão que fazê-lo, mas assim como Aimaás e Jônatas triunfaram sobre os seus inimigos, pelo livramento que o Senhor preparou para eles, de igual modo os cristãos também triunfarão porque têm recebido do Senhor a promessa de que nunca serão abandonados por Ele, e que sempre contarão com a Sua proteção.
Tendo sido derrotado por Husai, Aitofel retornou à sua casa e cidade, colocou em ordem os seus negócios e se enforcou (v. 23).
Tal como o diabo operou na mente de Judas colocando nele o desejo de se suicidar depois de ter traído Jesus, também operou na mente de Aitofel, que se suicidou depois de ter traído Davi.
A sua sabedoria não foi suficiente para livrá-lo do tormento que Deus permitiu que o diabo trouxesse sobre ele.
O seu próprio orgulho foi a arma que o entregou ao laço de morte do Maligno.
Satanás tem de fato o propósito permanente de roubar, matar e destruir, e não perde uma só oportunidade que lhe seja dada para fazê-lo.
É tão grande o ódio que ele tem a Deus e aos homens que ele criou à Sua imagem e semelhança, que nunca consegue deixar de seguir a sua vocação de roubar, matar e destruir, ainda que saiba que esteja contribuindo indiretamente com isto com o cumprimento dos propósitos de Deus nos juízos que Ele tem estabelecido.
É como o abrir das comportas de uma represa que contém todo o ódio que carrega no seu interior.
Uma vez aberta a comporta as águas lodosas da maldade fluem sem que haja o que possa detê-las, senão somente uma intervenção direta da parte do Senhor.
Isto nos dá conta da magnitude e extensão dos livramentos que Deus opera continuamente em benefício da humanidade.
De outro modo não restaria um só homem em toda a face da terra, há muito tempo.
Se Aitofel tivesse vivido de acordo com o conselho que Deus nos dá através da boca do profeta Jeremias, em Jer 9.27, ele teria sido preservado e teria colocado os talentos que Deus lhe havia dado, a serviço da justiça e não da iniquidade, em busca da própria glória pessoal, que lhe tendo sido furtada, não encontrou mais motivo para viver, e certamente temeu em seu orgulho morrer, de modo desonroso nas mãos dos homens de Davi, que ele sabia, que se sairia vencedor sobre as forças de Absalão.
Então preferiu fazê-lo com as suas próprias mãos.
Ele deve ter pensado que com a sua morte estava se vingando do mundo que não era digno de ter um homem tão sábio.
Ele pensava que ao morrer, morreria também com ele a sabedoria.
Aitofel não estava empenhado no bom combate da fé, porque era um hipócrita e assim foi subjugado pelo mal e vencido por ele.
Ele não era um verdadeiro crente apesar de todo o seu conhecimento da Lei e de ter privado de uma íntima amizade com Davi.
Na verdade, ele devia odiar a devoção de Davi ao Seu Deus e à Sua Lei, e este deve ter sido o maior motivo de ter se voltado para Absalão, que era um homem ímpio tal como ele.
O ímpio odeia a Lei de Deus, porque ela é imutável, assim como o Senhor é imutável.
Se ele pudesse mudar a Lei talvez se voltasse para Deus, mas como a Lei é imutável, não resta nenhuma parte para ele legislar, de modo diferente do que está nela contido e não lhe resta nenhuma outra alternativa, senão a de se submeter ao que ela prescreve.
Homens de Deus podem e amam fazê-lo, mas os ímpios o detestam porque desejam ser os únicos senhores da sua vontade.
Eles são indomáveis, e é por isto que por fim são destruídos por Satanás, por ficarem fora da esfera de proteção divina, sendo ainda sujeitados a um juízo de condenação eterna.
Este era o verdadeiro problema com Aitofel e Judas.
Eles eram pessoas não convertidas. Amavam a impiedade e foram alcançados por ela.
Todo o mal que Aitofel desejou a Davi acabou recaindo sobre ele mesmo.
Os céus e a terra passarão porque são mutáveis, mas as palavras do Senhor jamais passarão porque são imutáveis.
Aitofel amava ter a sua própria legislação e queria impor pelo seu orgulho uma legislação que alterasse em ordem tudo o que estava na Lei de Deus, e foi por este motivo que ele aconselhou Absalão a adulterar com as concubinas de seu pai, pois a Aitofel nada dizia a Lei contra o adultério, bem como dispôs Absalão a permanecer em rebelião contra o seu pai, porque de igual modo nada lhe dizia a Lei de os filhos honrarem a seus pais, e também de intentar matar a Davi, porque também nada lhe dizia a Lei que proíbe o homicídio e a de submissão às autoridades constituídas.
Na verdade, este é o grande e maior problema do mundo sem Cristo, nem tanto porque legislam sobre aquilo que é necessário legislar, para se ter em boa ordem a administração da vida, em todas as nações, mas porque não legislam segundo os preceitos eternos e imutáveis descritos por Deus na Sua Palavra.
Mas todos eles terão que prestar contas ao grande Juiz no dia do juízo, e serão arruinados tal como fora Aitofel.  
  E tal é o apreço que Deus dá à Sua Lei, que a escreve nas mentes e corações dos seus filhos (Jer 31.33). E faz o Espírito Santo habitar neles de forma que possam amar a Sua lei.
Como o homem natural não está habilitado a guardar uma lei que é espiritual, ele é convertido pelo mesmo Espírito Santo em homem espiritual, de modo que possa corresponder ao propósito de Deus.
O coração de pedra é trocado por um coração de carne, porque a lei é viva como Deus é vivo, e não pode habitar na pedra, senão num coração vivo.
Por isso se afirma que o coração de pedra é mudado em coração de carne, de modo que possa ser a habitação do Deus vivo.  
 Aitofel não se permitiu ser dirigido pela lei de Deus, e acabou sendo dirigido pela lei do pecado, contra a qual o homem natural não tem nenhum poder em si mesmo para vencê-la.
Ela não é somente lei do pecado, mas também da morte, porque o pecado produz a morte.
Somente a lei do Espírito da vida em Cristo Jesus pode vencer esta lei do pecado e da morte.
Paulo nos ensina isto nos capítulos sétimo e oitavo da sua epístola aos Romanos.
Como Paulo deveríamos aprender a dizer: “Oh miserável homem que eu sou” (Rm 7.24), toda vez que sentíssemos o mal tentando se apoderar de nossas mentes e corações.
Quando Davi chegou a Maanaim, Absalão atravessou o Jordão e se acampou em Gileade, com o seu exército, sobre o qual constituiu como general a Amasa (v. 25,26), que era também sobrinho de Davi, tal como Joabe, pois era filho de Abigail, irmã de Davi, e Joabe era filho da outra irmã de Davi, chamada Zeruia (I Crôn 2.16,17).
Davi deu provas de ter sido justo para com as nações que havia subjugado, quando mesmo em seu exílio em Maanaim, recebeu provisões das mãos dos amonitas, bem como dos amigos que tinha em Lo-Debar e Rogelim (v. 27).



“1 Disse mais Aitofel a Absalão: Deixa-me escolher doze mil homens, e me levantarei, e perseguirei a Davi esta noite.
2 Irei sobre ele, enquanto está cansado, e fraco de mãos, e o espantarei: então fugirá todo o povo que está com ele. Ferirei tão-somente o rei;
3 e farei tornar a ti todo o povo, como uma noiva à casa do seu esposo; pois é a vida dum só homem que tu buscas; assim todo o povo estará em paz.
4 E este conselho agradou a Absalão, e a todos os anciãos de Israel.
5 Disse, porém, Absalão: Chamai agora a Husai, o arquita, e ouçamos também o que ele diz.
6 Quando Husai chegou a Absalão, este lhe disse: Desta maneira falou Aitofel; faremos conforme a sua palavra? Se não, fala tu.
7 Então disse Husai a Absalão: O conselho que Aitofel deu esta vez não é bom.
8 Acrescentou Husai: Tu bem sabes que teu pai e os seus homens são valentes, e que estão com o espírito amargurado, como a ursa no campo, roubada dos seus filhotes; além disso teu pai é homem de guerra, e não passará a noite com o povo.
9 Eis que agora está ele escondido nalguma cova, ou em qualquer outro lugar; e será que, caindo alguns no primeiro ataque, todo o que o ouvir dirá: Houve morticínio entre o povo que segue a Absalão.
10 Então até o homem valente, cujo coração é como coração de leão, sem dúvida desmaiará; porque todo o Israel sabe que teu pai é valoroso, e que são valentes os que estão com ele.
11 Eu, porém, aconselho que com toda a pressa se ajunte a ti todo o Israel, desde Dã até Berseba, em multidão como a areia do mar; e que tu em pessoa vás à peleja.
12 Então iremos a ele, em qualquer lugar em que se achar, e desceremos sobre ele, como o orvalho cai sobre a terra; e não ficará dele e de todos os homens que estão com ele nem sequer um só.
13 se ele, porém, se retirar para alguma cidade, todo o Israel trará cordas àquela cidade, e arrastá-la-emos até o ribeiro, até que não se ache ali nem uma só pedrinha
14 Então Absalão e todos os homens e Israel disseram: Melhor é o conselho de Husai, o arquita, do que o conselho de Aitofel: Porque assim o Senhor o ordenara, para aniquilar o bom conselho de Aitofel, a fim de trazer o mal sobre Absalão.
15 Também disse Husai a Zadoque e a Abiatar, sacerdotes: Assim e assim aconselhou Aitofel a Absalão e aos anciãos de Israel; porém eu aconselhei assim e assim.
16 Agora, pois, mandai apressadamente avisar a Davi, dizendo: Não passes esta noite nos vaus do deserto; mas passa sem falta à outra banda, para que não seja devorado o rei, e todo o povo que com ele está.
17 Ora, Jônatas e Aimaás estavam esperando junto a En-Rogel; e foi uma criada, e lhes avisou, para que eles fossem e o dissessem ao rei Davi; pois não deviam ser vistos entrando na cidade.
18 Viu-os todavia um moço, e avisou a Absalão. Ambos, porém, partiram apressadamente, e entraram em casa de um homem, em Baurim, o qual tinha no pátio de sua casa um poço, para o qual eles desceram.
19 E a mulher, tomando a tampa, colocou-a sobre a boca do poço, e espalhou grão triturado sobre ela; assim nada se soube.
20 Chegando, pois, os servos de Absalão àquela casa, perguntaram à mulher: Onde estão Aimaás e Jônatas? Respondeu-lhes a mulher: Já passaram a corrente das águas. E, havendo-os procurado sem os encontrarem, voltaram para Jerusalém.
21 Depois que eles partiram, Aimaás e Jônatas, saindo do poço, foram e avisaram a Davi; e disseram-lhe: Levantai-vos, e passai depressa as águas, porque assim e assim aconselhou contra vós Aitofel.
22 Então se levantou Davi e todo o povo que com ele estava, e passaram o Jordão; e ao raiar da manhã não faltava nem um só que não o tivesse passado.
23 Vendo, pois, Aitofel que não se havia seguido o seu conselho, albardou o jumento e, partindo, foi para casa, para a sua cidade; e, tendo posto em ordem a sua casa, se enforcou e morreu; e foi sepultado na sepultura de seu pai.
24 Então Davi veio a Maanaim; e Absalão passou o Jordão, ele e todos os homens de Israel com ele.
25 E Absalão colocou Amasa em lugar de Joabe sobre o exército. Ora, Amasa era filho de um homem que se chamava Itra, o jizreelita, o qual entrara a Abigail, filha de Naás e irmã de Zeruia, mãe de Joabe.
26 Israel e Absalão se acamparam na terra de Gileade.
27 Tendo Davi chegado a Maanaim, Sobi, filho de Naás, de Rabá dos filhos de Amom, e Maquir, filho de Amiel, de Lo-Debar, e Barzilai, o gileadita, de Rogelim,
28 tomaram camas, bacias e vasilhas de barro; trigo, cevada, farinha, grão tostado, favas, lentilhas e torradas;


29 mel, manteiga, ovelhas e queijos de vaca, e os trouxeram a Davi e ao povo que com ele estava, para comerem; pois diziam: O povo está faminto, cansado e sedento, no deserto.” (II Sm 17.1-29).


II Samuel 18

A morte de Absalão

Nós vimos no capitulo anterior a este 18º de 2 Samuel, que Deus havia transtornado o conselho de Aitofel, porque já tinha decidido que o mal sobreviesse contra Absalão (17.14).
Então Ele dispõe o coração de Davi a consentir com os seus oficiais, que não fosse pessoalmente ao campo de batalha, porque o Senhor sabia que ele tentaria impediria que Absalão fosse morto, contrariando assim o que já estava determinado por Deus.
Assim mesmo, Davi deu ordens especiais aos seus oficiais e soldados para que tratassem Absalão com brandura (v. 5).
Mas, o seu amor de pai não poderia sobrepujar a justiça de Deus, e desta forma prevaleceria o desígnio de Deus contra Absalão e não a vontade do rei, por mais que a sua vontade fosse honrada e estimada pelos seus homens.
Assim sucede na Igreja de Cristo, em que a Sua vontade sempre prevalecerá sobre os propósitos dos seus servos, mesmo daqueles que sejam os maiores amigos, como se viu por exemplo na separação de Paulo e Barnabé, que se encontrava certamente nos planos de Deus, para que especialmente Paulo pudesse estar à frente do apostolado entre os gentios.
A amizade de ambos não terminou, ainda que tenha ficado estremecida por algum tempo, mas eles já não poderiam atuar juntamente no ministério, do momento da separação deles em diante.
Os interesses do reino de Deus sempre prevalecerão sobre todos os nossos projetos e laços terrenos.
A luta entre o exército de Davi e o de Absalão se deu no bosque de Efraim, e a providência do Senhor fez com que o bosque fosse o maior inimigo dos homens de Absalão, tendo morrido 20.000 deles na batalha (v. 7,8).
Como que para revelar que Absalão havia se tornado uma abominação tanto para o céu quanto para a terra, o seu mulo em disparada deixou-o pendurado pela cabeça num carvalho e é bem provável que ele tenha sido impedido de se soltar da árvore por causa da longa cabeleira, da qual ele tanto se orgulhava, que deve ter ficado emaranhada aos galhos do carvalho, deixando-o suspenso entre o céu e a terra (v. 9), mas os homens de Davi temeram matá-lo por causa da ordem que este lhes dera em relação ao seu filho, mas quando Joabe foi informado do estado em que ele se encontrava, e do qual não conseguira se livrar, foi ter com ele e o transpassou com três flechas, mas não em nenhum dos seus órgãos vitais, de modo que ele experimentasse em seu corpo um pouco da dor que havia produzido na alma de seu pai (v.14), e também certamente para se vingar do prejuízo que ele lhe dera queimando o seu campo, e dizemos certamente porque a Bíblia revela claramente que Joabe possuía uma índole muito vingativa.
Depois disso dez dos soldados de Joabe cercaram Absalão e o mataram (v. 15). E o corpo de Absalão foi lançado numa cova e levantaram sobre ele um grande montão de pedras (v. 17), indicando o modo pelo qual ele merecia ter morrido, pois a lei determinava que os filhos que se rebelassem contra seus pais fossem mortos por apedrejamento.
Como que ironizando o modo pelo qual ele viria a ficar afamado, não somente em Israel mas em todos os lugares e épocas, como monumento da sua rebeldia e ruína, foi levantado sobre ele um montão de pedras, mas quando ele vivia mandou erigir uma coluna em sua própria honra, para perpetuar a sua fama e glória como rei na terra, pois não tinha filhos, e deu o seu próprio nome à coluna que passou a ser chamada por Monumento de Absalão (v.18).
Esta coluna não fazia honra ao que ele havia sido, senão o montão de pedras e a cova comum em que fora sepultado sem qualquer honra.
Aimaás, o sacerdote, filho de Zadoque, que havia sido encarregado por Deus de lhe trazer notícias, juntamente com Jônatas, filho do sumo-sacerdote Abiatar, adiantou-se, quando terminada a guerra com a morte de Absalão, para dar a boa-nova da vitória do seu exército e teria o cuidado, como de fato teve, de ocultar-lhe por algum tempo a morte de Absalão, pois sabia o quanto ele estava empenhado em que ele fosse poupado (v. 19).
Este Aimaás era um grande corredor, pois ultrapassou o etíope que foi destacado por Joabe para dar as notícias a Davi, inclusive de que Absalão havia morrido, ocultando obviamente, segundo desejava Joabe, que isto ocorreu por iniciativa dele contrariando ordens do rei.
Por isso Joabe temia que Aimaás, apesar de ter sido encarregado para ser o mensageiro do rei, fosse o portador, naquela ocasião, da notícia da vitória.
Todavia, Aimaás insistiu com Joabe que ele deveria cumprir a missão que lhe foi confiada pelo rei, e obteve a sua permissão de fazê-lo somente depois de o etíope ter tomado uma grande dianteira em relação a ele.
Joabe estava confiante que ele não poderia ser ultrapassado por Aimaás. E chegou a usar de ironia quando permitiu que este também fosse dar as novas ao rei: “Para que agora correrias tu, meu filho, pois não receberias recompensa pelas novas?” (v. 22).
Mas Deus, em Sua bondade e misericórdia, não permitiu que o coração de Davi fosse destroçado com a transmissão fria e direta da notícia da morte de seu filho, pela boca do etíope, e assim, Aimaás o ultrapassou na corrida e pôde preparar o coração do rei para o pior, informando-lhe somente sobre a vitória do seu exército, mas a única preocupação de Davi naquela hora era saber se Deus havia poupado ou não seu filho da morte.
Aimaás teve compaixão e sabedoria suficiente para ocultar-lhe o que havia ocorrido, dizendo ignorar o que havia sucedido ao filho do rei.
Isto o deixou desconfiado e melhor preparado para ouvir o pior, pela boca do etíope, que veio ter com ele depois de ter estado com Aimaás, e chorando e andando não parava de exclamar: “Meu filho Absalão, meu filho, meu filho Absalão! quem me dera que eu morrera por ti, Absalão, meu filho, meu filho!” (v. 33).
Davi sabia que Absalão foi morto por causa de um julgamento divino sobre a sua própria maldade, mas ele sabia também que havia contribuído indiretamente para que tudo isto estivesse acontecendo, por causa do seu pecado com Bate-Seba, que expôs a sua família ao juízo da espada, conforme havia sido proferido por Deus, pois havia exposto Urias à morte, pela espada dos amonitas.
Agora ele sofre tanto por causa do seu amor de pai pela perda de um filho, com o agravante da dor de uma consciência culpada e ferida.
Quantas dores um só pecado pode trazer a quem o pratica e àqueles que estão ao seu redor.
Vigiemos pois em todo o tempo, orando no Espírito, para que não tenhamos do que nos lamentar no futuro, daquilo que poderíamos ter evitado no presente ou no passado.



“1 Então Davi contou o povo que tinha consigo, e pôs sobre ele chefes de mil e chefes de cem.
2 E Davi enviou o exército, um terço sob o mando de Joabe, outro terço sob o mando de Abisai, filho de Zeruia, irmão de Joabe, e outro terço sob o mando de Itai, o giteu. E disse o rei ao povo: Eu também sairei convosco.
3 Mas o povo respondeu: Não sairás; porque se fugirmos, eles não se importarão conosco; nem se importarão conosco ainda que morra metade de nós; porque tu vales por dez mil tais como nós. Melhor será que da cidade nos mandes socorro.
4 Respondeu-lhes o rei: Farei o que vos parecer bem. E o rei se pôs ao lado da porta, e todo o povo saiu em centenas e em milhares.
5 E o rei deu ordem a Joabe, a Abisai e a Itai, dizendo: Tratai brandamente, por amor de mim, o mancebo Absalão. E todo o povo ouviu quando o rei deu ordem a todos os chefes acerca de Absalão.
6 Assim saiu o povo a campo contra Israel; e deu-se a batalha no bosque de Efraim.
7 Ali o povo de Israel foi derrotado pelos servos de Davi; e naquele dia houve ali grande morticínio, de vinte mil homens.
8 Pois a batalha se estendeu sobre a face de toda aquela terra, e o bosque consumiu mais gente naquele dia do que a espada.
9 Por acaso Absalão se encontrou com os servos de Davi; e Absalão ia montado num mulo e, entrando o mulo debaixo dos espessos ramos de um grande carvalho, pegou-se a cabeça de Absalão no carvalho, e ele ficou pendurado entre o céu e a terra; e o mulo que estava debaixo dele passou adiante.
10 um homem, vendo isso, contou-o a Joabe, dizendo: Eis que vi Absalão pendurado dum carvalho.
11 Então disse Joabe ao homem que lho contara: Pois que o viste, por que não o derrubaste logo por terra? E eu te haveria dado dez siclos de prata e um cinto.
12 Respondeu, porém, o homem a Joabe: Ainda que eu pudesse pesar nas minhas mãos mil siclos de prata, não estenderia a mão contra o filho do rei; pois bem ouvimos que o rei deu ordem a ti, e a Abisai, e a Itai, dizendo: Guardai-vos, cada um, de tocar no mancebo Absalão.
13 E se eu tivesse procedido falsamente contra a sua vida, coisa nenhuma se esconderia ao rei, e tu mesmo te oporias a mim:
14 Então disse Joabe: Não posso demorar-me assim contigo aqui. E tomou na mão três dardos, e traspassou com eles o coração de Absalão, estando ele ainda vivo no meio do carvalho.
15 E o cercaram dez mancebos, que levavam as armas de Joabe; e feriram a Absalão, e o mataram.
16 Então tocou Joabe a buzina, e o povo voltou de perseguir a Israel; porque Joabe deteve o povo.
17 E tomaram a Absalão e, lançando-o numa grande cova no bosque, levantaram sobre ele mui grande montão de pedras. E todo o Israel fugiu, cada um para a sua tenda.
18 Ora, Absalão, quando ainda vivia, tinha feito levantar para si a coluna que está no vale do rei; pois dizia: Nenhum filho tenho para conservar a memória o meu nome. E deu o seu próprio nome àquela coluna, a qual até o dia de hoje se chama o Monumento de Absalão.
19 Então disse Aimaás, filho de Zadoque: Deixa-me correr, e anunciarei ao rei que o Senhor o vingou da mão de seus inimigos.
20 Mas Joabe lhe disse: Tu não serás hoje o portador das novas; outro dia as levarás, mas hoje não darás a nova, porque é morto o filho do rei.
21 Disse, porém, Joabe ao etíope: Vai tu, e dize ao rei o que viste. O etíope se inclinou diante de Joabe, e saiu correndo.
22 Então prosseguiu Aimaás, filho de Zadoque, e disse a Joabe: Seja o que for, deixa-me também correr após o etíope. Respondeu Joabe: Para que agora correrias tu, meu filho, pois não receberias recompensa pelas novas?
23 seja o que for, disse Aimaás, correrei. Disse-lhe, pois, Joabe: Corre. Então Aimaás correu pelo caminho da planície, e passou adiante do etíope.
24 Ora, Davi estava sentado entre as duas portas; e a sentinela subiu ao terraço da porta junto ao muro e, levantando os olhos, viu um homem que corria só.
25 Gritou, pois, a sentinela, e o disse ao rei. Respondeu o rei: Se vem só, é portador de novas. Vinha, pois, o mensageiro aproximando-se cada vez mais.
26 Então a sentinela viu outro homem que corria, e gritou ao porteiro, e disse: Eis que lá vem outro homem correndo só. Então disse o rei: Também esse traz novas.
27 Disse mais a sentinela: O correr do primeiro parece ser o correr de Aimaás, filho de Zadoque. Então disse o rei: Este é homem de bem, e virá com boas novas.
28 Gritou, pois, Aimaás, e disse ao rei: Paz! E inclinou-se ao rei com o rosto em terra, e disse: Bendito seja o Senhor teu Deus, que entregou os homens que levantaram a mão contra o rei meu senhor.
29 Então perguntou o rei: Vai bem o mancebo Absalão? Respondeu Aimaás: Quando Joabe me mandou a mim, o servo do rei, vi um grande alvoroço; porem não sei o que era.
30 Disse-lhe o rei: Põe-te aqui ao lado. E ele se pôs ao lado, e esperou de pé.
31 Nisso chegou o etíope, e disse: Novas para o rei meu senhor. Pois que hoje o Senhor te vingou da mão de todos os que se levantaram contra ti.
32 Então perguntou o rei ao etíope: Vai bem o mancebo Absalão? Respondeu o etíope: Sejam como aquele mancebo os inimigos do rei meu senhor, e todos os que se levantam contra ti para te fazerem mal.
33 Pelo que o rei ficou muito comovido e, subindo à sala que estava por cima da porta, pôs-se a chorar; e andando, dizia assim: Meu filho Absalão, meu filho, meu filho Absalão! quem me dera que eu morrera por ti, Absalão, meu filho, meu filho!” (II Sm 18.1-33).




II Samuel 19

Gratidão por Amor

Como nos demais capítulos do livro de 2 Samuel, também há neste 19º, muitos ensinamentos para nos instruir na justiça (II Tim 3.16,17).
Aqui nós somos ensinados especialmente sobre o dever da gratidão, mesmo de um rei a seus súditos, quando estes se empenham por ele lutando para fazer prevalecer a causa da justiça.
Até mesmo os que lideram devem manifestar a sua gratidão àqueles que o servem bem.
Pastores devem manifestar a sua gratidão às ovelhas que servem bem ao Senhor debaixo do ministério deles, assim como as ovelhas devem manifestar a sua deferência e gratidão àqueles que as presidem bem no Senhor.
Contudo, num mundo em que a iniquidade tem se multiplicado, de modo que o pecado tem se manifestado em múltiplas e variadas formas, estas coisas que são devidas à justiça e à virtude, e que são imutáveis, vão sendo esquecidas, mesmo no meio daqueles que jamais deveriam se desviar delas, a saber, o povo do Senhor.
Joabe sabia que grandes danos foram sofridos por muitos reis, por causa do desprezo de grandes méritos.
Era exatamente isto que Davi estava fazendo, não se permitindo consolar da morte de Absalão, e não expressando qualquer gratidão àqueles que haviam exposto as suas próprias vidas por ele e pelo seu reino.
As palavras de repreensão de Joabe dirigidas a Davi eram corretas, mas ele não o fez com o respeito e deferência que eram devidos ao rei.
Mas, em todo o caso, elas produziram o efeito desejado, e Davi pôde vencer as razões do seu coração para se sujeitar e fazer aquilo que era justo, e foi ter com o povo que já se desanimava, considerando ser uma ingratidão ele ter esquecido de tudo o que eles haviam feito para ficar lamentando a morte do rebelde Absalão.
Tendo manifestado publicamente o seu desejo de continuar governando as tribos de Israel, deliberou providenciar o retorno do rei de Maanaim, onde ele ainda se encontrava, para Jerusalém, em Judá.
E ao mesmo tempo, Davi tomou providências mandando dizer a Zadoque e a Abiatar, que se encontravam em Jerusalém, que incentivassem os de Judá a trazê-lo de volta (v. 11).
Ele argumentou que era irmão deles, pois era daquela tribo, e mandou dizer a Amasa, que foi constituído por Absalão como seu general, dizendo também a ele que era do mesmo osso e carne dele, e que o constituiria como general de todo o seu exército no lugar de Joabe (v. 12, 13), e estas palavras produziram o efeito esperado, porque eles se dispuseram a buscar Davi em Maanaim, tomando a dianteira de todas as demais tribos de Israel, e quando estas protestaram que haviam sido deixadas de lado pelos de Judá, não dando a eles a mesma honra de buscarem o rei juntamente com eles, a tribo de Judá usou o argumento do parentesco com Davi para justificar o fato de terem se encontrado com o rei em Gilgal para trazê-lo a Jerusalém (v. 15, 41-43).
Mas, enquanto neste mundo, não virá somente ao nosso encontro a gratidão sincera, como também o interesseiro com seu falso arrependimento e a falsidade e o engano, bem representados nas pessoas de Simei, que havia amaldiçoado Davi, quando este fugia de Absalão (v. 16), e Ziba, que lhe enganou em relação a Mefibosete (v. 17).
Estes vieram ter com ele juntamente com os homens de Judá, pois souberam da decisão deles de se encontrarem com Davi em Gilgal, depois da sua saída de Maanaim.
Simei, para poupar o próprio pescoço, de uma possível represália dos oficiais de Davi, se apressou em pedir perdão pelo seu pecado, e argumentou que foi o primeiro de todas as demais tribos de Israel que viera ter com o rei (v. 20), que foram designadas por ele como casa de José.
Abisai percebeu a falsidade daquele homem e se dispôs a matá-lo, mas foi impedido pelo rei, não porque não tivesse percebido a falsidade de Simei, mas por colocar em prática a virtude da longanimidade, que é ordenada por Deus a todos os verdadeiros cristãos, e assim Davi prometeu poupar a sua vida (v. 22, 23), certamente, enquanto ele não voltasse a fazer algo que fosse digno de morte.
Nós estudaremos adiante, no comentário de I Reis, que ele foi morto a mando de Salomão, por ter desobedecido ordens expressas que lhe havia dado.
A longanimidade lhe havia poupado, mas ele não se mostrou digno dela e foi apanhado no momento oportuno, pela justiça.
O mesmo sucederá a todos aqueles que têm abusado da longanimidade de Deus não se arrependendo dos seus pecados, para praticarem a justiça, e tentando se valer de um falso arrependimento, que sequer engana a eles próprios, quanto mais ao Deus que tudo conhece, e por isso é certo que o juízo do Senhor os alcançará quando menos esperarem.
Os versos 24 a 30 relatam o encontro de Mefibosete com Davi, que também saiu para ter com ele, antes da sua chegada em Jerusalém.
Tão nobre era o caráter de Mefibosete, que tendo sido impedido de fugir com Davi em razão da tramóia que Ziba lhe preparara, no entanto, em demonstração de tristeza e abatimento que sentiu pelo exílio forçado do rei, não tratou dos seus pés defeituoso, nem aparou a barba e nem lavou as suas vestes, desde o dia que Davi fugiu de Jerusalém (v. 24).
Ele não protestou com o rei quanto a ter transferido as propriedade que lhe dera para a posse de Ziba, e alegou reconhecer o direito que ele tinha de fazer o que bem aprouvesse com o que de fato lhe pertencia, e se mostrou grato pelo seu favor para com ele, quando todos, na casa de Saul, foram alcançados pelos juízos do Senhor.
E ele concluiu o seu discurso com Davi dizendo que mesmo tendo sido enganado por Ziba ele não se encontrava em posição de reclamar sobre qualquer direito ao rei, porque afinal ele comia à sua mesa, em sua presença.
Não podendo voltar atrás na palavra dada a Ziba, Davi propôs a Mefibosete que ficasse satisfeito com metade das propriedades que lhe pertenciam e que ele havia dado a Ziba (v. 29).
Mas para livrar o rei de qualquer constrangimento ele lhe declarou que Ziba poderia ficar com tudo porque a sua alegria não repousava em propriedades, mas na pessoa do próprio rei, que havia por fim voltado em paz à sua casa (v. 30).
Isto é um exemplo para muitos cristãos cujo prazer não se encontra exclusivamente na própria pessoa de Jesus, mas naquilo que podem obter dEle.
Mefibosete compreendia que tudo o que lhe fora dado pelo rei, não era propriamente seu, e que o rei poderia dispor dos seus bens como bem lhe aprouvesse.
Quantos têm este pensamento correto em relação ao próprio Deus, quanto a que tudo se encontra na posse deles neste mundo, não pertence propriamente a eles, mas ao Senhor?
Além disso todos eles estavam na mais completa miséria em seus pecados, e Deus os tornou participantes da Sua riqueza por meio de Cristo Jesus, e assim todo o bem que têm recebido é por pura graça e misericórdia, e não têm portanto o direito de lhe negar qualquer direito sobre tudo o que possuem e sobre suas próprias vidas.
Mais do que isso devem aprender a amá-lO desinteressadamente, assim como Ele lhes ama. Porque o verdadeiro amor não é interesseiro.
Pessoas que protestam serem amigas de outras, não raro estão buscando não a quem dizem amar, mas aos seus próprios interesses egoístas, de receberem deles proteção, companhia, provisão, honra, conforto, ou o que seja do interesse delas.
E a falsa amizade se comprova no momento em que percebem que o que era do seu interesse não possa mais ser atendido por aqueles aos quais alegavam amar; porque se retirarão, sem manifestar até mesmo qualquer gratidão, por qualquer bem que tenham recebido daqueles aos quais exploraram de forma interesseira.
A Deus pertencem não somente os bens materiais dos quais somos apenas seus mordomos, como também as nossas próprias vidas, dons e talentos.
Ele dá e os tira, pois faz o que quer com o que é Seu, segundo a Sua própria vontade e soberania.
Para que aprendamos que não é o que recebemos ou que não recebemos dEle, que importa, mas conhecer e amar a Sua própria pessoa divina, tal como Jó havia demonstrado, quando colocado à prova por Deus, revelando a Satanás que o amor de Jó por Ele era genuíno e não interesseiro.
Por isso, devemos dar-Lhe glória e graças tanto no que recebemos dEle quanto naquilo de que nos tem privado, seguindo o exemplo de Jó que O adorou quando permitiu que fossem mortos os seus dez filhos.
Ele é digno de receber glória e honra na alegria e na tristeza, quando somos honrados ou desonrados, quando temos muito ou nada porque Ele sempre faz o que é melhor para nós, mas sobretudo porque Ele próprio é a nossa única e permanente riqueza e a profunda razão da nossa paz e alegria.
Todos nós estávamos mortos em nossos delitos e pecados diante de Deus e Ele nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus. Do quê então temos nós o direito de reclamar nas aflições que sofremos neste mundo?
Finalmente, no comentário deste capítulo, cabe ainda destacar a prudência, sabedoria e generosidade de Barzilai, um ancião muito rico de 80 anos de idade, que residia em Gileade, e que sustentara Davi, quando este esteve em Maanaim (v. 31,32).
Ele acompanhou Davi em sua volta a Jerusalém até que tivesse atravessado o Jordão.
Davi insistiu com ele para que fosse se juntar à sua corte em Jerusalém, mas ele recusou esta honra não por desfeita ao rei, mas por sabedoria e prudência, porque sabia que estava próxima a hora da sua morte, e desejava ser sepultado em sua própria cidade, junto de seu pai e mãe, mas pediu ao rei que a honra que lhe cabia fosse transferida para o seu filho Quimã, que era ainda jovem, e poderia se destacar servindo ao rei, e Davi prometeu fazer a Quimã tudo o que Barzilai desejasse e lhe pedisse (v. 37, 38).
O bom nome dos pais é a melhor herança dos filhos, e estes acharão favor da parte daqueles que foram abençoados pelo serviço e testemunho de seus pais.
Vale a pena fazer o bem, especialmente àqueles que andam nos caminhos do Senhor, porque quando menos esperamos o Senhor haverá de fazer com que colhamos abundantemente todo o bem que tivermos semeado, ainda que em meio a lágrimas e enfrentando dificuldades, e esta colheita será feita não apenas aqui neste mundo mas sobretudo no céu.
Barzilai havia construído um sólido fundamento fazendo um uso generoso e sábio de toda a riqueza que o Senhor lhe concedeu e permitiu que ele adquirisse. E isto nos faz lembrar tanto das palavras do Senhor Jesus quanto do apóstolo Paulo:
  “Eu vos digo ainda: Granjeai amigos por meio das riquezas da injustiça; para que, quando estas vos faltarem, vos recebam eles nos tabernáculos eternos.” (Lc 16.9).




“1 Disseram a Joabe: Eis que o rei está chorando e se lamentando por Absalão.
2 Então a vitória se tornou naquele dia em tristeza para todo o povo, porque nesse dia o povo ouviu dizer: O rei está muito triste por causa de seu filho.
3 E nesse dia o povo entrou furtivamente na cidade, como o faz quando, envergonhado, foge da peleja.
4 Estava, pois, o rei com o rosto coberto, e clamava em alta voz: Meu filho Absalão, Absalão meu filho, meu filho!
5 Então entrou Joabe na casa onde estava o rei, e disse: Hoje envergonhaste todos os teus servos, que livraram neste dia a tua vida, a vida de teus filhos e filhas, e a vida de tuas mulheres e concubinas,
6 amando aos que te odeiam, e odiando aos que te amam. Porque hoje dás a entender que nada valem para ti nem chefes nem servos; pois agora entendo que se Absalão vivesse, e todos nós hoje fôssemos mortos, ficarias bem contente.
7 Levanta-te, pois, agora; sai e fala ao coração de teus servos. Porque pelo Senhor te juro que, se não saíres, nem um só homem ficará contigo esta noite; e isso te será pior do que todo o mal que tem vindo sobre ti desde a tua mocidade até agora.
8 Pelo que o rei se levantou, e se sentou à porta; e avisaram a todo o povo, dizendo: Eis que o rei está sentado à porta. Então todo o povo veio apresentar-se diante do rei. Ora, Israel havia fugido, cada um para a sua tenda.
9 Entrementes todo o povo, em todas as tribos de Israel, andava altercando entre si, dizendo: O rei nos tirou das mãos de nossos inimigos, e nos livrou das mãos dos filisteus; e agora fugiu da terra por causa de Absalão.
10 Também Absalão, a quem ungimos sobre nós, morreu na peleja. Agora, pois, porque vos calais, e não fazeis voltar o rei?
11 Então o rei Davi mandou dizer a Zadoque e a Abiatar, sacerdotes: Falai aos anciãos de Judá, dizendo: Por que seríeis vós os últimos em tornar a trazer o rei para sua casa? Porque a palavra de todo o Israel tem chegado ao rei, até a sua casa.
12 Vós sois meus irmãos; meus ossos e minha carne sois vós; por que, pois, seríeis os últimos em tornar a trazer o rei?
13 Dizei a Amasa: Porventura não és tu meu osso e minha carne? Assim me faça Deus e outro tanto, se não fores chefe do exercito diante e mim para sempre, em lugar de Joabe.
14 Assim moveu ele o coração de todos os homens de Judá, como se fosse o de um só homem; e enviaram ao rei, dizendo: Volta, com todos os teus servos.
15 Então o rei voltou, e chegou até o Jordão; e Judá veio a Gilgal, para encontrar-se com o rei, a fim de fazê-lo passar o Jordão.
16 Ora, apressou-se Simei, filho de Gêra, benjamita, que era de Baurim, e desceu com os homens de Judá a encontrar-se com o rei Davi;
17 e com ele mil homens de Benjamim, como também Ziba, servo da casa de Saul, e seus quinze filhos, e seus vinte servos com ele; desceram apressadamente ao Jordão adiante do rei,
18 atravessando o vau para trazer a casa do rei e para fazer o que aprouvesse a ele. Quando o rei ia passar o Jordão, Simei, filho de Gêra, se prostrou diante dele,
19 e lhe disse: Não me impute meu senhor à minha culpa, e não te lembres do que tão perversamente fez teu servo, no dia em que o rei meu senhor saiu de Jerusalém; não conserve o rei isso no coração.
20 Porque eu, teu servo, deveras confesso que pequei; por isso eis que eu sou o primeiro, de toda a casa de José, a descer ao encontro do rei meu senhor.
21 Respondeu Abisai, filho de Zeruia, dizendo: Não há de ser morto Simei por haver amaldiçoado ao ungido do Senhor?
22 Mas Davi disse: Que tenho eu convosco, filhos de Zeruia, para que hoje me sejais adversários? Será morto alguém hoje em Israel? pois não sei eu que hoje sou rei sobre Israel?
23 Então disse o rei a Simei: Não morrerás. E o rei lho jurou.
24 Também Mefibosete, filho de Saul, desceu a encontrar-se com o rei, e não cuidara dos pés, nem fizera a barba, nem lavara as suas vestes desde o dia em que o rei saíra até o dia em que voltou em paz.
25 E sucedeu que, vindo ele a Jerusalém a encontrar-se com o rei, este lhe perguntou: Por que não foste comigo, Mefibosete?
26 Respondeu ele: Ó rei meu senhor, o meu servo me enganou. Porque o teu servo dizia: Albardarei um jumento, para nele montar e ir com o rei; pois o teu servo é coxo.
27 E ele acusou falsamente o teu servo diante do rei meu senhor; porém o rei meu senhor é como um anjo de Deus; faze, pois, o que bem te parecer.
28 Pois toda a casa de meu pai não era senão de homens dignos de morte diante do rei meu senhor; contudo, puseste teu servo entre os que comem à tua mesa. E que direito mais tenho eu de clamar ainda ao rei.
29 Ao que lhe respondeu o rei: Por que falas ainda de teus negócios? Já decidi: Tu e Ziba reparti as terras.
30 Então disse Mefibosete ao rei: Deixe que ele tome tudo, uma vez que o rei meu senhor já voltou em paz à sua casa.
31 Também Barzilai, o gileadita, desceu de Rogelim, e passou com o rei o Jordão, para acompanhá-lo até a outra banda do rio.
32 E era Barzilai mui velho, da idade de oitenta anos; e ele tinha provido o rei de víveres enquanto este se demorara em Maanaim, pois era homem muito rico.
33 Disse, pois, o rei a Barzilai: Passa tu comigo e eu te sustentarei em Jerusalém, em minha companhia.
34 Barzilai, porém, respondeu ao rei: Quantos anos viverei ainda, para que suba com o rei a Jerusalém.
35 Oitenta anos tenho hoje; poderei eu discernir entre e bom e o mau? poderá o teu servo perceber sabor no que comer e beber? poderei eu mais ouvir a voz dos cantores e das cantoras? e por que será o teu servo ainda pesado ao rei meu senhor?
36 O teu servo passará com o rei até um pouco além do Jordão. Por que me daria o rei tal recompensa?
37 Deixa voltar o teu servo, para que eu morra na minha cidade, junto à sepultura de meu pai e de minha mãe. Mas eis aí o teu servo Quimã; passe ele com o rei meu senhor, e faze-lhe o que for do teu agrado.
38 Ao que disse o rei: Quimã passará comigo, e eu lhe farei o que te parecer bem, e tudo quanto me pedires te farei.
39 Havendo, pois, todo o povo passado o Jordão, e tendo passado também o rei, beijou o rei a Barzilai, e o abençoou; e este voltou para o seu lugar.
40 Dali passou o rei a Gilgal, e Quimã com ele; e todo o povo de Judá, juntamente com a metade do povo de Israel, conduziu o rei.
41 Então todos os homens de Israel vieram ter com o rei, e lhe disseram: Por que te furtaram nossos irmãos, os homens de Judá, e fizeram passar o Jordão o rei e a sua casa, e todos os seus homens com ele?
42 Responderam todos os homens de Judá aos homens de Israel: Porquanto o rei é nosso parente: Por que vos irais por isso. Acaso temos comido à custa do rei, ou nos deu ele algum presente?


43 Ao que os homens de Israel responderam aos homens de Judá: Dez partes temos no rei; mais temos nós em Davi do que vós. Por que, pois, fizestes pouca conta de nós. Não foi a nossa palavra a primeira, para tornar a trazer o nosso rei? Porém a palavra dos homens de Judá foi mais forte do que a palavra dos homens de Israel.” (II Sm 19.1-43).


II Samuel 20

A Sedição de Seba

Nós vemos em 2 Samuel 20, que mal a tempestade havia cessado, eis que as nuvens começaram a se formar de novo no céu de Davi.
Assim é a nossa vida neste mundo, em que um abismo pode chamar outro abismo.
Tendo sido vencida a rebelião de Absalão, logo uma outra começou a se formar, encabeçada por um benjamita chamado Seba, que provavelmente se aproveitou do impasse causado entre a tribo de Judá e as demais tribos, relativo à questão de a tribo de Judá ter tomado a dianteira deles para buscar o rei em Maanaim, conforme vimos no capítulo anterior.
Como o argumento apresentado na ocasião para defender tal iniciativa foi o de que o rei era da mesma parentela dos de Judá, então Seba, valeu-se disto, para instigar as demais tribos de Israel dizendo que eles não tinham nenhuma parte com o filho de Jessé, isto é, parentesco com ele, como os próprios judeus e o rei haviam afirmado que eram da mesma carne e osso.
Certamente, se o argumento que Davi usou para despertar o interesse de Judá em relação a ele era verdadeiro, no entanto, foi imprudente, por ter despertado o ciúme das demais tribos, e não continha toda a verdade, porque todos eles eram irmãos, descendentes de Jacó, cujo nome Deus havia mudado para Israel.
Mas, considerações deixadas à parte, o grande fato é que isto deu ocasião para ser usado pelo diabo como mais uma oportunidade para afligir os israelitas e não somente Davi. Não era uma nação inimiga que os estava atormentando, mas divisões internas entre eles mesmos.
Quanto dano é produzido por causa de ciúmes e contendas entre os próprios cristãos?
Este era o problema básico na jovem Igreja de Corinto, e tem sido o maior problema que a Igreja tem enfrentado em toda a sua longa história.
Davi estava ainda se deslocando do Jordão para Jerusalém, quando os homens de Israel se separaram dele para seguirem a Seba (v. 1), mas os de Judá permaneceram com ele e voltaram para Jerusalém (v. 2).
O rei ordenou a Amasa, seu sobrinho, que era o general de Absalão, que convocasse os homens de Judá e os apresentasse a ele no prazo de três dias (v. 4), mas tendo decorrido o prazo determinado e não tendo Amasa conseguido apresentar-se ao rei com os homens solicitados, este deu ordem a Abisai, irmão de Joabe que saísse em perseguição a Seba, antes que este tivesse tempo de reunir tropas suficientes e vencer a guerra (v. 6).
Assim, foi a guarda real de Davi e os seus valentes que saíram primeiro à batalha, porque o exército regular que se encontrava com Amasa, viria a encontrar-se com eles próximo de Gibeom, uma das principais cidades de Benjamim (v. 8).
Certamente, para impedir que Amasa fosse constituído general em seu lugar por ser bem sucedido naquela guerra contra Seba, Joabe o assassinou covardemente, o que deixou perplexos os homens que estavam sob o comando de Amasa, mas, para evitar que desistissem de seguir a Joabe, um dos seus homens conclamou dizendo que aqueles que eram por Joabe e por Davi, deveriam seguir a Joabe (v.11), e tirando o corpo de Amasa do caminho e colocando um manto sobre ele, conseguiu com que partissem em perseguição a Seba (v. 12, 13).
Passada a paixão do ciúme despertado por Seba, e tendo os israelitas percebido a insensatez de seguirem a Seba, repetindo o mesmo erro de terem seguido a Absalão, estes o abandonaram e ele era apenas seguido pelos beritas, e não tendo como enfrentar o exército de Davi, foi se refugiar numa cidade do extremo norte da Palestina, que possuía muralhas, chamada Abel-Bete-Maaca (v. 14, 15).
Quando os homens de Joabe se dispunham a derrubar a muralha para destruírem a cidade, uma mulher sábia impediu tal destruição porque veio ter com Joabe e defendeu o caráter pacificador daquela cidade, que desde a antiguidade era chamada a dar cabo das questões pendentes mesmo de pessoas de outras cidades (v. 18), e como Joabe poderia pensar em destruir uma cidade como aquela que era uma mãe em Israel? (v. 19).
Joabe percebeu que a cidade não havia acolhido a Seba e nem a sua causa, e por isso explicou o caso à mulher, e esta se comprometeu a lançar a cabeça dele sobre o muro (v. 21), o que foi feito, e pôs fim à sua sedição.
Cabe destacar que Joabe estava lutando pela causa de Davi, mas também pela sua própria causa, pois assassinou Amasa para intimidar o rei que o havia deposto da posição de general, e à qual ele retornou por sua própria iniciativa, aproveitando-se da ocasião, sem qualquer autorização expressa do rei.
Tendo assassinado a Amasa, por simples motivo interesseiro, ele ficava sujeito ao juízo de Deus de que aqueles que derramarem o sangue do homem deverão também ter o seu derramado.
Por isso, e também pelo sangue de Abner que havia derramado sem motivo, Joabe foi morto por Benaia a mando de Salomão, quando este iniciou a reinar em Israel (I Reis 2.30-34).
Foi por causa destes crimes que Joabe cometera, que Davi não o recomendou a Salomão, apesar dele próprio ter confirmado a Joabe no cargo de general, como vemos no versículo 23, mas não lhe deu a honra de ter o seu nome incluído entre os seus trinta guerreiros mais destacados, apesar dele ser o general do exército de Israel.
No verso 24 é dito que Adorão era o comandante dos que estavam sujeitos a trabalhos forçados, e ele permaneceu neste cargo até depois do reinado de quarenta anos de Salomão, alcançando ainda o de Roboão (I Rs 12.18).
Com a citação dos oficiais de Davi no final deste capítulo, nós temos praticamente a conclusão da narrativa, por ordem, da história relativa ao seu reinado, porque a data dos eventos narrados nos capítulos a seguir é incerta, e não se pode saber com precisão a que período do seu reinado estes eventos pertencem.



“1 Ora, sucedeu achar-se ali um homem de Belial, cujo nome era Sebá, filho de Bicri, homem de Benjamim, o qual tocou a buzina, e disse: Não temos parte em Davi, nem herança no filho de Jessé; cada um à sua tenda, ó Israel!
2 Então todos os homens de Israel se separaram de Davi, e seguiram a Sebá, filho de Bicri; porém os homens de Judá seguiram ao seu rei desde o Jordão até Jerusalém.
3 Quando Davi chegou à sua casa em Jerusalém, tomou as dez concubinas que deixara para guardarem a casa, e as pôs numa casa, sob guarda, e as sustentava; porém não entrou a elas. Assim estiveram encerradas até o dia da sua morte, vivendo como viúvas.
4 Disse então o rei a Amasa: Convoca-me dentro de três dias os homens de Judá, e apresenta-te aqui.
5 Foi, pois, Amasa para convocar a Judá, porém demorou-se além do tempo que o rei lhe designara.
6 Então disse Davi a Abisai: Mais mal agora nos fará Sebá, filho de Bicri, do que Absalão; toma, pois, tu os servos de teu senhor, e persegue-o, para que ele porventura não ache para si cidades fortificadas, e nos escape à nossa vista.
7 Então saíram atrás dele os homens de Joabe, e os quereteus, e os peleteus, e todos os valentes; saíram de Jerusalém para perseguirem a Sebá, filho de Bicri.
8 Quando chegaram à pedra grande que está junto a Gibeão, Amasa lhes veio ao encontro. Estava Joabe cingido do seu traje de guerra que vestira, e sobre ele um cinto com a espada presa aos seus lombos, na sua bainha; e, adiantando-se ele, a espada caiu da bainha.
9 E disse Joabe a Amasa: Vais bem, meu irmão? E Joabe, com a mão direita, pegou da barba de Amasa, para o beijar.
10 Amasa, porém, não reparou na espada que estava na mão de Joabe; de sorte que este o feriu com ela no ventre, derramando-lhe por terra as entranhas, sem feri-lo segunda vez; e ele morreu. Então Joabe e Abisai, seu irmão, perseguiram a Sebá, filho de Bicri.
11 Mas um homem dentre os servos de Joabe ficou junto a Amasa, e dizia: Quem favorece a Joabe, e quem é por Davi, siga a Joabe.
12 E Amasa se revolvia no seu sangue no meio do caminho. E aquele homem, vendo que todo o povo parava, removeu Amasa do caminho para o campo, e lançou sobre ele um manto, porque viu que todo aquele que chegava ao pé dele parava.
13 Mas removido Amasa do caminho, todos os homens seguiram a Joabe, para perseguirem a Sebá, filho de Bicri.
14 Então Sebá passou por todas as tribos de Israel até Abel e Bete-Maacá; e todos os beritas, ajuntando-se, também o seguiram.
15 Vieram, pois, e cercaram a Sebá em Abel de Bete-Maacá; e levantaram contra a cidade um montão, que se elevou defronte do muro; e todo o povo que estava com Joabe batia o muro para derrubá-lo.
16 Então uma mulher sábia gritou de dentro da cidade: Ouvi! ouvi! Dizei a Joabe: Chega-te cá, para que eu te fale.
17 Ele, pois, se chegou perto dela; e a mulher perguntou: Tu és Joabe? Respondeu ele: Sou. Ela lhe disse: Ouve as palavras de tua serva. Disse ele: Estou ouvindo.
18 Então falou ela, dizendo: Antigamente costumava-se dizer: Que se peça conselho em Abel; e era assim que se punha termo às questões.
19 Eu sou uma das pacíficas e das fiéis em Israel; e tu procuras destruir uma cidade que é mãe em Israel; por que, pois, devorarias a herança do Senhor?
20 Então respondeu Joabe, e disse: Longe, longe de mim que eu tal faça, que eu devore ou arruíne!
21 A coisa não é assim; porém um só homem da região montanhosa de Efraim, cujo nome é Sebá, filho de Bicri, levantou a mão contra o rei, contra Davi; entregai-me só este, e retirar-me-ei da cidade. E disse a mulher a Joabe: Eis que te será lançada a sua cabeça pelo muro.
22 A mulher, na sua sabedoria, foi ter com todo o povo; e cortaram a cabeça de Sebá, filho de Bicri, e a lançaram a Joabe. Este, pois, tocou a buzina, e eles se retiraram da cidade, cada um para sua tenda. E Joabe voltou a Jerusalém, ao rei.
23 Ora, Joabe estava sobre todo o exército de Israel; e Benaia, filho de Jeoiada, sobre os quereteus e os peleteus;
24 e Adorão sobre a gente de trabalhos forçados; Jeosafá, filho de Ailude, era cronista;
25 Seva era escrivão; Zadoque e Abiatar, sacerdotes;
26 e Ira, o jairita, era o oficial-mor de Davi.” (II Sm 20.1-26).




II Samuel 21

Deus Honra as Suas Alianças

Nós dissemos no final do comentário relativo ao capítulo anterior a este 21º de 2 Samuel, que estaremos comentando, que a data dos eventos narrados neste capitulo é incerta.
Há dois relatos distintos nele: o primeiro se refere à morte de gibeonitas durante o reinado de Saul, e o segundo à morte de gigantes filisteus pelos valentes de Davi.
É afirmado que Saul em seu zelo por Israel e Judá matou muitos gibeonitas.
Este zelo não foi no entanto um zelo segundo a vontade do Senhor, como veremos adiante.
Os gibeonitas haviam recebido uma garantia de serem protegidos por todas as gerações dos israelitas, desde os dias de Josué, e foi em nome do Senhor que esta aliança foi feita com eles.
Saul, em seu reinado, fez a eles o que nenhum juiz fizera antes dele no longo período de trezentos anos, que julgaram Israel.
Ele simplesmente desconsiderou a aliança que foi feita com eles em nome de Jeová, significando que o Senhor mesmo seria tido como infiel em cumprir Suas promessas, caso os israelitas não os protegessem dos seus inimigos.
Mas em vez de protegê-los, Saul tentou exterminá-los, pouco se importando com o nome de Deus, que se encontrava em jogo.
A cidade de Gibeom era uma das cidades de Benjamim, e ele quis demonstrar que tinha mais zelo do que os governantes anteriores, e faria com que houvesse apenas israelitas naquela cidade, pelo extermínio dos gibeonitas.
Muitas mães foram desfilhadas, e Saul deve ter espalhado terror entre eles, sem que tivessem intentado qualquer mal contra Israel, tanto que o Senhor vindicou a causa deles, trazendo uma fome que já durava três anos, nos dias do reinado de Davi (v. 1).
Isto foi uma providência de Deus para vindicar a Sua fidelidade em cumprir a Sua Palavra, e para vingar os gibeonitas, e ainda para ensinar aos israelitas que toda palavra dada em Seu nome deveria ser honrada seriamente.
E a fome na terra persistia até que foi revelado a Davi que havia culpa na casa de Saul em relação aos gibeonitas, e então ele mandou chamar o rei de Gibeom, que era seu vassalo, e lhe perguntou o que deveria ser feito para que houvesse reparação do mal causado por Saul a eles, de modo que Deus voltasse a ser favorável a Israel (v. 3). E eles disseram que a sua demanda não era com a nação de Israel, mas com Saul que os assolara.
Eles não queriam ouro e prata, e nem guerrear contra Israel, mas que fossem vingados de Saul, dando-se-lhes sete dos seus descendentes para que fossem enforcados por eles.
Isto pode parecer a nós que se tratava de uma barbárie e de uma vingança fria que não poderia ser aprovada por um Deus amoroso.
Mas, não podemos esquecer que naqueles dias vigorava o olho por olho e dente por dente, de modo que se Saul destruiu famílias gibeonitas contra a vontade de Deus e por motivos pessoais, então, pela lei de retribuição, seria justo, debaixo daquela antiga dispensação, que seus familiares fossem mortos por aqueles a cujas famílias ele havia assolado.
Além disso, como vimos antes, estava em jogo a questão de se vindicar a fidelidade e justiça de Deus, porque Saul, como seu ungido, e rei do Seu povo, agira contra a Sua vontade e desconsiderando uma aliança que havia sido feita em nome de Deus, nos dias de Josué.
Mefibosete, filho de Jônatas, foi poupado por causa da aliança que Davi havia feito com o pai dele. Mas dois filhos que Saul tivera com uma de suas concubinas, chamada Rispa, e cinco filhos de sua filha chamada Merabe, foram dados aos gibeonitas para serem enforcados (v. 8, 9).
E depois de enforcados, Rispa, em zelo e amor materno procurou guardar e honrar os corpos de seus dois filhos, que estavam expostos publicamente como anátema de Deus, pelo que Saul havia feito, e permaneceu ao lado deles dia e noite para protegê-los da chuva e do ataque de aves de rapina (v. 10).      
A honra que ela estava dando a seus filhos despertou em Davi a necessidade de honrar não somente os que haviam sido enforcados, porque afinal, não se fizeram anátema por um pecado que tivesse sido cometido por eles, mas por Saul, e assim lhes proveria um sepultamento digno, e indo além, ele trouxe de volta os restos mortais de Saul e Jônatas que se encontravam em Gileade, para que fossem colocados na própria terra deles, a saber, em Benjamim (v. 11 a 14).
Davi procurou honrar os mortos, mas isto não resolve o problema da morte.
A morte entrou na criação por causa do pecado. Mas a morte física propriamente dita não configura um problema final e fatal, porque o que importa não é se somos honrados pelos homens na nossa morte, mas se somos honrados por Deus.
Se nós O amamos e O conhecemos Ele estará conosco quando morrermos e nos conduzirá à vida eterna, mas em caso contrário, por mais que sejamos honrados pelos homens, mas se nos falta a honra de Deus, então a morte configura um problema real, porque em vez da vida e da honra, acharemos a morte e o horror eternos.
Nós encontramos na segunda parte deste capítulo, como citamos anteriormente, as vitórias dos valentes de Davi sobre gigantes filisteus, especialmente da cidade de Gate, onde havia muitos deles, e entre os quais figurava Golias, a quem Davi matou quando ainda era jovem.
É nomeado um outro Golias neste capítulo (v. 19) que foi morto por um homem de Belém, chamado El-Hanã.
É narrado  também o livramento que o próprio Davi teve de ser morto por um destes gigantes, chamado Isbi-Benobe, mas foi ajudado por Abisai, que impediu que ele fosse morto e matou o gigante (v. 16,17).
Foi a partir de então que os oficiais de Davi lhe recomendaram que não saísse mais ao campo de batalha, para que não corresse o risco de ser morto, e assim se apagasse a lâmpada de Israel, caso o matassem.
Eles reconheciam que eram abençoados pelo Senhor por amor a Davi.
E assim eles procuraram preservar a sua vida, porque ele era uma bênção para o povo de Deus.
É citado no verso 20 um gigante que foi morto pelo sobrinho de Davi, chamado Jônatas, quando o gigante injuriava Israel.
Ele tinha seis dedos em cada mão e pé, totalizando vinte e quatro dedos, e devia se gloriar disto, quando na verdade, tratava-se de um defeito genético, do qual ele não deveria se envergonhar, mas também do qual não deveria se gloriar.    




“1 Nos dias de Davi houve uma fome de três anos consecutivos; pelo que Davi consultou ao Senhor; e o Senhor lhe disse: E por causa de Saul e da sua casa sanguinária, porque matou os gibeonitas.
2 Então o rei chamou os gibeonitas e falou com eles (ora, os gibeonitas não eram dos filhos de Israel, mas do restante dos amorreus; e os filhos de Israel tinham feito pacto com eles; porém Saul, no seu zelo pelos filhos de Israel e de Judá, procurou feri-los);
3 perguntou, pois, Davi aos gibeonitas: Que quereis que eu vos faça. e como hei de fazer expiação, para que abençoeis a herança do Senhor?
4 Então os gibeonitas lhe disseram: Não é por prata nem ouro que temos questão com Saul e com a sua casa; nem tampouco cabe a nós matar pessoa alguma em Israel. Disse-lhes Davi: Que quereis que vos faça?
5 Responderam ao rei: Quanto ao homem que nos consumia, e procurava destruir-nos, de modo que não pudéssemos subsistir em termo algum de Israel,
6 de seus filhos se nos deem sete homens, para que os enforquemos ao Senhor em Gibeá de Saul, o eleito do Senhor. E o rei disse: Eu os darei.
7 O rei, porém, poupou a Mefibosete, filho de Jônatas, filho de Saul, por causa do juramento do Senhor que entre eles houvera, isto é, entre Davi e Jônatas, filho de Saul.
8 Mas o rei tomou os dois filhos de Rizpa, filha de Aías, que ela tivera de Saul, a saber, a Armoni e a Mefibosete, como também os cinco filhos de Merabe, filha de Saul, que ela tivera de Adriel, filho de Barzilai, meolatita,
9 e os entregou na mão dos gibeonitas, os quais os enforcaram no monte, perante o Senhor; e os sete caíram todos juntos. Foi nos primeiros dias da sega que foram mortos, no princípio da sega da cevada.
10 Então Rizpa, filha de Aías, tomando um pano de cilício, estendeu-o para si sobre uma pedra e, desde o princípio da sega até que a água caiu do céu sobre os corpos, não deixou que se aproximassem deles as aves do céu de dia, nem os animais do campo de noite:
11 Quando foi anunciado a Davi o que fizera Rizpa, filha de Aías, concubina de Saul,
12 ele foi e tomou os ossos de Saul e os de Jônatas seu filho, aos homens de Jabes-Gileade, que os haviam furtado da praça de Bete-Seã, onde os filisteus os tinham pendurado quando mataram a Saul em Gilboa;
13 e trouxe dali os ossos de Saul e os de Jônatas seu filho; e ajuntaram a eles também os ossos dos enforcados.
14 Enterraram os ossos de Saul e de Jônatas seu filho, na terra de Benjamim, em Zela, na sepultura de Quis, seu pai; e fizeram tudo o que o rei ordenara. Depois disto Deus se aplacou para com a terra.
15 De novo tiveram os filisteus uma guerra contra Israel. E desceu Davi, e com ele os seus servos; e tanto pelejara contra os filisteus, que Davi se cansou.
16 E Isbi-Benobe, que era dos filhos do gigante, cuja lança tinha o peso de trezentos, siclos de bronze, e que cingia uma espada nova, intentou matar Davi.
17 Porém, Abisai, filho de Zeruia, o socorreu; e, ferindo ao filisteu, o matou. Então os homens de Davi lhe juraram, dizendo: Nunca mais sairás conosco à batalha, para que não apagues a lâmpada de Israel.
18 Aconteceu depois disto que houve em Gobe ainda outra peleja contra os filisteus; então Sibecai, o husatita, matou Safe, que era dos filhos do gigante.
19 Houve mais outra peleja contra os filisteus em Gobe; e El-Hanã, filho de Jaaré-Oregim, o belemita, matou Golias, o giteu, de cuja lança a haste era como órgão de tecelão.
20 Houve ainda também outra peleja em Gate, onde estava um homem de alta estatura, que tinha seis dedos em cada mão, e seis em cada pé, vinte e quatro ao todo; também este era descendente do gigante.
21 Tendo ele desafiado a Israel, Jônatas, filho de Simei, irmão de Davi, o matou.
22 Estes quatro nasceram ao gigante em Gate; e caíram pela mão de Davi e pela mão de seus servos.” (II Sm 21.1-22).



II Samuel 22

Cântico de Louvor e Gratidão de Davi

As palavras do 22º capítulo de 2 Samuel encerram as palavras do Salmo 18, com algumas variações. A introdução do capítulo (v. 1) é a mesma do titulo do referido Salmo.
São palavras de gratidão e louvor a Deus pelos livramentos recebidos por Davi, tanto de Saul quanto de todos os seus inimigos.
Este cântico de louvor e gratidão, que foi composto por Davi, fecha de modo maravilhoso toda a história que é relatada acerca da sua vida pessoal e ministerial nos dois livros de Samuel.
Toda a honra e glória dos seus bons serviços prestados a Israel são tributados por ele ao Senhor, porque fora Ele quem realmente tudo operara, nos livramentos que lhe dera, por amor do Seu povo.
O Senhor foi tanto a fortaleza em que Davi se refugiava e se encontrava seguro, como a força dele para vencer as batalhas que tinha que empreender, tanto para vencer seus inimigos, quanto para suportar as aflições, que lhe sobrevieram ao longo de toda a sua vida (v. 2 a 19, 32 a 43, 51).
E ele se esforçou sobremaneira para obedecer ao Senhor e fazer o que era justo diante dos Seus olhos e aprovado por Ele, e foi este o motivo de ter sido abençoado de tal maneira pelo Senhor, porque apesar de ter sido objeto da eleição e graça de Deus, que o ungiu para ser rei, ele poderia ter frustrado o plano de Deus para a sua vida, por um andar desobediente (v. 20 a 31).
Como prova do Seu agrado em relação à fidelidade de Davi, Deus fez com que ele subjugasse nações e governasse povos estrangeiros, e o livrou das contendas internas do próprio Israel (v. 44 a 49).
E nós aprendemos das palavras de Davi que os livramentos que Deus lhe deu foram respostas às suas orações. Ele clamava ao Senhor em suas angústias para receber socorro e alívio (v. 7).



“1 Davi dirigiu ao Senhor as palavras deste cântico, no dia em que o Senhor o livrou das mãos de todos os seus inimigos e das mãos de Saul, dizendo:
2 O Senhor é o meu rochedo, a minha fortaleza e o meu libertador.
3 É meu Deus, a minha rocha, nele confiarei; é o meu escudo, e a força da minha salvação, o meu alto retiro, e o meu refúgio. O meu Salvador; da violência tu me livras.
4 Ao Senhor invocarei, pois é digno de louvor; assim serei salvo dos meus inimigos.
5 As ondas da morte me cercaram, as torrentes de Belial me atemorizaram.
6 Cordas do Seol me cingiram, laços de morte me envolveram.
7 Na minha angústia invoquei ao Senhor; sim, a meu Deus clamei; do seu templo ouviu ele a minha voz, e o meu clamor chegou aos seus ouvidos.
8 Então se abalou e tremeu a terra, os fundamentos dos céus se moveram; abalaram-se porque ele se irou.
9 Das suas narinas subiu fumaça, e da sua boca um fogo devorador, que pôs carvões em chamas.
10 Ele abaixou os céus, e desceu; e havia escuridão debaixo dos seus pés.
11 Montou num querubim, e voou; apareceu sobre as asas do vento.
12 E por tendas pôs trevas ao redor de si, ajuntamento de águas, espessas nuvens do céu.
13 Pelo resplendor da sua presença acenderam-se brasas de fogo.
14 Do céu trovejou o Senhor, o Altíssimo fez soar a sua voz.
15 Disparou flechas, e os dissipou; raios, e os desbaratou.
16 Então apareceram as profundezas do mar; os fundamentos do mundo se descobriram, pela repreensão do Senhor, pelo assopro do vento das suas narinas.
17 Estendeu do alto a sua mão e tomou-me; tirou-me das muitas águas.
18 Livrou-me do meu possante inimigo, e daqueles que me odiavam; porque eram fortes demais para mim.
19 Encontraram-me no dia da minha calamidade, porém o Senhor se fez o meu esteio.
20 Conduziu-me para um lugar espaçoso; livrou-me, porque tinha prazer em mim.
21 Recompensou-me o Senhor conforme a minha justiça; conforme a pureza e minhas mãos me retribuiu.
22 Porque guardei os caminhos do Senhor, e não me apartei impiamente do meu Deus.
23 Pois todos os seus preceitos estavam diante de mim, e dos seus estatutos não me desviei.
24 Fui perfeito para com ele, e guardei-me da minha iniquidade.
25 Por isso me retribuiu o Senhor conforme a minha justiça, conforme a minha pureza diante dos meus olhos.
26 Para com o benigno te mostras benigno; para com o perfeito te mostras perfeito,
27 para com o puro te mostras puro, mas para com o perverso te mostras avesso.
28 Livrarás o povo que se humilha, mas teus olhos são contra os altivos, e tu os abaterás.
29 Porque tu, Senhor, és a minha candeia; e o Senhor alumiará as minhas trevas.
30 Pois contigo passarei pelo meio dum esquadrão; com o meu Deus transporei um muro.
31 Quanto a Deus, o seu caminho é perfeito, e a palavra do Senhor é fiel; é ele o escudo de todos os que nele se refugiam.
32 Pois quem é Deus, senão o Senhor? e quem é rocha, senão o nosso Deus?
33 Deus é a minha grande fortaleza; e ele torna perfeito o meu caminho.
34 Faz ele os meus pés como os das gazelas, e me põe sobre as minhas alturas.
35 Ele instrui as minhas mãos para a peleja, de modo que os meus braços podem entesar um arco de bronze.
36 Também me deste o escudo da tua salvação, e tua brandura me engrandece.
37 Alargaste os meus passos debaixo de mim, e não vacilaram os meus artelhos.
38 Persegui os meus inimigos e os destruí, e nunca voltei atrás sem que os consumisse.
39 Eu os consumi, e os atravessei, de modo que nunca mais se levantaram; sim, cairam debaixo dos meus pés.
40 Pois tu me cingiste de força para a peleja; prostraste debaixo de mim os que se levantaram contra mim.
41 Fizeste que me voltassem as costas os meus inimigos, aqueles que me odiavam, para que eu os destruísse.
42 Olharam ao redor, mas não houve quem os salvasse; clamaram ao Senhor, mas ele não lhes respondeu.
43 Então os moí como o pó da terra; como a lama das ruas os trilhei e dissipei.
44 Também me livraste das contendas do meu povo; guardaste-me para ser o cabeça das nações; um povo que eu não conhecia me serviu.
45 Estrangeiros, com adulação, se submeteram a mim; ao ouvirem de mim, me obedeceram.
46 Os estrangeiros desfaleceram e, tremendo, saíram dos seus esconderijos.
47 O Senhor vive; bendita seja a minha rocha, e exaltado seja Deus, a rocha da minha salvação,
48 o Deus que me deu vingança, e sujeitou povos debaixo de mim,
49 e me tirou dentre os meus inimigos; porque tu me exaltaste sobre os meus adversários; tu me livraste do homem violento.
50 Por isso, ó Senhor, louvar-te-ei entre as nações, e entoarei louvores ao teu nome.


51 Ele dá grande livramento a seu rei, e usa de benignidade para com o seu ungido, para com Davi e a sua descendência para sempre.” (II Sm 22.1-51).



II Samuel 23

As Fiéis Misericórdias Prometidas a Davi

O autor do livro de 2 Samuel continua concluindo a narrativa relativa ao reinado de Davi neste 23º capítulo e registra as últimas palavras proferidas por ele próximo da sua morte (v. 1 a 7), e os nomes dos valentes que estiveram a seu serviço, enquanto ele vivia (v. 8 a 39).
As últimas palavras proferidas por Davi são extraordinárias e comprovam que ele havia sido realmente exaltado e ungido por Deus, e foi inspirado pelo Espírito Santo para ser o mavioso salmista de Israel, sendo conhecido em todas as partes do mundo em todos os séculos, pelos Salmos que escreveu debaixo desta inspiração (v. 1).
Ele não tinha o Espírito de Deus apenas no seu coração, guardando comunhão com Ele, mas permitiu que Ele usasse a sua língua, para proferir a Sua Palavra através da Sua boca (v. 2).
Davi regeu a todos que foram colocados debaixo do seu governo pelo Senhor, com o temor de Deus, porque o fizera com justiça (v. 3), tal como faria Neemias, depois dele (Ne 5.15).
Deus mesmo, a quem Davi chama de a Rocha de Israel (v. 3), havia lhe falado que aqueles que governam deste modo, são como a luz da manhã, quando sai o sol, como uma manhã sem nuvens, cujo esplendor, depois da chuva, faz brotar da terra a erva (v. 4).
Assim, é descrito o caráter de todos os justos que reinarão juntamente com Cristo, porque, falando ainda pelo Espírito, Davi aplica estas palavras à sua casa, dizendo: “Pois não é assim a minha casa para com Deus? Porque estabeleceu comigo um pacto eterno, em tudo bem ordenado e seguro; pois não fará ele prosperar toda a minha salvação e todo o meu desejo?”.
Esta certeza da salvação eterna, para todos os que estão na casa de Davi, por sua associação com Cristo, que pertence a esta casa, e é Senhor sobre ela, pois não foi estabelecida pelo homem, mas pelo próprio Deus, é devido ao pacto, que nas palavras do Espírito, pela boca de Davi, é “em tudo bem ordenado e seguro”.
Este é o caráter da aliança da graça, e é por ser uma aliança eterna que ela prosperará e jamais frustrará o desejo de qualquer um que tiver colocado no Senhor a Sua confiança, participando da aliança eterna, que foi prometida a Davi.
Na verdade, não há outra esperança de salvação senão por meio das condições da aliança prometida a Davi. Tanto que aqueles que permanecerem na condição de filhos de Belial, por não estarem assim aliançados com Deus, serão lançados fora, sem uma só exceção, como espinhos, porque não podem ser tocados com as mãos, isto é, não se permitem serem transformados e educados na justiça por Deus.
Por isso, quem os tocar se armará de ferro e da haste de uma lança, e a fogo serão totalmente queimados no seu lugar (v. 6,7).
As pessoas ímpias estão sujeitas não apenas ao braço da justiça dos magistrados terrenos, como também serão sujeitados ao braço forte do juízo eterno do Senhor, que os queimará num fogo eterno, que jamais se apagará.
Os filhos de pais piedosos nem sempre são tão santos e devotados quanto deveriam ser, tal como se deu com o próprio Davi, que a par de todo o seu amor e esforço para santificar os seus filhos, teve entre eles Amnom e Absalão, que eram ímpios.
Isto nos revela que é a corrupção e não a graça, que corre no sangue.
Por isso, a casa de Davi é típica da Igreja de Cristo, que é a casa dEle (Hb 3.3).
Cristo não é fiel a toda a sua casa, na condição de um servo, como fora Moisés em relação a Israel, mas como Senhor e Rei, assim como o fora Davi sobre a sua casa terrena.
O Senhor da casa espiritual de Davi é Cristo, e não o próprio Davi, porque este foi impedido de continuar o seu reinado pela morte, e regia apenas sobre Israel, mas Cristo, que vive e reina para sempre, reina sobre toda a Sua casa, e sobre todos aqueles que lhes foram dados pelo Pai, em todas as nações.
Deus fez uma aliança com a cabeça da Igreja, o Filho de Davi, de que preservará a Ele uma semente sobre a qual as portas do inferno não prevalecerão, ou seja, nunca poderão predominar sobre a Sua casa.
E esta segurança é garantida por Deus e realizada na Rocha segura que é Cristo, que é o autor e consumador da nossa fé e salvação.
Desta forma, é nEle que se cumprem todas as promessas da aliança da graça feita com Davi.
A aliança que Deus fez com um rei terreno apontava para a aliança que Ele fizera antes que houvesse mundo, no céu, com Aquele que reinará para sempre.
Por isso as promessas da aliança eterna são chamadas de fiéis misericórdias prometidas a Davi:
“Inclinai os vossos ouvidos, e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá; porque convosco farei uma aliança perpétua, dando-vos as fiéis misericórdias prometidas a Davi.” (Is 55.3).
É maravilhoso saber que as últimas palavras que Davi falou pelo Espírito, apontaram para esta aliança segura e eterna.
Deus fez uma aliança conosco em Jesus Cristo, e nós aprendemos das Suas palavras pela boca de Davi que é uma aliança perpétua.
Perpétua em si mesma e na forma do seu caráter, manutenção, continuação e confirmação.
Deus diz também pela boca de Davi que é bem ordenada e segura (v. 5).
Esta aliança está bem ordenada por Deus em todas as coisas que dizem respeito a ela.
Esta ordenação perfeita trabalhará em meio às imperfeições dos cristãos e os aperfeiçoará progressivamente, para a glória de Deus, de modo que se a obra não for completada na terra, ela o será no céu.
E para isso a aliança possui um Mediador e um Consolador para promover a santidade e o conforto dos cristãos. Está ordenado também QUE TODA TRANSGRESSÃO NA ALIANÇA NÃO LANÇARÁ FORA A QUALQUER DOS ALIANÇADOS.
Por isso Jesus afirma que não lançará fora de modo nenhum, a qualquer que vier a Ele.
Assim, a segurança da salvação não é colocada nas mãos dos cristãos, mas nas mãos do Mediador.
E se diz que a aliança é segura, porque está assim bem ordenada por Deus.
Ela foi planejada de tal modo a poder conduzir pecadores ao céu.
Ela está tão bem estruturada, que qualquer um deles pode ter a certeza de que estará sendo aperfeiçoado na terra e a conclusão desta obra de aperfeiçoamento será concluída no céu.
Uma das razões para que o aperfeiçoamento não seja concluído na terra, é para que se saiba que a aliança é de fato para pecadores, e não para quem se considera perfeitamente justo.
Ainda que todos os aliançados sejam chamados agora a se empenharem na prática da justiça.
As misericórdias prometidas aos aliançados é segura, e operarão de acordo com as condições estabelecidas em relação à necessidade de arrependimento e fé.
A aplicação particular destas misericórdias para santificar os cristãos é segura.
É segura porque é suficiente.
Nada mais do que isto nos salvará, porque a base da salvação repousa na fidelidade de Deus em cumprir a promessa que Ele fez à casa de Davi, a todo aquele que for encontrado nela, por causa da sua fé no descendente, no Filho de Davi que é Cristo. É somente disto que a nossa salvação depende.
Por isso, os que estão de fora da aliança, os filhos de Belial (v. 6,7), são como espinhos que não podem ser tocados, trabalhados pelas mãos de Deus, e esta será a razão de serem queimados para sempre, num fogo eterno que jamais se apagará.

Os Valentes de Davi


O texto de I Crôn 11.10-47, paralelo ao de II Samuel 23.8-39, esclarece melhor em sua introdução (v. 10), que a glória do reino de Davi pertencia ao Senhor, que o proveu de homens valorosos na guerra para firmarem o seu reino:
“São estes os chefes dos valentes de Davi, que o apoiaram fortemente no seu reino, com todo o Israel, para o fazerem rei, conforme a palavra do Senhor, no tocante a Israel.” (I Crôn 11.10).
Isto denota claramente que o mérito do reino não pertencia a Davi, mas ao Senhor que o elegera e capacitara a não somente a ele, mas aos muitos que o apoiariam para que o seu reino prevalecesse e fosse estabelecido.
Três destes valentes foram tão maravilhosamente capacitados pelo Espírito de Deus, que nos fazem lembrar de Sansão.
E não foi sem razão que eles foram honrados para serem contados à parte no pequeno grupo de apenas três homens, que foram considerados dignos de serem classificados como os maiores guerreiros do reino.
Eram eles Josebe-Bassebete, que feriu a oitocentos homens com sua lança, numa mesma batalha (v. 8), e que era o principal dos três primeiros.
O segundo em honra foi Eleazar, que feriu os filisteus de tal modo até o ponto de ficar com a mão apegada à espada (v, 9, 10).
O terceiro valente entre os três primeiros em honra chamava-se Samá, que defendeu uma parte do território de Israel em Leí, do ataque dos filisteus, e quando todo o povo fugia por temor deles (v. 11, 12).
Estes, como dissemos, eram contados à parte, mas além deles havia outros trinta, e deste segundo grupo o mais nobre era Abisai, irmão de Joabe (v. 19), mas se diz dele que nunca chegou a fazer parte do grupo seleto dos três primeiros em honra, pela sua bravura.
Benaia, que era o comandante da guarda real, também figurava entre os trinta, e tal era a sua bravura que matou um leão e um gigante (v. 20, 21).
Benaia chegou a ter  estatura e bravura, a ponto de ter obtido renome que o tornava digno de participar do grupo dos três primeiros (v. 22), mas não chegou a ser incluído neste grupo (v. 23).
Ele seria encarregado mais tarde por Salomão, para matar Joabe, e isto bem demonstra a sua supremacia na arte de lutar na guerra, que era superior à do próprio general de todo o exército de Israel.
Nos versos 13 a 27 é narrada uma façanha realizada pelos três primeiros em honra e bravura, quando Davi se encontrava na caverna de Adulão, na época em que fugia de Saul, pois somente pela expressão de um desejo de Davi de beber das águas da fonte, que estava junto da porta de Belém, próximo da qual havia uma guarnição de filisteus, estes três valentes expuseram as suas próprias vidas para trazerem água daquela fonte ao rei, mas este se recusou a bebê-la e a ofertou como libação ao Senhor, porque não beberia à custa do atendimento de um desejo caprichoso, uma vez que aqueles homens valorosos lhe foram dados pelo Senhor para lutarem pela causa da justiça e não para atenderem aos caprichos do rei.
Nos versos 24 a 39 são relacionados os que figuravam entre os trinta mais honrados em bravura.
Dos trinta e sete que haviam feito parte deste grupo (v. 39), são relacionados trinta, que era o número total dos que compunham o grupo.
Urias (v. 39) é contado neste grupo e isto era uma agravante para o pecado de Davi com Bate-Seba. Asael, irmão de Joabe, que havia sido morto por Abner logo no início do reinado de Davi, é também contado (v. 24), mas Joabe, apesar de ser o general do exército, não recebeu sequer a honra de ter no seu nome listado entre os trinta primeiros, não por lhe faltar bravura, mas por não ter os demais requisitos necessários, como por exemplo a devoção ao Senhor e ser uma pessoa honrada.
De igual modo, há muitos na Igreja de Cristo que ocupam posições e cargos elevados em relação à membresia, e isto por anos a fio, e no entanto, não têm os seus nomes relacionados sequer no livro da vida, e quando o têm, nem sempre são considerados dignos de terem os seus nomes destacados como honrados perante o Senhor, por falta da devida devoção e fidelidade a Ele e à Sua Palavra.      




“1 São estas as últimas palavras de Davi: Diz Davi, filho de Jessé, diz o homem que foi exaltado, o ungido do Deus de Jacó, o suave salmista de Israel.
2 O Espírito do Senhor fala por mim, e a sua palavra está na minha língua.
3 Falou o Deus de Israel, a Rocha de Israel me disse: Quando um justo governa sobre os homens, quando governa no temor de Deus,
4 será como a luz da manhã ao sair do sol, da manhã sem nuvens, quando, depois da chuva, pelo resplendor do sol, a erva brota da terra.
5 Pois não é assim a minha casa para com Deus? Porque estabeleceu comigo um pacto eterno, em tudo bem ordenado e seguro; pois não fará ele prosperar toda a minha salvação e todo o meu desejo?
6 Porém os ímpios todos serão como os espinhos, que se lançam fora, porque não se pode tocar neles;
7 mas qualquer que os tocar se armará de ferro e da haste de uma lança; e a fogo serão totalmente queimados no mesmo lugar.
8 São estes os nomes dos valentes de Davi: Josebe-Bassebete, o taquemonita; era este principal dos três; foi ele que, com a lança, matou oitocentos de uma vez.
9 Depois dele Eleazar, filho de Dodó, filho de Aoí, um dos três valentes que estavam com Davi, quando desafiaram os filisteus que se haviam reunido para a peleja, enquanto os homens de Israel se retiravam.
10 Este se levantou, e feriu os filisteus, até lhe cansar a mão e ficar pegada à espada; e naquele dia o Senhor operou um grande livramento; e o povo voltou para junto de Eleazar, somente para tomar o despojo.
11 Depois dele era Samá, filho de Agé, o hararita. Os filisteus se haviam ajuntado em Leí, onde havia um terreno cheio de lentilhas; e o povo fugiu de diante dos filisteus.
12 Samá, porém, pondo-se no meio daquele terreno, defendeu-o e matou os filisteus, e o Senhor efetuou um grande livramento.
13 Também três dos trinta cabeças desceram, no tempo da sega, e foram ter com Davi, à caverna de Adulão; e a tropa dos filisteus acampara no vale de Refaim.
14 Davi estava então no lugar forte, e a guarnição dos filisteus estava em Belém.
15 E Davi, com saudade, exclamou: Quem me dera beber da água da cisterna que está junto a porta de Belém!
16 Então aqueles três valentes romperam pelo arraial dos filisteus, tiraram água da cisterna que está junto à porta de Belém, e a trouxeram a Davi; porém ele não quis bebê-la, mas derramou-a perante o Senhor;
17 e disse: Longe de mim, ó Senhor, que eu tal faça! Beberia eu o sangue dos homens que foram com risco das suas vidas? De maneira que não a quis beber. Isto fizeram aqueles três valentes.
18 Ora, Abisai, irmão de Joabe, filho de Zeruia, era chefe dos trinta; e este alçou a sua lança contra trezentos, e os matou, e tinha nome entre os três.
19 Porventura não era este o mais nobre dentre os trinta? portanto se tornou o chefe deles; porém aos primeiros três não chegou.
20 Também Benaia, filho de Jeoiada, filho dum homem de Cabzeel, valoroso e de grandes feitos, matou os dois filhos de Ariel de Moabe; depois desceu, e matou um leão dentro duma cova, no tempo da neve.
21 Matou também um egípcio, homem de temível aspecto; tinha este uma lança na mão, mas Benaia desceu a ele com um cajado, arrancou-lhe da mão a lança, e com ela o matou.
22 Estas coisas fez Benaia, filho de Jeoiada, pelo que teve nome entre os três valentes.
23 Dentre os trinta ele era o mais afamado, porém aos três primeiros não chegou. Mas Davi o pôs sobre os seus guardas.
24 Asael, irmão de Joabe, era um dos trinta; El-Hanã, filho de Dodó, de Belém;
25 Samá, o harodita; Elica, o harodita;
26 Jelez, o paltita; Ira, filho de Iques, o tecoíta;
27 Abiezer, o anatotita; Mebunai, o husatita;
28 Zalmom, o aoíta; Maarai, o netofatita;
29 Helebe, filho de Baaná, o netofatita; Itai, filho de Ribai, de Gibeá dos filhos de Benjamim;
30 Benaia, o piratonita; Hidai, das torrentes de Gaás;
31 Abi-Albom, o arbatita; Azmavete, o barumita;
32 Eliabá, o saalbonita; Bene-Jásen; e Jônatas;
33 Samá, o hararita; Aião, filho de Sarar, o hararita;
34 Elifelete, filho de Acasbai, filho do maacatita; Eliã, filho de Aitofel, o gilonita;
35 Hezrai, o carmelita; Paarai, o arbita;
36 Igal, filho de Natã, de Zobá; Bani, o gadita;
37 Zeleque, o amonita; Naarai, o beerotita, o que trazia as armas de Joabe, filho de Zeruia;
38 Ira, o itrita; Garebe, o itrita;
39 Urias, o heteu; trinta e sete ao todo.” (II Sm 23.1-39).


II Samuel 24

A Indicação do Local de Construção do Templo

Nós encontramos o texto paralelo a este último capítulo (24) de II Samuel, em I Crônicas 21.
Ali são relatadas as estranhas circunstâncias com que foi designado o local onde deveria ser construído o templo do Senhor.
O sacrifício que Davi apresentou neste lugar por ordem de Deus, e no qual seriam apresentados os sacrifícios segundo as exigências da Lei, que tipificavam o grande e suficiente sacrifício de Jesus, foi o que fez cessar a praga que estava destruindo o povo do Senhor.
Há aqui portanto uma grande ilustração de que é o sacrifício de Jesus que faz com que Deus seja propício para com o Seu povo.
Aqueles israelitas dos dias de Davi não haviam praticado nenhum mal específico que lhes tornasse dignos de serem punidos por causa da transgressão do seu próprio rei.
Todavia, é exatamente esta a condição de todos os homens diante de Deus.
Eles não precisam fazer nada especial que os torne dignos de morrerem pelos juízos do Senhor, porque esta é a condição mesma de todo homem perante Ele, por causa do pecado original.
Deus está irado e em guerra com toda a humanidade, por causa do pecado que entrou no mundo e em razão de serem todos pecadores.
É somente através do sacrifício de Jesus que o homem pode ser reconciliado com Deus.
Daí se dizer que justificados pois, mediante a fé temos paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo (Rm 5.21).
O reino de Davi havia sido se expandido e a glória de Israel havia aumentado muito em relação a todos os períodos vividos anteriormente pela nação.
É bem provável que uma espécie de orgulho nacional tivesse se apoderado do rei e de todos os seus súditos, na época correspondente aos eventos que são descritos neste capítulo.
É dito no texto paralelo de I Crôn 21.1, em face da glória do reino de Israel, que: “Então Satanás se levantou contra Israel, e incitou Davi a numerar Israel.”.
Como aquele desejo de Davi de efetuar o censo era de inspiração satânica, obviamente Deus não poderia consentir com a sua realização.
Provavelmente o diabo usou o orgulho que havia invadido o coração de Davi, por tudo aquilo que ele havia conquistado e por toda prosperidade que Israel havia obtido, esquecido que tudo havia procedido das mãos do Senhor.
Não é incomum que os cristãos sejam apanhados em seu orgulho pelo diabo, exatamente em razão das bênçãos que  recebem do Senhor, porque é necessário manter a humildade e a vigilância, para que não sejam tomados de orgulho espiritual, que será sempre uma porta para caírem no laço do Inimigo.
Assim, nós lemos no texto de II Samuel 24.1, que corresponde ao de I Crônicas 21.1, citado anteriormente: “A ira do Senhor tornou a acender-se contra Israel, e o Senhor incitou a Davi contra eles, dizendo: Vai, numera a Israel e a Judá.”.
Sabemos que Deus a ninguém tenta. Que Ele não pode ser o autor do pecado. Então só podemos entender as palavras deste texto à luz do seu paralelo em I Crônicas 21.1, pois neste se diz que foi Satanás quem tentou Davi para levantar o censo.
É bem provável que o Senhor tenha proibido Davi expressamente de modo a não levantá-lo naquela oportunidade, por conhecer os motivos orgulhosos que moviam o seu coração, com a agravante de ter tomado a iniciativa de fazê-lo seguindo uma sugestão de Satanás.
E agindo tal como fizera Balaão no passado, em obstinar-se em satisfazer o seu desejo, foi-lhe ordenado por Deus que então fizesse aquilo que Ele lhe havia proibido, mas  teria que arcar com as consequências da sua desobediência, no futuro.
Ele estava tão obstinado que até o próprio Joabe tentou dissuadi-lo, não por temor ao Senhor, mas pelo trabalho e tempo excessivos que seriam necessários ao cumprimento daquela tarefa, tanto que levou nove meses e vinte e um dias para ser concluída (v. 8).
Foi somente quando o resultado do trabalho foi apresentado, que Davi sentiu bater-lhe o coração e disse as seguintes palavras: “Muito pequei no que fiz; porém agora, ó Senhor, rogo-te que perdoes a iniquidade do teu servo, porque tenho procedido mui nesciamente.” (v. 10).
O tipo de arrependimento que é adiado deliberadamente, para que possamos continuar na prática do pecado, contando com a certeza do perdão de Deus no futuro, nunca será eficaz porque Deus não se deixa enganar e nos chama a andar de modo responsável na Sua presença.
O orgulho de Davi o cegara e se deixou conduzir pelo diabo, em vez de dar ouvido à voz de Deus, e agora, teria que arcar com as consequências do seu ato, ainda que tivesse sido convencido do seu pecado e o confessado ao Senhor, pedindo-lhe que fosse perdoada a sua iniquidade.
Então Deus lhe enviou o profeta Gade, logo na manhã do dia seguinte, com uma oferta estranha, pois lhe foi dado escolher a forma de castigo que deveria ser aplicada ao caso: se sete anos de fome e escassez em Israel; se três meses de guerra em que teria que fugir diante dos seus inimigos, ou se três dias de pestilência sobre todo Israel.
Davi deveria fazer a escolha rapidamente, para que Gade levasse a sua resposta ao Senhor (v. 12, 13).
Davi, confessando que se encontrava em grande angústia, pois o seu orgulho exaltado estava sendo abatido numa grande humilhação debaixo da potente mão do Senhor, e então ele escolheu cair naquelas mesmas mãos porque são muitas as Suas misericórdias, mas que de modo algum caísse nas mãos dos homens, conforme a primeira opção oferecida a ele, a saber, a da guerra.
Ao que parece, ele deixou o juízo de fome ou de peste a critério de Deus, pois em ambos estaria ausente a mão inimiga do homem.
Então o Senhor decidiu pela peste que durou o tempo de três dias, determinado previamente por Ele, usando assim de misericórdia em não afligir o povo com uma longa escassez de sete anos, que mataria muito mais e debilitaria Isael do que a peste que Ele enviou e ceifou a vida de 70.000 homens em todo Israel (v. 15).
É provável que tenha havido um endurecimento, especialmente por parte dos nobres, que estavam em Jerusalém, e além da peste, o anjo do Senhor estendeu a sua mão sobre aquela cidade para a destruir (v. 16), mas como o castigo determinado já havia sido aplicado, o Senhor se arrependeu do mal que seria trazido a Jerusalém, e ordenou ao anjo que retirasse a sua mão.
É dito que o anjo estava junto à eira de Araúna (v. 16).
Davi viu o anjo que feria o povo e falou ao Senhor que fora ele quem havia pecado e não o povo, e que Deus ferisse somente a ele e a sua casa.
Neste pedido ele foi um tipo de Jesus em Sua obra de expiação, quando se apresentou ao Pai para ficar no lugar dos pecadores e sofrer o castigo de Deus por eles. Só que, obviamente, Jesus não cometeu qualquer pecado, como no caso de Davi.
E o profeta Gade foi enviado a Davi naquele mesmo dia em que ele assim orara, com instruções para que levantasse um altar na eira de Araúna (v. 18, 19).
Ele comprou aquela eira, que é o monte Moriá, onde o templo seria construído, no mesmo lugar onde o altar foi levantado.
Depois de ter apresentado holocaustos e ofertas pacíficas naquele altar, o Senhor se tornou favorável para com a terra de Israel (v. 25).
O texto paralelo de I Crônicas 21.26 diz que quando os holocaustos e sacrifícios pacíficos foram oferecidos por Davi, o Senhor lhe respondeu com fogo do céu sobre o altar do holocausto. E isto evidenciava não somente a aceitação do sacrifício como era uma clara indicação do local onde o templo deveria ser construído (I Crôn 22.1).  


“1 A ira do Senhor tornou a acender-se contra Israel, e o Senhor incitou a Davi contra eles, dizendo: Vai, numera a Israel e a Judá.
2 Disse, pois, o rei a Joabe, chefe do exército, que estava com ele: Percorre todas as tribos de Israel, desde Dã até Berseba, e numera o povo, para que eu saiba o seu número.
3 Então disse Joabe ao rei: Ora, multiplique o Senhor teu Deus a este povo cem vezes tanto quanto agora é, e os olhos do rei meu senhor o vejam. Mas por que tem prazer nisto o rei meu senhor;
4 Todavia a palavra do rei prevaleceu contra Joabe, e contra os chefes do exército; Joabe, pois, saiu com os chefes do exército da presença do rei para numerar o povo de Israel.
5 Tendo eles passado o Jordão, acamparam-se em Aroer, à direita da cidade que está no meio do vale de Gade e na direção de Jazer;
6 em seguida foram a Gileade, e a terra de Tatim-Hódsi; dali foram a Da-Jaã, e ao redor até Sidom;
7 depois foram à fortaleza de Tiro, e a todas as cidades dos heveus e dos cananeus; e saíram para a banda do sul de Judá, em Berseba.
8 Assim, tendo percorrido todo o país, voltaram a Jerusalém, ao cabo de nove meses e vinte dias.
9 Joabe, pois, deu ao rei o resultado da numeração do povo. E havia em Israel oitocentos mil homens valorosos, que arrancavam da espada; e os homens de Judá eram quinhentos mil.
10 Mas o coração de Davi o acusou depois de haver ele numerado o povo; e disse Davi ao Senhor: Muito pequei no que fiz; porém agora, ó Senhor, rogo-te que perdoes a iniquidade do teu servo, porque tenho procedido mui nesciamente.
11 Quando, pois, Davi se levantou pela manhã, veio a palavra do Senhor ao profeta Gade, vidente de Davi, dizendo:
12 Vai, e dize a Davi: Assim diz o Senhor: Três coisas te ofereço; escolhe qual delas queres que eu te faça.
13 Veio, pois, Gade a Davi, e fez-lho saber dizendo-lhe: Queres que te venham sete anos de fome na tua terra; ou que por três meses fujas diante de teus inimigos, enquanto estes te perseguirem; ou que por três dias haja peste na tua terra? Delibera agora, e vê que resposta hei de dar àquele que me enviou.
14 Respondeu Davi a Gade: Estou em grande angústia; porém caiamos nas mãos do Senhor, porque muitas são as suas misericórdias; mas nas mãos dos homens não caia eu.
15 Então enviou o Senhor a peste sobre Israel, desde a manhã até o tempo determinado; e morreram do povo, desde Dã até Berseba, setenta mil homens.
16 Ora, quando o anjo estendeu a mão sobre Jerusalém, para a destruir, o Senhor se arrependeu daquele mal; e disse ao anjo que fazia a destruição entre o povo: Basta; retira agora a tua mão. E o anjo do Senhor estava junto à eira de Araúna, o jebuseu.
17 E, vendo Davi ao anjo que feria o povo, falou ao Senhor, dizendo: Eis que eu pequei, e procedi iniquamente; porém estas ovelhas, que fizeram? Seja, pois, a tua mão contra mim, e contra a casa de meu pai.
18 Naquele mesmo dia veio Gade a Davi, e lhe disse: Sobe, levanta ao Senhor um altar na eira de Araúna, o jebuseu:
19 Subiu, pois, Davi, conforme a palavra de Gade, como o Senhor havia ordenado.
20 E olhando Araúna, viu que vinham ter com ele o rei e os seus servos; saiu, pois, e inclinou-se diante do rei com o rosto em terra.
21 Perguntou Araúna: Por que vem o rei meu senhor ao seu servo? Respondeu Davi: Para comprar de ti a eira, a fim de edificar nela um altar ao Senhor, para que a praga cesse de sobre o povo.
22 Então disse Araúna a Davi: Tome e ofereça o rei meu senhor o que bem lhe parecer; eis aí os bois para o holocausto, e os trilhos e os aparelhos dos bois para lenha.
23 Tudo isto, ó rei, Araúna te oferece. Disse mais Araúna ao rei: O Senhor teu Deus tome prazer em ti.
24 Mas o rei disse a Araúna: Não! antes to comprarei pelo seu valor, porque não oferecerei ao Senhor meu Deus holocaustos que não me custem nada. Comprou, pois, Davi a eira e os bois por cinquenta siclos de prata.


25 E edificou ali um altar ao Senhor, e ofereceu holocaustos e ofertas pacíficas. Assim o Senhor se tornou propício para com a terra, e cessou aquela praga de sobre Israel.” (II Sm 24.1-25).”.

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